Admite-o. Há anos que te adaptas às conturbadas fases do crescimento da prole. Aquela coisa a que chamam parentalidade. Mal te lembras de como era a tua vida antes de eles existirem e de te trazerem surpresas contínuas, alegrias e sobressaltos, questões e revelações. Agradeces a passagem dos dias a vê-los crescer mais um bocadinho. E orgulhas-te de eles pertencerem ao teu clube. Ou de terem um clube oposto ao teu. Chegas a achar graça às suas mudanças de visual e ao estilo irreverente que tu, na idade deles, também tinhas.
Aos poucos, começas a ter a estranha impressão de ficar para trás. De perder o comboio, enquanto eles prosseguem a viagem. É o momento em que deves parar, escutar e olhar. Está na altura de atualizares o teu software sem resistir ao processo. Ou melhor, é agora que deves abraçar estas mudanças com alma – e com calma – porque a situação pode parecer desesperada, mas não é!
Descobres que os teus filhos são adultos quando…
Percebes que o espaço que era só teu nunca o foi
Adeus à idade do armário, em que se fechavam lá dentro e não havia nada para ninguém, só um beijinho de fugida ao tio, às avós e pouco mais. Agora, que transcenderam as fronteiras do quarto e circulam entre as divisões da casa sem aviso prévio, dás por ti a sentir que o território é pouco para tanto hóspede: o amigo, a amiga e mais os namorados deles, a jogarem no tablet e a receberem notificações do smartphone a qualquer hora.
As tuas certezas passam a ser revogáveis
Acontece durante o escasso tempo em que estão todos juntos e tu fazes um comentário qualquer, que só a ti parece óbvio. Já te tinhas esquecido de como era quando tinham três anos, a idade dos porquês e dos nãos e, mais tarde, já sob o efeito das hormonas, o “porque não” era a palavra-passe para tudo e mais alguma coisa. “Não gostas, mas tu é que me ensinaste isso, que há coisas não negociáveis.”
O comando passa a ser, em parte, deles
Onde está o ser apetecível que respondia com um sorriso e uma gracinha extra? Quem é a pessoa que te olha com enfado e reprovação sempre que, diante de terceiros, mencionas o nome dela com o sufixo “inho(a)”? Sim, nunca pensaste nisso: na possibilidade de seres repreendido(a), porque no outro dia te esqueceste de fazer o que tinhas dito, porque “não percebes nada” e agora também não vale a pena explicar.
Começas a ter de sair em vez de ficar…
… com o pijama e os chinelos em casa, confortavelmente, no teu sofá. Ou a namorar como se não houvesse amanhã porque os miúdos estão fora (e tu deixaste bem claro que não os ias buscar a qualquer hora da noite, porque eles já são autónomos). Pois. Agora, que eles têm a chave de casa e do carro (não interessa se é a tua, a deles ou dos amigos), nunca sabes quando entram, se instalam e… és tu que equacionas sair, como quando eras teenager.
As férias deixam de ser o que eram
Sim, eles passam a ter voto na matéria. Ou porque já não acham graça à casa de campo e às comezainas na piscina. Ou porque só podem depois dos festivais de verão e nessa altura já tu lá não estás (porque tiveste que marcar as férias em função da pessoa que vive contigo, da empresa que te paga o salário e das disponibilidades do alojamento). Ainda acreditas que é possível conciliar, mas acabas por resignar-te à ideia de recriar a tua vida sem eles.
As questões deles se sobrepõem (ainda mais) às tuas
O teu corpo lembra-te que já não és jovem e as tuas referências culturais não são partilháveis com os Millenials e Xers. Ou adaptas-te e convives com isso, sem te sentires ameaçado(a), ou não te livras de passar por “cota” em crise de identidade. Os adultos giros que vivem lá em casa querem – e precisam – da tua atenção, da tua atitude segura, zen e sem narcisismos ou críticas, que “só te trazem rugas e cabelos brancos”.
Eles se oferecem para fazer o que só tu fazias
Ir às compras e subir com os sacos até ao 4º andar. Ver os rótulos das embalagens e ler as letrinhas pequenas. Sugerir-te que vás dormir e acompanharem-te ao quarto, depois de a fadiga tomar conta de ti sem te aperceberes, ou depois de adormeceres a meio do jogo, do filme ou da conversa boa da qual tanto querias desfrutar ao serão. Levarem-te a um exame médico. Serem eles a pagar-te a conta. Dizerem-te, por estas e outras formas, como os adultos costumam fazer, o quanto gostam de ti.