Os 86 mil milhões de neurónios do cérebro, multiplicados por conexões ainda inexploradas e inexplicáveis para os cientistas, faziam acreditar numa velocidade impressionante de processamento do pensamento humano. Pela primeira vez, uma equipa de investigadores, do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), nos Estados Unidos, procurou responder a essa pergunta: quão rápidos são os nossos pensamentos?
De acordo com os cálculos apresentados em dezembro, na revista científica Neuron, os resultados foram dececionantes: “correm” a uma média de dez bits (unidade básica de informação na computação) por segundo, ou seja, numa pista incrivelmente lenta. Pelo menos, se estabelecermos como termo de comparação alguns dispositivos tecnológicos: uma ligação wifi média (nos Estados Unidos) tem uma velocidade de download de 260 milhões de bits por segundo; já uma chamada telefónica ocupa cerca de 64 mil bits por segundo. “É um pouco como um contrapeso à hipérbole sem fim sobre o quão incrivelmente complexo e poderoso é o cérebro humano”, afirmou um dos coautores do estudo, Markus Meister, ao New York Times. Afinal, o que aprendemos ao longo da vida caberia facilmente numa pen drive.
A ideia da investigação surgiu quando o neurocientista da Caltech procurava dar alguns dados básicos sobre o cérebro aos seus alunos caloiros. Contudo, a forma como a informação acelera pelo sistema nervoso estava por determinar.
Para estimar esse fluxo, Meister resolveu então recorrer à medição de uma tarefa concreta e lembrou-se de um estudo feito em 2018, na Finlândia, que registava os toques digitados. A média dos 168 mil voluntários conseguia digitar 51 palavras por minuto e uma pequena fração chegava a martelar no teclado 120 palavras. Mesmo com base nesta taxa mais elevada de destreza, e recorrendo a um ramo da matemática denominado teoria da informação, o neurocientista, em conjunto com Jieyu Zheng (sua aluna de pós-graduação), chegou à conclusão do tal limitado fluxo neural de dez bits por segundo.
Decidiram testar o resultado com outras tarefas, exercícios mentais em que as limitações físicas dos nossos corpos não prejudicassem o fluir do pensamento humano. Lembraram-se de medir o blind speedcubing, em cujas competições os jogadores têm de olhar para um cubo mágico, colocar de seguida uma venda e resolvê-lo o mais rapidamente possível, recorrendo apenas à memória visual. Com base nos recordes alcançados pelo speedcuber norte-americano Tommy Cherry – demorou 5,5 segundos a inspecionar o cubo e 7,5 segundos a encontrar a solução –, os números não melhoraram substancialmente: uns míseros 11,8 bits por segundo.
A “ilusão de Musk”
Para os neurocientistas, o contraste gritante entre a imensidão da coleta de dados pelos sistemas sensoriais e a lentidão da taxa de transferência de informações de um ser humano permanece um enigma. No artigo, com o título A Insuportável Lentidão do Ser: Porque Vivemos a Dez Bits/s?, Meister e Zheng levantam questões fundamentais: “Porque o cérebro precisa de bilhões de neurónios para processar dez bits por segundo? Porque só conseguimos pensar numa coisa de cada vez?”
Os neurocientistas sustentam que “o cérebro parece operar em dois modos distintos: o cérebro ‘externo’ lida com sinais sensoriais e motores rápidos de alta dimensão [num segundo, carregam dez mil milhões de bits de dados], enquanto o cérebro ‘interno’ processa os reduzidos bits necessários para controlar o comportamento”. Os sistemas sensoriais (a visão, o olfato, a audição) funcionam cerca de 100 milhões de vezes mais rápido do que a cognição.
Aliás, este contraste biológico contribui para a falsa sensação de que a nossa mente poderia lidar simultaneamente com diferentes pensamentos – “a ilusão de Musk”, como descrevem os autores. Referem-se às frustrações do milionário norte-americano com “o problema de largura de banda” desta nossa máquina complexa e à sua vontade de criar uma interface (fundou a empresa de neurotecnologia Neuralink) que permita ao cérebro humano comunicar diretamente com um computador, sem ser limitado pela velocidade lenta de falar ou escrever.
Se for bem-sucedido, Musk irá constatar que “o cérebro humano é muito menos impressionante do que podemos pensar”, pois “é incrivelmente lento quando se trata de tomar decisões, e é ridiculamente mais lento do que qualquer um dos dispositivos com os quais interagimos”, declarou Meister à revista Scientific American. Mesmo ligado a um computador, a comunicação não seria mais rápida do que se usasse um telefone.
Os neurocientistas da Caltech esboçam uma explicação para este paradoxo, que já tinha sido comprovado por outros estudos, mas ainda não tinha sido medido quantitativamente.
“A Natureza, ao que parece, construiu um limite de velocidade aos nossos pensamentos conscientes, e nenhuma quantidade de engenharia neural pode ser capaz de o contornar” declarou Tony Zador à Scientific American, um neurocientista do Laboratório Cold Spring Harbor, que não esteve envolvido no artigo, mas é mencionado no mesmo. “É provável que seja o resultado da nossa história evolutiva”, aponta. Criados numa era mais lenta, os nossos ancestrais sobreviveram com essa velocidade intelectual.
As primeiras criaturas com um sistema nervoso usavam os seus cérebros principalmente para uma navegação simples, em direção à comida ou para longe de predadores. E a evolução cerebral manteve um “caminho” de pensamento único. “Os nossos ancestrais escolheram um nicho ecológico onde o mundo é lento o suficiente para tornar a sobrevivência possível”, escrevem Zheng e Meister. “Na verdade, os dez bits por segundo são necessários apenas nas piores situações, e na maioria das vezes o nosso ambiente muda a um ritmo muito mais vagaroso.”
Os cenários futuristas de ficção científica sobre a exploração da mente humana parece que terão de repensar as suas ambições.
Olha o robot
Grandes empresas tecnológicas estão na corrida para o aperfeiçoamento dos robots humanoides
O investimento em robótica feito no último ano pela OpenAI já indiciava este passo. Segundo o site The Information divulgou no final de 2024, duas fontes internas da empresa tecnológica norte-americana afirmam que está a ser ponderado o desenvolvimento de um robot humanoide.
Recorde-se que, em 2021, a OpenAI tinha encerrado a sua divisão de robótica e concentrado esforços no desenvolvimento dos grandes modelos de linguagem natural, como o ChatGPT (lançado em novembro de 2022). A robótica continuará a não ser a prioridade do consórcio liderado por Sam Altman. A nova era de assistentes inteligentes e chatbots, com uma melhoria significativa das capacidades, levou o CEO a afirmar, esta semana, que “funcionários virtuais”, programados com Inteligência Artificial (IA) e capazes de executar tarefas de forma autónoma, podem começar a entrar no mercado de trabalho este ano.
A corrida para o aperfeiçoamento dos robots humanoides tem acelerado. Elon Musk investiu fortemente, tendo apresentado os Optimus, com o selo Tesla, em outubro de 2024, programados para interagir com humanos e ajudar nas tarefas do quotidiano (tanto servem bebidas como levam o cão a passear), com um preço estimado de 28 mil euros. Os primeiros exemplares deverão ser lançados em 2026.