As publicações mais recentes que Mariana Lancastre tem na sua conta no Instagram cheiram a África por todos os lados. Entre capas de livros, têxteis e cartazes com padrões geométricos e cores vibrantes, mesmo o seu autorretrato, a que chamou “deserto na quarentena”, transborda de calor tropical.

É como se a head of design da VML Branding estivesse outra vez na África do Sul, onde viveu um ano e picos por causa do emprego do marido, conseguindo, no meio do próprio trabalho (à distância e entretanto em pandemia), desmultiplicar-se em projetos mais ligados à arte do que à sua licenciatura em Design de Comunicação.

“África deu-me oportunidade de ter o meu lado brincalhão”, dirá, quando a entrevistarmos, na sede da agência, em Lisboa. A verdade é que a africanidade passou a estar presente em tudo aquilo em que se mete, desde desenhar uns campos de arroz da Comporta por encomenda até aventurar-se no mundo dos têxteis. E as ilustrações que fez para capas de livros da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie serão talvez o melhor exemplo de como aquele continente se entranhou para sempre na vida profissional e pessoal desta fazedora de marcas, deixando-a a acreditar “num futuro de tolerância, inclusão e justiça”.

Fazendo um pouco de scroll no Instagram, chegamos ao logo da Liga das Nações de 2019 e ao troféu com as cores das bandeiras das 55 equipas em competição – ambos criações de Mariana. O que não está escrito nos comentários é que, quando Cristiano Ronaldo, o capitão da seleção portuguesa, foi fotografado a erguer a taça, já ela andava mergulhada no processo criativo para o Euro 2024.

Essa outra marca é tão colorida que só podia ter nascido em Joanesburgo, arriscamos e acertamos. “Não é por acaso que aquelas cores vêm a seguir à experiência africana”, admite. “O Euro ia ser na Alemanha e o problema era a perceção de que os alemães são sisudos, frios e pouco acolhedores”, recorda. “Em cada Euro há relação com a cultura do país, mas dessa vez decidimos pensar uma marca que representasse a Europa toda. Havia a necessidade de mostrar que os alemães têm capacidade de acolhimento e eu vinha de África com ideias novas, de inclusão e de diversidade.”

Ninguém na sua equipa se admirou, por isso, ao ver que na decoração dos vários estádios havia imagens de fãs a representar todas as culturas, tons de pele, tipos de família. Uma diversidade também aplicada aos outros ingredientes da marca: redes sociais, bola de futebol, merchandising, transmissão televisiva.

Unificar os países

“O Euro, mais do que tudo, é uma festa. Sem os fãs não existe, só o futebol em si não seria suficiente para mover tanta gente”, já sabe de cor esta designer de marcas. Afinal, não é nenhuma principiante na grande área – nos últimos anos, criou a identidade visual de alguns dos eventos desportivos mais mediáticos do mundo, liderando projetos e equipas criativas para marcas como a UEFA Euro 2024, UEFA Nations League, UEFA Women’s Nations League e Women’s European Qualifiers.

Na VML Branding, agência do grupo WPP onde trabalha desde 2014, Mariana também esteve no rebranding da Médis e no reposicionamento internacional da Artevasi, da Red Sea Global, da Payapps, do Leroy Merlin e da Galp, entre outras marcas. Mas foram as suas criações para o cliente UEFA que lhe trouxeram mais visibilidade, mesmo sem nunca ter percebido grande coisa de futebol.

“Tinha curiosidade, tenho vindo a aprender e, hoje, percebo muito de marcas de desporto”, conta, “mas, por exemplo, nunca precisei de saber todos os termos técnicos nem senti que era uma questão ser mulher ou não perceber grande coisa de futebol. Temos um diretor criativo que aposta no trabalho de cada um e encoraja todos a atirarem-se para fora de pé”.

Afinal, estamos a falar de marcas europeias, de chegar a muita gente e de todos os países se reverem nelas. “Não se trata apenas de futebol”, lembra. “O futebol parece muito vazio e superficial, e as pessoas pensam que estas marcas só enriquecem mais os ricos, mas eu gosto de pensar que são marcas que tocam em toda a gente e que têm o poder de unificar os países.”

Ainda pela sua conta no Instagram, percebe-se que Mariana Lancastre gosta muito de desenhar, tanto que esteve quase a optar pelas Belas-Artes. Quando teve de escolher um curso, ficou na dúvida sobre se iria dar-se bem em Pintura e os seus pais sugeriram-lhe Design de Comunicação. Foi na mouche, porque acabou por adorar.

“Gosto da ideia de o design ser um serviço. Hoje, quase preciso de um problema para ativar a minha criatividade”, conta. “Quando os clientes vêm ter connosco, normalmente vêm com um problema. É aí que reside a diferença entre um designer e um artista: enquanto o designer está a prestar um serviço, a resolver um problema, o artista é alguém que cria o seu próprio problema.”

No caso do Euro 2024, os alemães debatiam-se com o facto de serem considerados frios, como já se viu, mas há pontos de partida de todos os géneros e a missão de um brand designer é criar uma estratégia ganhadora a longo prazo. “Costumo dizer que crio os alicerces de uma marca para que ela tenha bases para comunicar, e gosto de comparar o que faço com a criação da identidade de uma pessoa – o seu aspeto visual, a maneira de falar, os comportamentos”, explica. “É mesmo como se fosse uma pessoa.”

Mariana revê-se na ideia de que o design é forma/função. Tudo o que escolhe tem uma razão de ser, mas tenta também ser experimental. “Depois de apanhar o problema, dou um salto criativo, porque gosto de puxar pelo cliente, dar um twist que ele não estava à espera e, no final, pô-lo a vibrar com a nossa solução”, admite.

Parceria Os arrozais da Comporta e o cartaz de Americanah deram origem a um casaco de malha e a uma manta,pela mão da Romaria Knitwear

Tudo isto começou a descobrir em Londres, onde fez um mestrado graças a um empurrão do seu pai. Chegou no ano letivo de 2008/2009 e depois teve a sorte de ficar por lá a trabalhar, de início com o apoio do INOV-Art, que era um programa de estágios internacionais para jovens, no domínio cultural e artístico, criado com o objetivo de promover a inserção no mercado de trabalho.

A sua chegada foi avassaladora, recorda, dizendo que o mestrado lhe abriu a cabeça para a diferença. “Tinha (e tenho!) amigos de todas as nações e sentia que estava no centro do mundo, em termos de cultura e de design, até ao ver a publicidade de rua e o packaging nos supermercados.”

Quando olha para trás, Mariana vê-se a entrar em branding sem saber muito bem o que ia fazer e a apaixonar-se rapidamente. “Criar algo com uma razão de ser por detrás tem muito poder”, observa, sendo que foi logo trabalhar numa agência grande, onde fez o rebranding da BBC.

Um dos projetos que mais a marcaram foi precisamente o reposicionamento de todos os canais da BBC. Era intimidante ter no seu computador os quadrados com as três letras da estação televisiva, mas foi esse projeto que lhe deu a elasticidade para perder o medo das marcas globais.

Mariana fala dos tempos de Londres com nostalgia, mas, além de não se ver a viver toda uma vida fora de Portugal, a capital inglesa puxava demasiado pelo seu lado de workaholic. Ao fim de sete anos, as saudades da família e dos amigos ditaram o seu regresso a Lisboa.

Em 2014, entrou na VML Branding, onde dois anos depois faria o pitch para a Liga das Nações que a seleção portuguesa ganhou em 2019, ano em que mergulhou no processo criativo do Euro 2024. Nessa altura, estava em Joanesburgo, para onde tinha ido morar por causa de uma oportunidade de carreira do marido. Dissera “adeus, Portugal, adeus, agência”, porque antes da Covid-19 era difícil pensar em trabalhar à distância, tanto que teve de vir a Lisboa apresentar a sua proposta criativa, com que a agência ganhou o concurso.

Era a segunda vez que emigrava, uma experiência que recomenda, sobretudo quando o destino é um território “altamente desconhecido”, realça. “Há um lado de grande estímulo e, ao mesmo tempo, uma necessidade de fazer raízes. Abre-nos muito a cabeça, torna-nos tolerantes.”

Artista inquieta

A sua passagem pela África do Sul foi uma espécie de ano sabático, com dois bebés pelo meio. Diz que tentou ser artista e gostou da liberdade, embora ela lhe tenha trazido uma certa dose de inquietação “por causa da ambiguidade de ser um projeto aberto”.

Algumas coisas que fez por lá podem ser apreciadas nestas páginas, como a parceria com a marca Romaria Knitwear, da sua amiga Carla Pinto. Por exemplo, o seu cartaz de arrozais da Comporta deu origem a um belo casaco de malha e, de repente, os padrões geométricos naturais de uma região de Portugal ficavam plasmados em têxteis noutro continente.

Olhando para a frente, a brand designer imagina-se a promover a internacionalização de marcas portuguesas. “Existem talentos individuais, como os da Joana Vasconcelos, do Cristiano Ronaldo ou do Vhils, somos conhecidos por indústrias muito conceituadas, mas não temos uma Nike da vida”, nota. Entretanto, pode ser que volte à área da moda e a África, quem sabe?

“Acho sempre que não vamos ganhar”

A VML Branding acabou de saber que o Euro 2028 é “seu”. A marca criada por Mariana Lancastre será apresentada em setembro

Como é que nasceu a sua relação com a UEFA, o cliente que até agora lhe trouxe mais visibilidade?
A UEFA chegou pela mão do meu diretor, o Hélder Pombinho. Foi com o concurso para o Euro 2020, do qual não fiz parte porque só entrei na agência em 2014, que ele conseguiu trazê-la para cá. Note-se que todos os projetos com a UEFA têm sido por concurso internacional e demoram sempre muito tempo. Em 2016, fiz o pitch para a Liga das Nações que a seleção portuguesa ganhou em 2019, e para o Euro 2024 comecei a trabalhar nesse mesmo ano de 2019.

No concurso da Liga das Nações, partiu da ideia das bandeiras. Por que razão voltou a elas no Euro 2024?
Comecei por pensar naquilo que nos faz sentir bem-vindos em algum sítio. Quando é que nos sentimos em casa? E como? Não é quando levamos algo nosso para um lugar? Daí as bandeiras de cada país. Depois, partimos para a ideia de construir a casa do futebol em conjunto. No fundo, o logo do Euro 2024 é um estádio visto de cima, que coincide com o facto de ser o “novo” estádio de Berlim que os alemães queriam inaugurar todo remodelado, e nas suas cores conseguimos ver as bandeiras das 55 nações.

E sabe contra quem concorreram? A quem ganharam?
Não sabemos, nunca nos dizem. Ganhámos agora o Euro 2028, que vai ser no Reino Unido e na Irlanda, e foi uma grande surpresa. Eu acho sempre que não vamos ganhar, e desta vez achava que tínhamos ainda menos hipóteses porque os ingleses são muito conhecidos pelo design e são muito sofisticados. Mas ganhámos e é a nossa marca que vai ser apresentada em setembro deste ano.

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Foi possível observar durante a manhã deste sábado um eclipse parcial do Sol, um dos dois fenómenos previstos para este ano. O eclipse, que teve início às 9h48 da manhã, atingiu o seu ponto máximo às 10h40 e foi visível em todo o continente português.

O eclipse foi também visível no noroeste de África, em grande parte da Europa, no norte da Rússia e na Gronelândia.

De acordo com os especialistas é necessário tomar algumas precauções ao observar estes fenómenos, como a utilização de proteção ocular adequada, uma vez que olhar diretamente para o Sol pode provocar danos irreversíveis na visão.

A informação foi avançada à Lusa pelo presidente do Conselho de Administração da ULS de Santa Maria, Carlos Martins, que adiantou que Luís Montenegro tem prognóstico favorável e deverá ter alta nas próximas horas.

“Sensivelmente às 13:00, o primeiro-ministro deu entrada no hospital e, em função da sintomatologia, foi dirigido à cardiologia onde está ainda internado. Mas o prognóstico é favorável e espera-se que tenha alta nas próximas horas”, afirmou.

Há menos de um ano, a Tesla garantiu numa reunião com investidores que, em 2030, estaria a vender mais de 20 milhões de carros em todo o mundo. Hoje luta para conseguir estancar a quebra brutal de vendas que acontece um pouco por todo o planeta. No ano passado, a marca registou a primeira queda de vendas anual da sua história recente, o que não tinha acontecido nem nos anos da pandemia.

E a situação não parece melhorar em 2025, a avaliar pelos números de fevereiro. Na China, por exemplo, o maior mercado mundial de carros, a Tesla caiu 49% e na Alemanha a descida foi ainda maior, atingindo os 76,3%. Também na Noruega, o país com maior penetração de veículos elétricos, a queda foi de 44%. 

A somar a esta crise, a Tesla enfrenta agora outro problema: muitos proprietários de veículos da marca estão a vendê-los a um ritmo sem precedentes. 

Segundo um estudo efetuado pelo maior site de carros em segunda mão dos EUA, o Edmunds, a troca de Teslas atingiu um novo pico neste país. Na primeira quinzena de março, 1,4% dos carros usados que estavam à venda eram da marca de Elon Musk, quando em igual período do ano passado esta percentagem era apenas de 0,4%. Ou seja, mais do que triplicou o número de pessoas que pretendem trocar o seu Tesla.

E a procura de usados da marca também baixou. Segundo a Car.com, outro site de venda de automóveis, a procura de Teslas usados baixou 16% em fevereiro, o que levou a uma queda abrupta dos preços da marca no mercado de segunda mão, como mostra o CarGurus num estudo que refere que o valor dos usados da Tesla está a cair mais do dobro do que as outras marcas.

Em Portugal esta tendência também se verificou. No site Standvirtual, por exemplo, os anúncios de vendas de modelos da Tesla usados subiram 80% em janeiro deste ano, face ao mesmo mês do ano passado.

A marca tem ainda vindo a ser alvo de protestos e campanhas que visam atingir o principal acionista da empresa, Elon Musk, bem como o seu papel no executivo de Donald Trump.

Nalguns casos, como nos EUA, surgiram atos criminosos de vandalismo, com a destruição de concessionários ou incêndios de carros e de postos de carregamento.

A empresa enfrenta uma crise de incerteza quanto ao seu futuro devido às tarifas que Donald Trump impôs sobre mercados como China, México e Canadá, de onde provém uma boa parte dos componentes usados para o fabrico dos carros. E todos estes problemas se refletem no valor da empresa.

As ações da Tesla atingiram o seu pico no dia 17 de dezembro de 2024, ao conseguirem um valor de 479 dólares na bolsa de Nova Iorque, mas em meados de março valiam só 222 dólares, ou seja, sofreram uma perda de 53,6% em apenas três meses.

Na semana passada, Elon Musk reuniu-se com os seus funcionários e apelou para que estes “segurassem as ações da Tesla, o que levou os títulos a subirem 11% numa única sessão de bolsa. Mesmo assim, face ao pico atingido em dezembro, a Tesla ainda perde 41,9% do seu valor. Em apenas dois meses, Elon Musk, o homem mais rico do mundo, perdeu cerca de 130 mil milhões de euros.

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É já na madrugada deste domingo, 30, que ocorre a mudança para o horário de verão. Quando o relógio marcar a 1 hora da manhã (em Portugal Continental e Região Autónoma da Madeira) os ponteiros adiantam 60 minutos e a hora “salta” para as 2 horas. Nos Açores, a mudança é diferente: à meia-noite os relógios avançam para a 1 da manhã.

A mudança de horários de verão e inverno é regulada por uma lei comunitária europeia de 2001, que prevê a alteração dos relógios no último domingo de março e no último domingo de outubro.

Este ano, a hora volta a mudar para o horário de inverno a 26 de outubro, sendo que os relógios, quando marcarem as 2h da manhã, devem ser atrasados uma hora.

O eclipse solar parcial que vai ocorrer durante duas horas na manhã de sábado vai provocar uma redução de 23% da produção do Sistema Elétrico Nacional prevista para aquele horário, segundo a REN – Redes Energéticas Nacionais.

“O fenómeno ocorrerá no território continental entre as 9h30 e as 11h30 e provocará uma perda de geração estimada de 560 MW [megawatts], o que representa cerca de 8,5% do consumo e 23% da produção do Sistema Elétrico Nacional previsto para este horário”, anunciou a REN, em comunicado.

Durante o eclipse, a REN estima uma perda de 10 MW por minuto e uma recuperação à taxa de 22 MW por minuto, “o que causará desafios operacionais relacionados com o equilíbrio entre geração e o consumo no SEN e com controlo do desvio na interligação com Espanha”.

O fenómeno em que o sol vai ser parcialmente coberto pela lua, durante duas horas, vai ser visível em todo o território continental.

A deputada do Chega Cristina Rodrigues foi acusada de crime de dano informático. Em causa está uma queixa apresentada pelo PAN, partido em que foi militante e para o qual trabalhou como assessora jurídica, por ter eliminado milhares de emails depois de se desvincular dessa força partidária e passar a deputada não inscrita, ainda antes de aderir ao partido de André Ventura.

Segundo o despacho de acusação a que a VISÃO teve acesso, Cristina Rodrigues é acusada da “prática de um crime de dano relativo a programas ou outros dados informáticos”.

O Ministério Público afirma que “a arguida Cristina Rodrigues agiu livre, deliberada e conscientemente, acedendo às mensagens do email cristina.rodrigues@pan.com.pt – e apagando-as –, num momento em que já não detinha autorização para aceder ao referido email”.

Para a acusação, o intuito era o “impedir o Partido PAN de prosseguir a sua atividade política”, privando o partido de aceder a milhares de mensagens às quais tinha tido acesso enquanto jurista contratada pelo grupo parlamentar.

Ao apagar as mensagens, Cristina Rodrigues pôs em causa os termos do contrato que a vinculava ao PAN.

“De acordo com o referido contrato, competia ao Partido PAN colocar à disposição da arguida Cristina Rodrigues os adequados instrumentos de trabalho, devendo esta fazer um uso prudente dos mesmos, ficando, ainda, estipulado que a arguida Cristina Rodrigues deveria guardar confidencialidade e segredo das matérias, informações e documentos que chegassem ao seu conhecimento devido às funções exercidas, bem como assegurar a integridade de quaisquer conteúdos a que tivesse”, lê-se no despacho de acusação.

A Assembleia da República já recebeu o pedido de levantamento da imunidade parlamentar. Mas uma vez que a pena prevista para o crime de dano informático é de cinco anos, o levantamento da imunidade deve ser automático.

“A polícia invadiu a minha casa.” Enquanto ajeitava o nó da gravata, em frente ao telemóvel no closet da sua habitação, o presidente da câmara de Istambul anunciava a milhares de seguidores das redes sociais aquilo que, numa voz pausada e serena, considerava estar a acontecer: um “golpe” para “impedir que a nação escolha o próximo Presidente”. Na curta mensagem, com menos de 60 segundos, difundida imediatamente antes de ser detido, Ekrem Imamoglu fez questão de anunciar que “não iria render-se” e deixou um aviso público a quem ordenou a sua prisão: “A vontade do povo não pode ser silenciada.”

O apelo desencadeou a maior onda de protestos dos últimos anos em Istambul, com milhares de pessoas a concentrarem-se nas ruas e a desafiarem as forças policiais e a proibição de manifestações, com palavras de ordem que não deixam margem para dúvidas sobre o confronto que hoje divide a Turquia: “Erdogan, ditador!” e “Imamoglu, não estás sozinho!”

A detenção de Imamoglu, sob acusações de corrupção, que ele nega, desencadeou uma imensa revolta popular (combatida com milhares de detenções de manifestantes), mas também assustou os mercados, provocando a quebra da lira turca e lançando grandes incógnitas sobre futuros investimentos estrangeiros no país.

O governo de Erdogan tem feito questão de afirmar que a detenção de Imamoglu mostra que ninguém na Turquia está acima da lei e que os tribunais do país são independentes. Mas, para os apoiantes de Imamoglu, a detenção do popular presidente da câmara da maior cidade do país é vista como quase o último passo alarmante no plano de Erdogan, e do partido AKP, para transformar a Turquia numa ditadura.

Inimigo principal

Ekrem Imamoglu ganhou, nos últimos anos, uma enorme notoriedade na Turquia, como uma das principais esperanças democráticas para afastar Erdogan e o APK do poder. No entanto, a grande maioria dos turcos nunca tinha ouvido falar do social-democrata Imamoglu até 2019, quando ele ganhou as eleições para a câmara de Istambul, por uma diferença de 13 mil votos em relação ao candidato do AKP. Surpreendidos com o resultado, os apoiantes de Erdogan conseguiram que a eleição fosse anulada e repetida três meses depois: Imamoglu voltou a ganhar, desta vez por uma diferença de 800 mil votos e, dessa forma, pôs fim a 25 anos de domínio dos islamistas conservadores em Istambul – um período iniciado precisamente por Erdogan, que presidiu a autarquia no final do século passado.

Com essa notoriedade, Imamoglu foi visto como um possível candidato às presidenciais de 2023, em que Erdogan surgia enfraquecido, depois da tragédia do sismo, em que morreram milhares de pessoas e foram postas a descoberto duas das principais lacunas da Turquia: o atraso dos serviços de socorro e os esquemas de corrupção que permitiram a construção de muitas habitações sem cumprirem as regras antissísmicas.

Apoiantes de Imamoglu “A vontade do povo não pode ser silenciada”, lembra o presidente da câmara de Istambul

No entanto, por causa de umas declarações em que qualificou de “idiotas” alguns membros do Supremo Tribunal, acabou condenado por difamação e… proibido de se apresentar como candidato às presidenciais.

Em 2024 voltou a vencer a câmara de Istambul, numas eleições em que o seu partido ganhou as principais cidades do país, projetando até a ideia de que, apesar das purgas, das mudanças na Constituição e da perseguição a muitos opositores, a Turquia ainda continuava a ter um sistema democrático confiável. E que até seria possível, num futuro próximo, derrotar Erdogan e o AKP nas urnas, apesar das frequentes alegações de fraude, falsificação e ingerência política nas mesas de voto, que ocorrem em todas as eleições.

Risco de ditadura

A ilusão democrática morreu para milhares de turcos a 19 de março, com a detenção do presidente da câmara de Istambul, acusado de corrupção e suspeita de terrorismo. Além de arriscar uma pena pesada, Imamoglu terá de vencer uma outra batalha para ser candidato, mesmo que seja absolvido em tribunal: poucos dias antes da sua prisão, a Universidade de Istambul, por precaução, cancelou-lhe o diploma – na Turquia, a Constituição só permite que o mais alto cargo da nação seja ocupado por licenciados.

O risco de ditadura é reforçado ainda pelo facto de a detenção de Imamoglu não ter sido um caso isolado. Mais de uma centena de mandados de prisão foram emitidos para pessoas próximas dele, incluindo dois outros autarcas. E com o intensificar dos protestos, várias medidas têm sido tomadas que restringem a liberdade e os direitos individuais dos cidadãos: ruas cortadas, estações de metro fechadas, proibição de circulação em diversas zonas, ações de revista a transeuntes e diversas barreiras policiais.

Ao longo dos seus 102 anos de História como república, a Turquia nunca teve um regime absolutamente democrático. Nas últimas três décadas, com o objetivo de poder aderir à União Europeia, cujo pedido formal até foi feito por Erdogan, foram dados passos importantes para a consolidação de regras democráticas. Agora, o país que possui o segundo maior exército da NATO, logo a seguir ao dos EUA, pode estar a viver momentos decisivos em relação ao futuro do seu regime.

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Luís Montenegro e o seu escritório são alvo de uma investigação do Ministério Público há dois anos. Em causa está uma denúncia sobre a requalificação do canal ferroviário de Espinho, pela Barcelos, Alexandre Barbosa Borges, SA (ABB), cujo valor derrapou, segundo contas do Expresso, cerca de 9 milhões de euros acima do previsto. Um valor que, de acordo com os pareceres dados por Montenegro e por um dos seus sócios, devia ser suportado pela Câmara de Espinho, à data da adjudicação liderada pelo social-democrata Pinto Moreira.

Na edição desta sexta-feira, o Expresso revela que, entre 2019 e 2020, o escritório de Montenegro produziu vários pareceres jurídicos, em nome da Câmara de Espinho, para resolver os diferendos que surgiram entre a equipa de fiscalização da obra e a ABB. Alguns deles foram favoráveis à pretensão do empreiteiro.

Parecer de Montenegro arrasa serviços da Câmara

Desses pareceres destaca-se um assinado pelo próprio Luís Montenegro em maio de 2020. “Não compete à fiscalização emitir opinião jurídica que, ademais e in casu, se encontra totalmente errada nos seus pressupostos”, escreveu Montenegro, depois de os fiscais da Câmara entenderem que não só o empreiteiro tinha falhado um prazo legal como estava a estava a reclamar à autarquia um pagamento para o qual os técnicos entendiam não haver fundamentação.

 “O enquadramento dos trabalhos, que em nosso entendimento são da sua [ABB] responsabilidade em 50%, não está correto, mas [o empreiteiro] não apresenta justificação para os mesmos”, reclamavam os fiscais da Câmara de Espinho.

Luís Montenegro arrasou a fiscalização. “A arguição jurídica da fiscalização tendente à sua aplicação é, em nosso entendimento, despropositada e somente explicável por desatenção ou desconhecimento técnico-jurídico”, argumentou. Mais: nesse parecer Montenegro defendia que a Câmara deveria introduzir no contrato uma cláusula proposta pela ABB na qual pedia uma série de valores a mais por trabalhos feitos, mas não aprovados pela autarquia.

Esse parecer levou Pinto Moreira a introduzir a referida cláusula, que custou 116 mil euros à Câmara de Espinho num contrato adicional.

Não foi o único contrato adicional feito com base em pareceres jurídicos dados por advogados do escritório onde então Luís Montenegro era sócio. Ao todo foram seis os contratos adicionais firmados entre a autarquia e a ABB. O mais caro deles custou 1,8 milhões à Câmara de Espinho e foi assinado na sequência de pareceres da SP&M que contrariavam os serviços de fiscalização da Câmara.

 “Mesmo não identificando agora esse parecer em concreto, todo o trabalho da sociedade de advogados foi elaborado para a Câmara Municipal e defendendo sempre, única e exclusivamente, o interesse do município”, respondeu ao Expresso fonte oficial do gabinete do primeiro-ministro sobre a intervenção direta de Montenegro como jurista neste processo.

Obra cujo preço foi definido por arquiteto que fez casa de Montenegro derrapou 9 milhões

Neste momento e apesar dos seis contratos adicionais que fizeram subir o valor da obra, a ABB pede ainda em tribunal um total de 6 milhões de euros, em dois processos, o primeiro dos quais interposto em setembro de 2023, quando a Câmara já estava nas mãos do PS.

Segundo as contas do Expresso, caso o empreiteiro ganhe duas ações administrativas que tem atual­mente em tribunal contra a autarquia, a obra terá uma derrapagem final de 73,2% sobre o preço base do concurso que ganhou, podendo custar mais 9 milhões do que o inicialmente previsto.

A ABB ganhou o concurso para a requalificação do canal ferroviário de Espinho, apresentando uma proposta sete mil euros mais baixa do que o preço-base do concurso público, quando as outras quatro propostas concorrentes estavam 25,3% a 40,5% acima desse valor.

A obra foi adjudicada por 12,4 milhões de euros e inclui a construção de um parque de estacionamento subterrâneo de 400 lugares no centro da cidade.

Segundo o Expresso, preço-base foi definido com base num orçamento desenhado pelo projetista contratado pela Câmara: o gabinete de arquitetura RDLM, o mesmo que desenhou a casa de Espinho de Montenegro.

A RDLM, segundo consta no site deste gabinete de arquitetura, foi também a responsável pelo projeto do Casino de Chaves, que pertence à Solverde, até há pouco tempo um dos clientes da Spinumviva, a sociedade familiar de Montenegro.

Sucessor do PM no seu escritório contradiz Montenegro

Na contestação às pretensões da ABB em tribunal pedindo mais pagamentos à Câmara de Espinho, o sócio que viria a substituir Luís Montenegro no seu escritório tem um entendimento oposto ao que Montenegro teve quando emitiu um parecer sobre este processo.

“É absolutamente falso que o empreiteiro não tivesse considerado na sua proposta [submetida a concurso público] os condicionalismos das infraestruturas não cadastradas, bem como a necessidade de se coordenar e obter informação atualizada junto de entidades terceiras”, escreve Nuno Castro Marques, dando razão à fiscalização da Câmara e falando em “desrespeitos inaceitáveis da ABB relativamente a instruções transmitidas pela fiscalização”.

PGR confirma inquérito

À VISÃO, fonte oficial da PGR confirma a existência do inquérito, sem dar mais pormenores. “O inquérito em referência encontra-se em investigação e está sujeito a segredo de justiça. Não tem arguidos constituídos”, respondeu por escrito a PGR a 12 de março, quando confrontada com um pedido da VISÃO sobre o inquérito que corre há dois anos, na sequência de uma denúncia, e envolve o primeiro-ministro.

Apesar de a investigação envolver o primeiro-ministro, a Procuradoria-Geral da República nunca deu nota pública do processo, que se iniciou quando Lucília Gago estava ainda em funções e continua agora com o seu sucessor, Amadeu Guerra.

Quando António Costa foi referido em escutas intercetadas no âmbito da Operação Influencer, a PGR liderada por Lucília Gago entendeu que era necessário tornar público que o então primeiro-ministro estava a ser alvo de uma investigação, num parágrafo que levaria Costa a demitir-se.

A ligação entre a ABB e a casa de Espinho de Montenegro

Segundo o Correio da Manhã, o betão usado na casa de seis andares construída por Luís Montenegro em Espinho foi fornecido pela ABB à Rui Mota Oliveira Services. Gaspar Barbosa Borges, presidente da ABB, disse àquele jornal que “a ABB não executou qualquer trabalho na moradia do Dr. Luís Montenegro. A sociedade Rui Mota Oliveira Services foi, em tempos, cliente da ABB e, nessa qualidade, contratou com esta última fornecimentos de betão para diversas obras, incluindo para a obra mencionada [de Luís Montenegro]”.

A Rui Mota Oliveira Services entrou em insolvência em janeiro de 2020, ainda durante a obra da casa de Montenegro, cujos trabalhos de construção terão começado em novembro de 2016 e terminado em outubro de 2020.

Apesar da insistência dos jornalistas e do pedido da PJ no âmbito de um outro processo (entretanto arquivado) sobre a casa de Espinho, Luís Montenegro nunca revelou as faturas do pagamento da sua moradia nem aos jornais nem às autoridades e nunca revelou o custo da construção.

Segundo o Correio da Manhã, a Rui Mota Oliveira Services tem uma dívida de mais de 41 mil euros à ABB que, de acordo com o mesmo jornal, nunca terá sido reclamada apesar de esse crédito estar reconhecido no processo de insolvência.

Gaspar Barbosa Borges recusou divulgar o preço do betão fornecido à obra alegando, ao Correio da Manhã, estar em causa “informação comercial sensível”. Ainda assim, o gestor assegurou que “as faturas respeitantes ao fornecimento de betão para essa obra [de Montenegro] foram pagas pela Rui Mota Oliveira Services no dia 5 de abril de 2018, mediante transferência bancária, tendo sido emitidos pela ABB os competentes recibos no dia 10 de abril de 2018”.

As polémicas da ABB

A ABB tem sido notícia por vários processos judiciais. No mais mediático o CEO da empresa e o ex-presidente da Câmara de Santarém pelo PSD, Moita Flores, acabariam por ser absolvidos em primeira instância em abril de 2024 de um caso que envolvia suspeitas de crimes de branqueamento de capitais e de corrupção por causa da construção de um parque de estacionamento na cidade ribatejana.

Em junho de 2024 foi notícia o litígio entre a ABB e o Futebol Clube do Porto, com a construtora a acusar o clube de incumprir um acordo para a construção da Academia da Maia.

E em setembro do ano passado, foi noticiado que a ABB estava a impugnar a adjudicação de uma obra de construção de uma residência universitária em Braga, com dinheiros do PRR.

Gaspar Barbosa Borges, o presidente da ABB, é administrador do Sporting Clube de Braga.