A Meta encerrará, por enquanto nos Estados Unidos, o programa de verificação de factos em parceria com organizações independentes, que era utilizado desde 2016 para combater desinformação. Em substituição, Zuckerberg aposta num sistema baseado na contribuição dos próprios utilizadores, algo semelhante à abordagem da X, de Elon Musk.

Segundo o CEO da Meta, a medida é uma resposta às críticas sobre censura excessiva e aos erros causados por sistemas de moderação complexos. “Reduzir erros e simplificar políticas” foi a promessa feita por Zuckerberg num comunicado em vídeo, onde também defendeu que os governos, com destaque para os europeus, e a imprensa tradicional limitam a liberdade de expressão.

Comunicado em vídeo de Mark Zuckerbeg publicado no Facebook

Mais conteúdos políticos

Outra mudança significativa será a reintrodução de conteúdos políticos nos feeds, revertendo uma decisão anterior de os limitar devido a queixas relacionadas com suposto stress que estes conteúdos estavam a criar nos utilizadores. Zuckerberg argumenta que “os tempos mudaram” e que os utilizadores estão a pedir novamente por esse tipo de publicações.

Segundo Zuckerberg, a Meta vai concentrar os seus esforços em violações consideradas graves, como conteúdos relacionados com terrorismo, exploração infantil e tráfico de drogas. As restantes violações dependerão mais de denúncias dos utilizadores, com os filtros de moderação a aplicarem maior tolerância antes de remover qualquer publicação.

Para gerir estas alterações, a equipa de confiança e segurança da Meta será transferida da Califórnia para o Texas, para evitar acusações de serem parciais.

No comunicado em vídeo, Mark Zuckerberg comparou ainda a política mais permissiva dos EUA, que, segundo o líder da Meta, permite acelerar o desenvolvimento, criticando diretamente as políticas de regulação da União Europeia. Zuckerberg declara mesmo que espera colaborar com Trump para defender a liberdade de expressão e as empresas americanas.

O ano que passou foi difícil para todos os progressistas, defensores dos direitos humanos e da ecologia. Entre os principais factos políticos de 2024 contam-se vários resultados de relevo de partidos de extrema-direita que ameaçam os nossos direitos fundamentais (as legislativas em Portugal e a vitória de Trump são disso exemplo), a fraca evolução no combate às alterações climáticas (com a COP29 a revelar-se um fracasso), e a continuação de guerras cujos efeitos desumanos se fazem sentir quase na totalidade sobre as populações civis (como é na Ucrânia, mas principalmente em Gaza).

Em Portugal, 2024 foi um ano muito infeliz para alguns dos principais atores políticos nacionais. O nosso Presidente da República manteve-se em silêncio em temas-chave de direitos, liberdades e garantias, não reprovando com a veemência exigida o comportamento de deputados populistas ou a politização das forças de segurança; o presidente da Assembleia da República começou o seu mandato admitindo como “liberdade de expressão” declarações claramente racistas e revelando total incapacidade para conter os abusos parlamentares da extrema-direita; o Governo, comungando dos defeitos anteriores e de muitos outros, não teve a coragem para defender internamente e no panorama internacional os que mais sofrem, nomeadamente os Palestinianos.

Mas 2024 revelou-se também um ano de resistência e resiliência política, e essa deve ser a principal força dos progressistas e de todos os que se mobilizam pelos direitos fundamentais da cidadania. Soluções como a da Frente Popular, em França, ainda que sem grandes resultados práticos somente pela teimosia de Macron, mostraram como as populações valorizam o espírito de convergência e de oposição conjunta a partidos que ameaçam os próprios pilares da Democracia e do Estado Social e de Direito.

Esta resistência democrática esteve presente um pouco por todo o globo, desde as manifestações em Portugal pelo falecimento de Odair e pela rusga no Martim Moniz, ao sobressalto cívico que permitiu à Coreia do Sul não se transformar num Estado Marcial da noite para o dia, passando pelo tratamento dado pelo Estado brasileiro às intrusões de Musk e da sua rede social e à tentativa de golpe de Estado do ex-Presidente Bolsonaro.

Como disse Rui Tavares durante as legislativas, “havendo maioria de Esquerda seremos solução, havendo maioria de Direita seremos oposição”. Uma oposição resiliente e democrática, que debate políticas honestamente, alicerçada na boa-fé e com espírito construtivo (como se tem visto no país e nas autarquias onde o LIVRE tem presença, como em Lisboa), mas sem receio de estar com as populações, de as consciencializar contra as injustiças e incentivar a tomar as rédeas das suas reivindicações. Uma forma de estar de uma força política que, ou governa, ou se prepara para governar.

Foi essa maneira de fazer política que deu confiança aos cidadãos para que estes atribuíssem ao LIVRE, em 2024, o seu melhor resultado eleitoral de sempre, com a eleição de um Grupo Parlamentar de 4 Deputados, eleitos por Lisboa, Porto e Setúbal. O trabalho que tem sido desenvolvido na defesa política e através de diversas propostas legislativas, das diferentes liberdades, tem honrado o voto de quem confiou no LIVRE como força de resistência e resiliência democrática contra as incursões da Direita e Extrema-Direita, e como solução governativa futura.

Abordando apenas algumas das propostas apresentadas no último processo orçamental, procurámos reforçar as liberdades individuais com propostas relativas à Estratégia de Saúde para as Pessoas LGBTQIA+ e à regulamentação do estatuto jurídico das ONG’s LGBTQIA+, ao Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação, à Estratégia para a Igualdade, Inclusão e Participação das Comunidades Ciganas, à Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, à Estratégia Nacional para o Ruído Ambiente e o combate à poluição luminosa, entre outras.

Noutro domínio essencial, não esquecemos a liberdade para estudar e ascender socialmente, através de propostas como o passe gratuito para todos os Estudantes do Ensino Superior, a abolição das taxas e emolumentos em todos os ciclos de estudo, a limitação das propinas nos Mestrados, a criação de um Fundo Nacional para a Inovação, Acessibilidade e Inclusão Pedagógica, a atualização da ação social indireta com reforço do financiamento para alojamento, alimentação e saúde, bem como a criação de um vale-material e ainda a reposição do financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Infelizmente muitas destas soluções foram recusadas pela maioria de Direita. Resta-nos por isso desejar para 2025 o que não tivemos em 2024: um país onde todas estas liberdades possam ser reforçadas através das medidas propostas, e principalmente em que todos os atores políticos do espectro democrático se esforçam para a melhoria efetiva da vida de quem aqui vive e o reforço da nossa democracia e dos valores de Abril.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

O Canadá, para Trump, é o 51.º estado dos Estados Unidos. Ainda não é, mas tem de ser, diz o 47.º presidente americano. Trump também insiste que 10 milhões de canadianos adorariam ser integrados na União. Ninguém conhece esses números, mas não há mal nenhum em inventar.

A terceira afirmação do próximo presidente diz respeito à demissão do primeiro-ministro Justin Trudeau, após dez anos à frente do Governo em nome dos liberais, por perceber que irá perder as próximas eleições para os conservadores. Trudeau saiu porque o seu ciclo político estava esgotado, e nada disso tem a ver com a insistência do quase presidente.

A primeira grande indelicadeza de Trump foi atribuir o cargo de «Governador» ao primeiro-ministro, depois de se terem encontrado — e não foi apenas mais uma tolice para esquecer. Desde então, e à medida que o dia 20 se aproxima, o presidente eleito e confirmado não abandona a ideia de integrar o Canadá na União americana, sem esquecer a Gronelândia da Dinamarca, talvez o 52º estado.

É bizarro e infantil, mas os Estados Unidos construíram-se através de lutas contra os mexicanos para conquistar território — Texas, Colorado, Novo México e Califórnia — e com a compra do Alasca à Rússia. Trump quer alargar horizontes e, para isso, não hesita em usar as armas que tem: taxas fronteiriças e controlo de pessoas. Canadá, México e Dinamarca são alvos primários. Um dia destes reclama os Açores! Por razões de segurança nacional, como na Gronelândia.

Os sinais que chegam de Mar-a-Lago não são promissores. Corremos o risco de Trump estar pior do que já estava.

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A agência Lusa teve acesso, esta terça-feira, ao acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) que determina a condenação ao pagamento de 20 mil euros a um pai e ao filho menor, considerando que foram violados direitos de ambos quando a criança foi devolvida à mãe, num caso que remonta a 2018.

O tribunal considerou que as autoridades e a justiça portuguesas não respeitaram direitos do menor, então com 7 anos, não ouviram o pai nem investigaram a origem das escoriações que o menor apresentava nem os alegados maus tratos cometidos pela mãe, que morava em França, e a quem foi devolvido o filho por ordem do Ministério Público (MP).

Segundo a Lusa, os pais moravam em França e tinham guarda partilhada da criança. Em dezembro de 2017, após decidir voltar para Portugal, o pai deu entrada de uma ação de regulação das responsabilidades parentais no Tribunal de Família e Menores de Matosinhos, ao mesmo tempo que avançou com uma queixa contra a mãe por alegados maus-tratos, depois de constatar uma lesão no filho.

A progenitora, por sua vez, apresentou uma queixa junto das autoridades francesas por rapto, o que acabaria por levar à detenção do pai, em fevereiro de 2018, em Matosinhos, no seguimento de um mandado de detenção europeu.

Nesse dia, pai e filho foram levados para uma esquadra da PSP, enquanto o MP no Tribunal de Família e Menores de Matosinhos decidia devolver o menor à mãe, sem ouvir o pai ou a criança e sem mandar investigar os alegados maus-tratos. “O simples facto de as autoridades policiais terem retirado a criança da escola às 9h00 e, simultaneamente, terem detido o seu pai, mantendo-os numa esquadra de polícia mais de três horas, quando a criança foi levada para o Ministério Público antes de ser entregue à mãe, às 17h00, parece ser suficiente para afirmar que a criança não foi tratada com cuidado e sensibilidade ou com especial atenção à sua situação pessoal e bem-estar e com pleno respeito pela sua integridade psicológica”, lê-se no acórdão do TEDH.

O tribunal entende que as autoridades portuguesas não trataram o pedido de regresso da criança à mãe ao abrigo da Convenção de Haia de forma eficaz e expedita, mas, em vez disso, limitaram-se a executar o mandado de detenção europeu e a devolver automaticamente a criança à mãe, atribuindo “maior peso ao reconhecimento mútuo das decisões judiciais e aos interesses da mãe, ignorando outros fatores, em especial e principalmente, qualquer avaliação do interesse superior da criança e, em segundo lugar, os direitos do segundo requerente enquanto pai”.

O TEDH lembra que o artigo 8.º da Convenção exige que as autoridades nacionais estabeleçam um equilíbrio justo entre os interesses da criança e os dos pais e que, no processo de equilíbrio, deve ser dada especial importância aos interesses superiores da criança que, consoante a sua natureza e gravidade, podem prevalecer sobre os dos pais.

A Maldoror acaba de publicar uma nova edição do clássico Nossa Senhora das Flores, de Jean Genet. Em mais um contributo desse diamante que é Aníbal Fernandes, o regresso ao livro tremendo de Genet permitiu-me apreciar sobretudo a poética, mais do que espantar diante da crueza dos assassinos que fascinavam o francês.

Foi no tempo da faculdade que li pela primeira vez este livro e lembro do espanto perante o claro fascínio pela decadência. Uma avidez pelas figuras cuja moral não se redimia de modo algum, porque o homicídio era por toda a parte e sem remorso. Os amores de Genet, Mignon ou de Nossa Senhora das Flores eram todos parte de um quotidiano onde a ferocidade estava latente, como entre animais que, por um instante sem muita explicação, sucumbissem a uma natureza violenta que terminava tudo. Os amores de Genet eram, por isso, feitos de uma sujidade que feria quem lia, mais ainda porque narrados também com uma poética aqui e ali deslumbrante. Genet, poeta, deita sobre o feio daquelas vidas imagens deslumbrantes, palavras perfeitas que cintilam como luzes limpas na infinita escuridão.

Reler Genet agora é sobretudo catar essa cintilação. Já desenganado do triste que são os amores, mormente estes amores entre assassinos e prostitutos, o que hoje o texto do grande autor me traz é seu ritmo imparável e a beleza da expressão que acontece igual a modo de corromper a imoralidade. O belo parece ser o que num prato da balança compensa no outro a decadência inteira.

Recentemente, li um romance de um autor brasileiro que já se viu premiado e com várias tiragens esgotadas. Outono de Carne Estranha, de Airton Souza, é uma ficção acerca dos amores dos homens que garimpam ouro na Serra Pelada, arriscando a vida por um sonho de fortuna, desde logo descendo e subindo as tremendas escadas de onde tantos caem e morrem, por isso mesmo chamadas de “adeus-mamãe”. Afastados por meses ou anos de suas famílias, miseráveis as mais das vezes, procuram nas prostitutas a presença do amor e fervem numa saudade que se torna complexa, tormentosa, quase desumana.

Airton Souza é exímio no relato. Frontal, até gráfico em algumas passagens, sobretudo logo nos primeiros parágrafos, o autor usa da mesma secura que Genet é capaz, mas traz uma sensualidade que só o calor inventa. Ainda assim, o trunfo de Souza está também na potência poética. Aqui e ali, sem demasiada explicação, as emoções são abeiradas por expressões impossíveis de definir. Momentos de certa suspensão de sentido onde o que importa é a criação de uma imagem de espanto que, invariavelmente, aprofunda mais a carência e o desamparo, que é o mesmo que dizer, complica o amor e seu exercício.

O livro respira desse modo. Narra o que pretende que saibamos mas pulsa segundo o aparecimento dessa pérola poética que nos diz sobretudo que o fundamental escapa a todos os conceitos. O ritmo de tudo quanto se conta fica ferido dessa beleza mas também do incerto que carrega, como se fosse anúncio de miragem, de promessa impossível, lugar imaginário a que ninguém vai ser capaz de chegar. Esse lugar, que é substancialmente o amor, pode ser apenas o desejo de regressar a casa. Coisa que não se garante. Pertence ao sonho. Ali, todos, por mais brutos, feridos ou ferozes, se movem pelo sonho. São assombrados pelo sonho.

O livro de Airton Souza, que infelizmente ainda não está editado em Portugal (Companhia das Letras no Brasil), é tristíssimo e lindo, profundamente lindo, ainda que todo feito da lama do garimpo, ainda que todo feito de fome e saudade, da pertura da morte e da violência. Julgo que não havia lido sobre amores tão ásperos desde que lera Genet na juventude. Do mesmo jeito, por um tempo, dá até medo.

Palavras-chave:

António está decidido. E sente coragem. Espírito de aventura, e até uma certa felicidade. Era isto que lhe faltava nos últimos anos. Não se enganem. Não falo de alguém que nos seus velhos tempos era um amante das artes e um lutador de causas nobres e agora sente a nostalgia do tempo em que era jovem e recupera, naquele olhar numa antiga paixão, uma vontade de mudar o mundo que é apenas uma boa recordação. António sempre foi soldado de primeira fila. Como estudante, como médico, como pai, como guerrilheiro, como mecânico, em tempos de crise, em tempos de grandes projetos de mudança. O problema do António não eram as lutas, não era a resistência, não era a oposição nem eram as dificuldades que se encontram pelo caminho.

O António não se assustava com golpes militares, com insurreições inesperadas de extrema-direita, com prisões de alta segurança e elevada ilegalidade, com cybertrucks da Tesla que explodem à porta de edifícios que simbolizam impérios nem tumultos nas ruas, nem com bombas e mísseis que em breve saberão decidir sozinhas quem bombardear. António sabia que quando os governantes incutem medo nas suas populações, os rebeldes estão a ganhar. Sabia que nada desafia mais uma ditadura (militar, política, financeira) do que ignorar as suas investidas e manter um estilo de vida que as questiona. António sabia muito, vivera outro tanto e tinha um optimismo estrutural que não lhe permitia desistir ao primeiro obstáculo. Mas António não percebia este novo tempo. Não percebia as gerações mais velhas mas também não compreendia as mais novas.

António não sabia a quem se aliar, com quem conversar, que lutas abraçar. E essa dúvida amargurava-o. A incerteza de não se saber se há lado certo, se há futuro, se há sequer vontade em continuar uma jornada para um mundo melhor. E António não sabia lidar com esta sensação e com um certo cansaço insuspeito e invisível que o invadia, todos os dias um bocadinho mais, e se espalhava por todo o corpo e por todas as suas ideias. Até ao momento em que viu aquele sorriso na cara de Flora. E pensou: se calhar os tempos não são de certezas. Nem de grandes direções. Sabemos de mais para sermos tão parvos. Para sermos tão inocentes e tão ensimesmados com caminhos únicos e definíveis. Se calhar estes são tempos de ir. Só ir. Saltar o muro e acreditar que do outro lado há algo de novo para descobrir e algo de eternamente reconhecível que nunca se perde.

António tirou o avental, confirmou quantos trocos tinha no bolso das calças direito e enfiou o passaporte e a carta de condução em papel no bolso de trás, um hábito que mantinha desde o momento da “Grande imaterialização” (sobre a qual vos contarei ainda numa destas crónicas). António sentia-se preparado para tudo o que aí vinha. Com e sem tecnologia. Com ou sem companhia.

Sabia que ia encontrar lugares com fronteiras fechadas, e jardins de cancela aberta com pomares com árvores carregadas de frutos deliciosos. Sabia que ia acabar em apartamentos que só abririam com códigos de alta segurança, viver em cidades onde não se vê vivalma e se fala apenas através de intercomunicadores embebidos nos poucos equipamentos públicos. Sabia que iria percorrer longas distâncias em comboios supersónicos subterrâneos e passar semanas sem ver a luz do dia. Sabia que se podia dar a volta ao mundo em catorze horas e escolher qualquer destino de chegada (com o pin certo) e não encontrar ninguém que partilhasse os mesmos sonhos durante anos, mesmo que com todo o dinheiro, todos os contactos, e todo o conhecimento sobre qualquer assunto. António sentia-se preparado. Para percorrer túneis e aprender novos ofícios, para desafiar a angústia e a solidão. E andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou e andou. Sem destino. Sem saber. Sempre a questionar, a questionar-se, a reequacionar.

Até que num dos muitos dias se fez meio-dia, era verão, estava muito quente e ele encontrou o seu passado numa catedral em Talin, na Arménia, fundada pelos Kamsarakans, hoje no meio de um descampado, ao lado de um cemitério de muitos séculos, às portas da cidade. Um edifício circular, sem telhado, uma cúpula majestosa cercada por paredes de tijolo vermelho e preto, destruídas por terramotos, guerras e desleixos consecutivos. António entra e olha em redor. Na igreja apenas um serralheiro solitário que constrói andaimes ao som de um rádio de pilhas com a calma de quem sabe que não há mais ninguém interessado na reparação desta igreja. Do outro lado, ainda intacto, um fresco representa um livro aberto sentado num trono almofadado. Numa das torres, os vestígios de uma fonte construída pelo monge Uxtaytur e o seu irmão Tuti em 234 da era armena ou em 783 na era depois de Cristo (ou ontem, nos tempos que correm sem história e sem noção). Ao lado uma inscrição com um aviso numa língua que António não domina.

António olha em redor e sente a calma, sente os séculos, sente-se parte de uma espécie que se dedica a pintar auroques e a erguer santuários, e não percebendo o que isso quer dizer, percebe. Ou aceita. Nesse momento, entra na catedral Lula Pena com um santur à cabeça. Ela não o vê. Também ela percorre o mundo há décadas, à procura daquele tom. Daquela melodia. Lula olha à volta e bate uma palma, outra palma, outra palma, canta umas breves notas. Escolhe um lugar pelo seu eco, monta e afina o santur.  Na catedral, e sempre em silêncio, vão chegando pessoas. Duas amigas que por ali estavam a conversar, o guarda do cemitério, dois turistas perdidos, o senhor da mercearia, cada um com a sua razão para estar ali, todos atraídos pelo mesmo som. Uns encontram o seu lugar em cima de uma pedra, outros deitam-se no chão enquanto olham o céu a descoberto, outras ainda se encostam a uma parede, perto do altar, o serralheiro faz uma pausa e desliga o rádio. A caminhada tornou-se num concerto, onde tempo, história, espaço e percursos se uniram durante horas sem que alguém se atrevesse a respirar. É isto, o encontro entre deuses, pensou o António, mas não o pensou com palavras. Apenas sentiu-o.

Quando Lula Pena terminou, seguiu-se o vazio. E o peso. Mas continuava a não se ouvir um ruído. Ninguém se mexeu. Apenas o serralheiro procurou algo na sua mesa de trabalho. Precisava de dizer algo. Encontrou uma maçã, que era tudo o que tinha para o seu almoço. Limpou-a ao macacão azul de trabalho e dirigiu-se para Lula. Fez-lhe uma pequeníssima vénia e estendeu a mão para lhe oferecer uma maçã. Ela aceitou a maçã com um sorriso e um olhar que duraram para sempre. Os olhos de António encheram-se de lágrimas. Era por aqui o caminho. J

Nota: crónica ficcionada baseada no concerto improvisado que Lula Pena deu em Talin, Arménia, no âmbito de uma residência artística da Rota Clandestina no verão de 2023

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Um adolescente ficou ferido esta terça-feira na sequência de um esfaqueamento junto à Escola Secundária São João do Estoril. De acordo com o Expresso, o suspeito terá utilizado uma catana para agredir a vítima, provocando-lhe um corte profundo na mão. “O suspeito foi intercetado e a vítima foi transportada para o Hospital de Cascais”, referiu uma fonte da PSP ao jornal.

O alerta foi dado pelas 13h18 desta terça-feira.

De acordo com a SIC Notícias o agressor e vítima são estudantes de estabelecimentos de ensino diferentes e têm entre 14 e 16 anos de idade. A PSP de Cascais acredita ter-se tratado de um ajuste de contas. 

A Exame Informática esteve presente na pré-apresentação dos novos produtos de gaming da Asus, que foram revelados agora na CES, a maior feira dedicada à tecnologia do mundo. O evento “Unlock the ROG Lab: For Those Who Dare” destacou o compromisso da marca em superar os limites tecnológicos, oferecendo soluções para jogadores e criadores de conteúdo.

Gráficos de elite: RTX 50 Series

No coração da apresentação estiveram as novas placas gráficas ROG Astral GeForce RTX 50 Series. Inspiradas no conceito do “cosmos ilimitado”, estas gráficas não só oferecem os mais recentes e poderosos processadores da Nvidia – também apresentados na CES 2025 –, como introduzem inovações de design e na refrigeração.

A ROG Astral GeForce RTX 5090, por exemplo, é a primeira placa gráfica da marca a incluir um sistema de quatro ventoinhas, que melhora o fluxo de ar em 20% e garante estabilidade mesmo sob cargas extremas. Para os jogadores que exigem silêncio e eficiência, a Astral LC RTX 5090 utiliza refrigeração líquida para manter temperaturas baixas e uma performance constante.

Estas placas são otimizadas para a mais recente tecnologia Nvidia Blackwell, incluindo o DLSS 4, que multiplica a performance enquanto melhora a qualidade visual. Importante não apenas para gamers, mas também para criadores de conteúdo que trabalham com renderização pesada ou aplicações de IA.

Além disso, a série Strix complementa o portfólio com opções mais acessíveis, como a RTX 5070 Ti, que ainda assim garante uma experiência premium para jogos graficamente exigentes e aplicações nas áreas da criatividade e IA.

Portáteis Gaming Reforçados

Com a crescente procura por portáteis capazes de rivalizar com desktops, a Asus trouxe à CES 2025 um leque impressionante de laptops, que já tivemos a oportunidade de experimentar.

Os novos ROG Strix SCAR 16/18 foram concebidos para jogadores que procuram o máximo desempenho. Equipados com processadores Intel Core Ultra 9 e placas gráfica GeForce RTX 5090, estes portáteis podem facilmente executar jogos exigentes em configurações máximas. A tecnologia Intelligent Cooling garante que, mesmo sob carga máxima, as temperaturas e o ruído são mantidos sob controlo.

Asus ROG Strix

Já os ultrafinos ROG Zephyrus G14/G16 destacam-se pela portabilidade. Pesando apenas 1,5 kg no modelo G14, são ideais para quem precisa de um dispositivo leve e eficiente. Apesar do design compacto, oferecem gráficas até RTX 5090 e ecrãs OLED Nebula de alta taxa de atualização. Estes portáteis não só garantem sessões de gaming fluidas, mas também são perfeitos para tarefas criativas em movimento.

Asus ROG Zephyrus

Outro destaque vai para o ROG Flow Z13, um tablet 2-em-1 que combina a mobilidade de um dispositivo leve com o desmpenho de um verdadeiro equipamento gaming. Equipado com o processador AMD Ryzen AI Max+ 395, o Flow Z13 é ideal para gamers e criadores que procuram versatilidade e desempenho em um único equipamento.

Asus ROG Flow Z13

Ecrã e rede à altura

No universo do gaming, os monitores desempenham um papel crucial. O novo ROG Swift OLED PG27UCDM é o primeiro monitor OLED 4K de 27 polegadas com uma taxa de atualização de 240 Hz. Com tempos de resposta de 0,03 ms, é projetado para acompanhar a ação mais rápida sem comprometer a qualidade visual.

Além disso, a Asus introduziu um sistema inovador para prolongar a durabilidade do painel OLED, incluindo um sensor de proximidade que desliga o ecrã quando o utilizador se afasta. É uma solução prática para reduzir o risco de burn-in e aumentar a vida útil do monitor.

A conectividade foi outro ponto alto da apresentação, com o ROG Rapture GT-BE19000AI, o primeiro router gaming Wi-Fi 7 AI do mundo. Este dispositivo utiliza inteligência artificial para otimizar redes domésticas, reduzindo latência e atribuindo recursos de forma eficiente. Para gamers competitivos, oferece um sistema de aceleração tripla que promete diminuir o ping em até 34%, garantindo uma vantagem crucial durante partidas online.

O bom PC de secretária

Para quem continua a preferir desktops, a série ROG G700 promete o máximo desempenho com processadores Intel Core Ultra ou AMD Ryzen 7 e placas gráficas RTX 5090. Estas máquinas foram projetadas para suportar longas sessões de gaming, com sistemas de arrefecimento otimizados e fácil acessibilidade para upgrades.

Se o espaço é uma preocupação, o mini PC ROG NUC (2025) combina um formato compacto com muito desempenho. Com placas gráficas RTX 5080 e processadores Intel de última geração, o ROG NUC é ideal para jogadores que precisam de um sistema discreto, mas sem comprometer o desempenho.

Asus ROG G700

Palavras-chave:

A AMD deu o pontapé inicial na CES 2025 com um anúncio de peso: a expansão do seu portefólio de processadores Ryzen com capacidades avançadas de IA. As novas séries Ryzen AI Max, Ryzen AI 300 e Ryzen 200 visam consolidar a posição da empresa na computação de alto desempenho, oferecendo “uma combinação de eficiência energética, potência de processamento e funcionalidades voltadas para IA”.

Ryzen AI Max: desempenho de workstation em formatos ultraleves

A série Ryzen AI Max surge como o destaque principal, oferecendo até 16 núcleos baseados na arquitetura Zen 5, 40 unidades de computação gráfica AMD RDNA 3.5 e uma Unidade de Processamento Neural (NPU) com capacidade de até 50 TOPS (biliões de operações por segundo). De acordo com a AMD, esta combinação permite que os processadores lidem com modelos de IA avançados e tarefas de multitasking intensivas, como edição de vídeo em 4K ou simulações complexas.

Para os utilizadores empresariais, a série Ryzen AI Max PRO oferecem ferramentas de gestão empresarial e segurança. As soluções serão particularmente atrativas para profissionais de engenharia e arquitetura que necessitam de estações de trabalho móveis potentes e versáteis.

Processadores Ryzen AI Max e Ryzen AI Max PRO

ModeloNúcleos/ThreadsFrequência: boost/baseCache totalProcessamento gráficoCTDPTOP (NPU)Núcleos processamento gráfico
AMD Ryzen Al Max+ 39516C/32TAté 5,1/3,0 GHz80MBAMD Radeon  8060S45-120W5040
AMD Ryzen Al Max 39012C/24TAté 5,0/3,2 GHz76MBAMD Radeon 8050S45-120W5032
AMD Ryzen Al Max 3858C/16TAté 5,0/3,6 GHz40MBAMD Radeon 8050S45-120W5032
AMD Ryzen Al Max+ PRO 39516C/32TAté 5,1/3,0 GHz80MBAMD Radeon 8060S45-120W5040
AMD Ryzen Al Max PRO 39012C/24TAté 5,1/3,2 GHz76MBAMD Radeon 8050S45-120W5032
AMD Ryzen Al Max PRO 3858C/16TAté 5,0/3,6 GHz40MBAMD Radeon 8050S45-120W5032
AMD Ryzen Al Max PRO 3806C/12TAté 4,9/3,6 GHz22MBAMD Radeon 8040S45-120W5016

Ryzen AI 300: IA acessível a todos

Com a nova série Ryzen AI 300, a AMD alarga a acessibilidade da tecnologia de IA a dispositivos de gama média e alta. Os modelos Ryzen AI 7 e Ryzen AI 5 são otimizados para notebooks premium, oferecendo até oito núcleos Zen 5 e gráficos baseados na arquitetura RDNA 3.5. Segundo as contas da AMD, a nova geração da NPU AMD XDNA 2, permite que a nova série entregue uma performance até cinco vezes superior em aplicações de IA quando comparada à sua antecessora.

No segmento empresarial, a série Ryzen AI 300 PRO dá suporte às experiências do Microsoft Copilot+, trazendo uma nova camada de produtividade baseada em IA. Empresas que implementarem dispositivos com estes processadores poderão beneficiar de uma segurança robusta e de capacidades avançadas de gestão, fundamentais num mundo corporativo cada vez mais digitalizado.

Ryzen 200: IA no dia-a-dia

A série Ryzen 200, baseada na arquitetura Zen 4, destina-se a consumidores que buscam equilíbrio entre desempenho e eficiência energética. Com até 8 núcleos e 16 threads (unidades de processamento virtuais), os processadores desta série oferecem funcionalidades de IA adequadas para aplicações quotidianas, desde a automatização de tarefas até ao consumo de conteúdo multimédia. Com um consumo energético otimizado, a série promete longas horas de autonomia, ideal para estudantes e profissionais em movimento.

Os modelos da série Ryzen 200 PRO também incluem as tecnologias AMD PRO, permitindo que pequenas e médias empresas adotem sistemas seguros e eficientes sem comprometer o orçamento.

Disponibilidade

Além dos avanços tecnológicos, a AMD aproveitou o palco da CES para reforçar parcerias com gigantes como Microsoft, ASUS, HP, Lenovo e MSI. Por exemplo, a nova linha de workstations móveis da HP, como a ZBook Ultra G1a, integra os processadores Ryzen AI Max PRO, estabelecendo um novo padrão para estações de trabalho compactas.

“Estamos a redefinir os limites do que é possível com workstations móveis, capacitando os utilizadores para lidar com cargas de trabalho complexas de forma mais eficiente”, comentou Jim Nottingham, da HP.

Para Samson Hu, co-CEO da Asus, “a colaboração com a AMD reflete o compromisso de oferecer soluções tecnológicas de ponta aos clientes, ajudando-os a liderar a inovação em IA”.

Os sistemas equipados com processadores Ryzen AI Max e AI 300 estarão disponíveis já no primeiro trimestre de 2025, enquanto os dispositivos baseados na série Ryzen 200 chegarão ao mercado no segundo trimestre.

Palavras-chave:

Uma nova investigação revela que Plutão capturou a sua atual lua Charon através de um processo de ‘beijo-e-captura’, que terá acontecido há milhares de milhões de anos. Investigadores da Universidade do Arizona sugerem que estes dois mundos gelados faziam parte da cintura de Kuiper e colidiram um com o outro há muito, muito tempo, mas, em vez de se obliterarem nessa colisão, acabaram por estar ligados orbitalmente durante umas horas, no que se assemelha a um beijo. Depois dessa união, os dois separaram-se e deram origem ao sistema de Plutão e Charon, planeta-anão e lua, que conhecemos atualmente.

“O processo desta captura de colisão é ‘beijo-e-captura’ porque Plutão e Charon uniram-se brevemente, o elemento do ‘beijo’, antes de se separarem e formarem dois corpos independentes”, explica Adeene Denton, da equipa universitária que publicou o estudo agora na Nature Geoscience.

A maior parte dos cenários de colisão planetária estão classificados como ‘embate-e-fuga’ ou ‘ralar-e-fundir’, pelo que uma situação de ‘beijo e captura’ é algo nunca antes registado. Este cenário ajuda a explicar como Plutão foi capaz de capturar uma lua que é comparativamente gigante, tendo metade do tamanho deste. “Charon é ENORME comparada com Plutão, ao ponto de os considerarmos um binário. Tem metade do tamanho de Plutão e apenas 12% da sua massa, o que a torna bastante mais parecida com a Lua da Terra do que com qualquer outra lua do sistema solar”, continua Devon, em explicações ao Space.com. Para termos comparação, a ‘nossa’ Lua mede um quarto do tamanho da Terra e Ganímedes mede 1/28 avos do seu planeta parente, Júpiter.

A relativamente pequena diferença de tamanho entre planeta e lua torna difícil que o processo de aquisição desta lua tenha acontecido de forma ‘normal’, ou seja, com a captura gravitacional como as luas de Marte, Júpiter ou Saturno. Assim, o processo de ‘beijo-e-captura’ apresenta-se como um cenário mais provável. Durante uma captura por colisão, há uma colisão massiva a acontecer e os dois corpos esticam-se e deforma-se de forma fluída. No processo de Plutão, deve ser ainda considerada a força estrutural dos corpos rochosos e gelados, algo que tinha sido ignorado até agora.

A equipa da Universidade do Arizona usou um cluster de computadores de alto desempenho para correr a simulação, colocando a força estrutural como fator que, se não existisse, veria os corpos a fundir-se um com o outro. Com a força a ser considerada, Plutão e Charon mantêm-se estruturalmente intactos durante a sua breve fusão, o tal beijo.

Devon conta que “neste ‘beijo’, a fusão foi muito breve, em termos geológicos, durando 10 a 15 horas antes de os corpos se separarem novamente. Charon começou a afastar-se lentamente em direção à sua posição atual. As grandes colisões típicas são fusões, onde os corpos se juntam ou ambos se mantêm independentes. Por isso, isto foi novo para nós. Também levanta questões geológicas interessantes que gostaríamos de testar, para saber se o processo ‘beijo-e-captura’ só funciona devido ao estado termal de Plutão, que podemos depois ligar à geologia contemporânea de Plutão para testar. Gostaria de determinar como o impacto inicial Plutão-Charon pode influenciar se e como Plutão e Charon desenvolvem oceanos”.