“Isso também se aprende”, disse o Presidente da República, confrontado com as dificuldades da ministra da Administração Interna em dar esclarecimentos à comunicação social. “Eu também tive de aprender.” Maria Lúcia Amaral, antiga provedora de Justiça, há dois meses e meio no cargo, teve o seu literal batismo de fogo com os pavorosos incêndios que foram deflagrando pelo País, em agosto. De todas as frentes surgiam críticas de deficiências no comando, descoordenação entre proteção civil e bombeiros e falta de pulso da tutela. Os dois aviões Canadair contratados permaneciam pousados, com avarias, e a situação foi remediada com o empréstimo de dois aparelhos, e respetivas tripulações, do Reino de Marrocos. O Governo não declarou estado de contingência, nem de calamidade, conforme a sugestão do secretário-geral do PS e ex-ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, o que conferiria meios legais para uma atuação mais musculada no combate aos fogos. A ministra explicava que todas as medidas e todos os meios já estavam no terreno, mesmo sem estado de contingência ou de calamidade. Em vários takes, a comunicação era a possível, como nestes dois diálogos com os jornalistas.
Diálogo 1:
Jornalista: “Toda a gente se queixa de falta de meios, senhora ministra…”
Ministra: “Os meios… aahhh… pois… perante tudo o que está a acontecer, os meios são sempre ilimitados [Sic]. Sempre.”
Jornalista: “Ilimitados?…”
Ministra: “Minha senhora, lamento, mas já lhe respondi!”
Diálogo 2:
Jornalista: “No ano passado, o primeiro-ministro já tinha pedido mão pesada para os autores das ignições. Que tipo de mão pesada?”
Ministra: “Ora bem: que tipo de mão pesada… ahhh… Não sei. E acho que também as autoridades não sabem. [E prossegue] Eu tive a possibilidade de estar com o senhor primeiro-ministro e, agora mesmo combinámos – não tínhamos combinado antes –, mas combinámos que, devido à situação crítica, iremos os dois já para a sede da Autoridade Nacional da Proteção Civil. Até por uma questão de cortesia perante os responsáveis da Autoridade Nacional da Proteção Civil, que acabaram por saber, deste modo, que nós lá vamos, que os senhores [Jornalistas] me dispensem o tempo de ir conversar com eles para que eles se preparem.”
E no final da leitura de um comunicado numa conferência de imprensa, quando os jornalistas tentavam colocar algumas perguntas: “Em nome de todos, muito, muito obrigada. [E levantando-se, dirigindo-se aos seus colegas na mesa] Vamos embora.”
Perante estas gaffes que evocam vagamente o estilo do antigo PR Américo Tomás, Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou ao que considera uma necessidade de aprendizagem da ministra: “Nem sempre quem está perante situações de sufoco é capaz de responder em conformidade.”
Túmulo de políticos
Alberto Costa, António Costa, Eduardo Cabrita, Eduardo Pereira, Fernando Gomes, Jaime Gama, Jorge Coelho, José Luís Carneiro, do PS; Ângelo Correia, Eurico de Melo, Fernando do Amaral, Magalhães Mota, Dias Loureiro e Miguel Macedo, do PSD; e Costa Braz, independente: o que têm todos estes nomes em comum, além de terem sido ministros da Administração Interna? Eram todos pesos políticos importantes, figuras reconhecidas, pela sua experiência e pela sua competência, e, na maioria dos casos, não só muito próximos do circuito íntimo dos seus primeiros-ministros, mas também exímios gestores da comunicação política. Essas qualidades, justa ou injustamente, não são, no seu conjunto, reconhecidas a figuras como Silveira Godinho (primeiro MAI da maioria absoluta de Cavaco Silva) ou, mais recentemente, Constança Urbano de Sousa (António Costa) ou Margarida Blasco e Maria Lúcia Amaral (Luís Montenegro).
Mesmo assim, experiência política ou saber acumulado nunca foram suficientes para mandatos incólumes no Ministério da Administração Interna, notoriamente uma casa cheia de minas e armadilhas e um dos cargos mais pesados e trabalhosos de qualquer governo. E algumas destas personalidades tiveram mesmo de sair antes do final dos respetivos mandatos, acabando a carreira política. O MAI é responsável por uma área de soberania que abarca as várias polícias (à exceção da Judiciária, que fica na alçada do Ministério da Justiça), os corpos de bombeiros, a proteção civil, toda a área de segurança interna, quer no policiamento e no monopólio da força do Estado, quer na resposta a catástrofes naturais, e ainda a nevrálgica e sensível organização dos processos eleitorais. A tensão entre organismos, a necessidade mastodôntica de coordenação entre todos eles, os interesses corporativos envolvidos e a exposição pública numa das áreas mais escrutinadas pela comunicação social e pelo eleitorado fazem deste lugar um verdadeiro “comboio-fantasma”. A isto se junta o circo mediático dos nossos dias.
Secos & molhados
Um dos primeiros grandes exemplos deste escrutínio em direto – mesmo descontando as imagens da então estação única de televisão, a RTP – foi a reportagem da TSF, a 21 de abril de 1989, na manifestação de polícias fardados na Praça do Comércio (também conhecida pelo nome pré-pombalino de Terreiro do Paço), em Lisboa. Enquanto o repórter João Almeida fazia um relato vívido e emocionante dos acontecimentos, o Corpo de Intervenção (CI) da PSP, muito contrafeito, carregava, timidamente, sobre os colegas manifestantes. Pela primeira e única vez, na História da democracia portuguesa, foram usados canhões de água – e foram-no contra polícias! Os homens de farda seca do CI encharcavam os colegas, agora molhados, das esquadras do País. A imagem é a de uma barreira firme, suportando os jatos de água, tendo sido necessário o envio de um segundo contingente do CI para se ter assistido a uma carga, digna desse nome, sobre os manifestantes, que, finalmente, dispersaram. O CI era comandado por um oficial de cavalaria, general Governo Maia, muito pouco sensível às nuances cívicas de uma polícia civil e determinado em manter disciplina militar na PSP.
Os polícias reivindicavam direitos que hoje parecem óbvios, como os de terem uma associação sindical, um dia de folga semanal, melhores remunerações e instalações e direito de defesa em processos disciplinares. O ministro da Administração Interna, Silveira Godinho (aliás, ligado ao primeiro-ministro, Cavaco Silva, por laços familiares), ficou imediatamente marcado pela desastrosa intervenção e pela forma inábil como lidou com a crise. O desprestígio da sua polícia parecia irremediável, depois das cenas lamentáveis que não soube prevenir nem mitigar. Seria remodelado em janeiro do ano seguinte, numa primeira leva de substituição de ministros. Para o seu lugar seguiria o experientíssimo e politicamente hábil Dias Loureiro, um dos grandes ministros políticos de Cavaco, que conseguiria a proeza de se manter até ao fim das maiorias absolutas cavaquistas e sendo o ministro, nos últimos 40 anos, que mais tempo ocupou o cargo – não deixando de enfrentar os seus próprios problemas, nos bloqueios à Ponte 25 de Abril, em 1994…
Mais tarde, na campanha eleitoral para as legislativas de 1991, Cavaco, que, embora se gabasse de não ler jornais, não tinha esquecido a reportagem da TSF, vingou-se, com um insuspeitado sentido de humor, do repórter João Almeida, escalado para acompanhar a campanha. Numa sessão de perguntas, arrancou-lhe o microfone das mãos e imitou-o, numa espécie de relato que revivia as emoções daquela tarde, no Terreiro do Paço: “E agora salto por cima de uma cadeira, e passo por baixo de uma mesa, já levei um pontapé na cabeça, estou a aproximar-me do primeiro-ministro…”
O atentado dos pregos
Por falar em situações caricatas, ficou célebre o caso em que o ministro do último governo de Francisco Pinto Balsemão, Ângelo Correia, considerou uma ameaça para a segurança nacional o facto de ter sido encontrada uma caixa de pregos no interior do automóvel de um dirigente sindical. Em 1982, a CGTP convocou a primeira greve geral da democracia, uma greve um tanto ou quanto política, visto que o seu principal objetivo era ajudar a derrubar o já periclitante governo da AD. Esta ameaça laboral, de consequências imprevisíveis – nunca se havia feito uma experiência similar – provocou grande nervosismo no governo. O titular da pasta, Ângelo Correia, entrou em ação, dramatizando ao máximo aquilo que considerava uma “insurreição” contra o regime democrático. E quando foi encontrada, num carro da central sindical, uma caixa de pregos, o ministro publicamente deduziu que os pregos iriam ser cirurgicamente espalhados pelas estradas, furando pneus e impedindo a circulação das viaturas policiais, de forma a assegurar “o sucesso da sublevação” sindical. A gargalhada foi geral, em todo o País.
De novo os polícias
Os polícias representaram, desde o episódio dos “secos & molhados” e até hoje, um foco de tensão com a tutela. O MAI de António Guterres, Alberto Costa, agastado com alguns excessos de violência policial, disse uma frase que o queimou para sempre, junto da corporação, dinamitando o seu desempenho no cargo: “Esta não é a minha polícia!” Mas os governos sociais-democratas também tiveram os seus revezes. Em novembro de 2013, uma gigantesca manifestação de polícias, que invadiu as escadarias da Assembleia da República, seria o primeiro incidente em que as próprias autoridades se excederam, na linha de fronteira entre o protesto legal e a ação violenta. Um jogo do gato e do rato repetiu-se, como nos secos e molhados, mas desta vez sem a espontaneidade de 1989 e com a ação de agitadores previamente preparados. Era o primeiro sinal do que, uma década depois, se fazia sentir com ações supostamente inorgânicas, e fora do âmbito sindical, promovidas pelo Movimento Zero. A politização dos protestos policiais (bem como dos bombeiros profissionais) veio trazer novos desafios aos ministros do setor, sobretudo depois da guerra dos subsídios de risco, que o governo de António Costa tinha atribuído à Polícia Judiciária e negado às forças de segurança. Um legado tóxico do governo de maioria absoluta do PS.
Mas houve outro ministro socialista mais antigo – e um dos maiores seniores políticos do PS, de quem chegou a dizer-se que poderia ter ensaiado, em vez de Jorge Sampaio, uma candidatura presidencial em 1996 – de seu nome Fernando Gomes, MAI entre 1999 e 2000, que também se deu pessimamente com os ares tóxicos do ministério. Confrontado com uma onda de assaltos a bombas de gasolina em várias autoestradas do País, sem qualquer medida eficaz para pôr cobro à situação, o antigo presidente da Câmara Municipal do Porto mostrava inépcia total. O assalto e a tentativa de violação da atriz Lídia Franco, então muito popular, numa destas ações de carjacking, potenciou o alarme da opinião pública. Sabendo-se da existência de um gangue composto por cerca de oito jovens negros, Fernando Gomes atribuiu as culpas à… “imigração descontrolada”: “É evidente que há também aqui uma outra questão, que é a questão da legislação sobre a imigração, que estará em debate na próxima semana na AR. Eu espero que se possa vir, a partir daí, a apertar o cerco e a manter uma rede fina de controlo sobre a imigração”, disse o ministro, numa intervenção que nos parece estranhamente familiar…
Noutra frente, num episódio bastante embaraçante, Gomes viu-se desautorizado quando quis proibir as touradas de morte em Barrancos. O acumular de casos e casinhos levou à sua exoneração, um ano depois de ter sido empossado, facto que o ex-autarca nunca perdoou ao primeiro-ministro António Guterres, de quem fora um dos mais próximos.
Mais desastres socialistas
A propensão para a gaffe da atual ministra Maria Lúcia Amaral ainda não atingiu o ponto que levou o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a exigir – embora apenas nas entrelinhas de um discurso fatal – a demissão de uma sua antecessora socialista. No rescaldo da “tranche 2” dos incêndios de 2017, desta vez, depois de Pedrógão, em junho, o caso de Oliveira do Hospital, em outubro, com mais um acumular de mortes, e perante as críticas de falta de empatia de António Costa e da ministra Constança Urbano de Sousa, esta era diariamente confrontada pelos jornalistas sobre uma eventual demissão. E foi com os cadáveres quentes dos incêndios de 15 de outubro que respondeu, a 16, depois de muito pressionada, e revelando um colapso emocional que não a recomendava para continuar no cargo: “Para mim seria mais fácil, pessoalmente, ir-me embora e ter as férias que não tive, mas agora não é altura de demissões.” Com esta afirmação, a ministra queria enfatizar o seu empenho e o seu sacrifício, mas o que os portugueses viram foi uma governante contrariada com a chatice de os incêndios lhe estragarem as férias. Num discurso que foi uma peça de filigrana política, proferido no dia seguinte, em Oliveira do Hospital, Marcelo exigiu uma “rutura” com o passado e aconselhou “humildade cívica”, exigindo um pedido de desculpas do governo às vítimas. Depois, exortou o executivo a tirar “todas, mas todas, as consequências da tragédia”, acrescentando que competia, agora, à Assembleia da República pronunciar-se sobre se queria ou não “manter o governo”. Minutos depois do discurso, Constança Urbano de Sousa caiu em si e pediu a demissão.
O sucessor, Eduardo Cabrita, tinha o condão de fazer regressar ao ministério a experiência política e a vantagem da proximidade pessoal ao líder. E notou-se logo uma mudança segura: Cabrita reforçou a profissionalização nos corpos de bombeiros, aumentando o número de equipas de intervenção permanente, apostou no Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da GNR, duplicando o dispositivo e passando a estar presente em todo o País para o combate e a prevenção dos incêndios. O ministro reativou a carreira de guardas-florestais com a admissão de novos elementos, o que não acontecia desde 2006, e, durante o seu mandato, acabaram as fases de combate a incêndios, que foram substituídas por níveis de prontidão. E o dispositivo passou a estar permanente ao longo do ano, além de terem aumentado os operacionais, viaturas e meios aéreos. Independentemente dos humores do clima, o certo é que as medidas tiveram efeito. Mas logo que a pressão política de alguns casos mal resolvidos pôs em causa a sua posição, Eduardo Cabrita deu sinais de descontrolo, com declarações polémicas, como quando chamou a si a responsabilidade pela recandidatura de Marcelo. O PR tinha dito, em 2017, que se voltasse a haver um verão com vítimas mortais, por causa da inépcia do Estado, não voltaria a candidatar-se. Com zero vítimas até 2021, Cabrita, sabendo que a sua estrela empalidecia em Belém, procurava puxar os galões ao mesmo tempo que ironizava, sobre o Presidente. “Candidata-se graças a mim…”
Entre outros casos, o que se tinha passado, entretanto? No aeroporto de Lisboa, um cidadão ucraniano, Ihor Homeniuk, tinha sido assassinado por elementos do SEF, um caso tornado público, mas desvalorizado pela onda mediática que, na altura, tinha as atenções monopolizadas pela pandemia da Covid-19. O caso esteve a borbulhar durante meses, com o MAI, perfeitamente conhecedor do incidente, a varrer o lixo para debaixo do tapete, até que, repentinamente, saltou para o prime time noticioso.
Mas havia outros casos: a autorização para os festejos dos adeptos do Sporting, pela conquista do Campeonato Nacional, na época 2019-20, em pleno estado de emergência pelas restrições da pandemia, com o MAI a empurrar a responsabilidade do aumento de infeções para a CML e para o clube, definiu uma quebra de autoridade do Estado perante o populismo futebolístico.
Outro caso em que o ministro ficou muito mal na fotografia, com buscas da PJ efetuadas no seu gabinete, foi, em 2019, o das “golas de fumo”. A empresa Foxtrot Aventura recebeu 267 mil euros pelo fornecimento dos kits de emergência do programa Aldeia Segura. E do valor total adjudicado pela Proteção Civil, mais de 100 mil euros foram atribuídos para a produção de 70 mil golas antifumo. Um preço superior ao habitual neste tipo de produto, sem que a ANEPC tenha feito qualquer consulta pública, como devia, para este serviço. Mais, as golas, 100% poliéster, eram altamente inflamáveis (mesmo tendo em conta que se destinavam a proteger do fumo e não das chamas, não deixavam de ser perigosas). Mas o ponto principal foi a coincidência de a Foxtrot Aventura ter sido fundada menos de dois meses depois da criação do programa Aldeia Segura. O dono da empresa era Ricardo Peixoto Fernandes, marido da socialista presidente da junta de freguesia de Longos, em Guimarães, Isilda da Silva. E a responsabilidade pela encomenda dos “kits de incêndio” não era clara, mas todas as diversas hipóteses comprometiam dirigentes socialistas. A consequência imediata fora a demissão de Francisco Ferreira, adjunto do secretário de Estado da Proteção Civil – e também presidente da concelhia do PS/Arouca. E foram constituídos arguidos o ex-secretário de Estado da Proteção Civil, José Artur Neves, o ex-presidente da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), Carlos Mourato Nunes, e outros 17, entre pessoas e empresas. Seis anos depois, o caso ainda está em julgamento.
Já depois da reeleição de Marcelo, em junho de 2021, deu-se o acidente na A6, em que a viatura de serviço do ministro atropelou um trabalhador quando decorriam trabalhos de conservação na via, entre Évora e Lisboa. Muito tempo depois, apurou-se que o carro seguia a 163 km/h e o motorista Marco Pontes viria a ser condenado por homicídio por negligência – sendo que também foi provada negligência por parte da vítima. Cabrita negou sempre responsabilidades, mas viria a ser acusado pelo Ministério Público, o que motivou, finalmente, a sua demissão, em dezembro de 2021.
O próprio chefe, António Costa, carregava um pecadilho dos seus tempos de MAI, num governo de José Sócrates: alguma responsabilidade no contrato celebrado para a aquisição do SIRESP. O Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) fora adjudicado a um consórcio liderado pela Sociedade Lusa de Negócios (depois rebatizada como Grupo Galilei, após a derrocada do BPN) por um valor de 538,2 milhões de euros. O despacho da adjudicação foi assinado pelo então ministro da Administração Interna de Pedro Santana Lopes, Daniel Sanches, a 23 de fevereiro de 2005, três dias após as eleições legislativas que resultaram na vitória por maioria absoluta do PS de José Sócrates.
Após a tomada de posse do novo governo, a 12 de março de 2005, Costa assumiu o cargo de ministro da Administração Interna e renegociou o contrato com o mesmo consórcio, confirmando a adjudicação definitiva do SIRESP. A única diferença foi ter conseguido reduzir o preço para 485,5 milhões de euros, mesmo assim, três vezes superior ao real valor definido em relatórios independentes posteriores.
Os vistos gold
Miguel Macedo, do PSD, quando se viu submergido pelo caso dos vistos gold, era um dos ministros mais competentes e populares do governo de Pedro Passos Coelho. Em novembro de 2014, no âmbito da Operação Labirinto, foram detidos o diretor do SEF, Manuel Palos, o presidente do Instituto de Registos e Notariado, António Figueiredo, e a secretária-geral da Justiça, Maria Antónia Anes. O MP investigava um caso de corrupção envolvendo o IRN o SEF num esquema para o favorecimento de empresários chineses que, aproveitando a legislação dos vistos gold, pretendiam declarar residência em Portugal. Três dias depois, o MP acertava no porta-aviões, com a demissão do ministro Miguel Macedo, que seria constituído arguido apenas seis meses depois. Em 2019, quando, no tribunal, se chegou ao final do julgamento, dos 47 crimes só sobraram sete. A pena mais grave foi a de António Figueiredo, com quatro anos de prisão suspensa. Maria Antónia Anes e os chineses Zhu Xiong e a mulher foram, além de Figueiredo, os únicos de 11 arguidos condenados, nomeadamente, por tráfico de influências. Manuel Palos foi absolvido e Miguel Macedo também, ilibado de todas as acusações. Mas era tarde para um regresso: “O tempo da política acabou”, declarou, à saída do tribunal, o ex-ministro. Quando, em março deste ano, o País ficou chocado com o falecimento prematuro e inesperado de Miguel Macedo, aos 65 anos, o elogio fúnebre foi unânime, em todos os quadrantes políticos. Ninguém queria que ele dissesse “vamos embora”.