Até 10 de março faltam três meses e meio, mas os partidos já se enfileiram na grelha de partida para as eleições. Começou, pois, a pré-campanha, com as habituais promessas, declarações e picardias.
No PSD, o Congresso convocado para rever estatutos transformou-se, como seria de esperar, no pontapé de saída para as legislativas. E Luis Montenegro reiterou que quer menos impostos para classe média e tempo de carreira na íntegra para professores, e surpreendeu com uma proposta de aumento do complemento solidário para idosos (CSI), mas anunciando um “rendimento mínimo garantido dos pensionistas portugueses de 820 euros”, o que gerou dúvidas.
“O que ficou do Congresso do PSD foi o enterro de Pedro Passos Coelho”, avalia o jornalista Nuno Aguiar. O ex-primeiro-ministro não esteve fisicamente presente no encontro dos sociais-democratas, mas o seu legado também foi deixado para trás. “Luís Montenegro recentrou o partido e não apresentou a visão reformadora de Passos Coelho que não sabemos o que diria sobre algumas das medidas prometidas. Não sabemos como Montenegro será como primeiro-ministro, mas será curioso ver como é que essa nova identidade irá coexistir com uma aliança com a Iniciativa Liberal.”
Mafalda Anjos concorda: “Luís Montenegro, que foi um dos principais rostos do Passismo, tem de se afastar dessa imagem de austeridade que pesa em tempo de eleições para conseguir votos ao centro. A dúvida é se esta promessa, apresentada logo à cabeça suscitando dúvidas quanto à extensão da sua aplicabilidade, eventualmente por falha de comunicação, não abona a favor da credibilidade da proposta. Os eleitores têm memória do que já aconteceu com Durão Barroso e Pedro Passos Coelho”, diz a diretora da VISÃO.
É nestas medidas extraordinárias, e com pouco impacto orçamental, CSI, RSI, apoios sociais sazonais, que os partidos fazem o seu jogo político, não tanto nas medidas estruturais, entende Filipe Luís. “Há nichos de mercado a conquistar, porque cada vez menos eleitores decidem qual será o próximo Governo, e, em Portugal, cerca de 1 milhão e meio de votos definem isso. Os partidos identificam nichos de mercado eleitoral e apostam tudo neles. Por isso, e pelo que já ouvimos, quer ao PSD, quer aos dois candidatos à liderança do PS, quer de outras forças políticas, está aberta a ‘caça ao pensionista’. Ou melhor, a caça ao voto do pensionista“, afirma o editor-executivo da VISÃO.
Em relação à medida mais discutida, a subida do Complemento Solidário para Idosos, Nuno Aguiar não acha que Luís Montenegro tenha sido enganador. “Aguardo as contas do PSD, o custo pode ser elevado, mas este é o tempo para os partidos fazerem este tipo de promessas”, refere. “Parece-me é que continua a faltar ambição. O PSD promete colocar o CSI nos 820 euros, ao nível do salário mínimo. Mas 820 euros em 2023 não são o mesmo que em 2028, nem o salário mínimo, esperemos, ficará em 820 euros. Além disso, se o CSI aumentasse até 2028 ao ritmo que já crescerá em 2024 chegaria aos 800 euros.”
Moderação e água benta…
No PS, a corrida prossegue. “Pedro Nuno Santos entrega hoje a sua moção e diz que ‘é o candidato que mobiliza a esmagadora maioria dos militantes’. Já José Luis Carneiro diz que ‘a sua candidatura é a que melhor corresponde à vontade de um amplo centro político e social’. Os partidos têm dinâmicas próprias e, provavelmente, ambos estão certos…”, começa Mafalda Anjos. Uma coisa parece evidente: “Tal como Luís Montenegro, o homem que fez todo o seu percurso pela ala esquerda e disse coisas bastante radicais no passado também está numa senda de moderação e aproximação ao centro, porque sabe que é ao centro que se ganham eleições. O facto de ter vindo dizer que nunca foi esquerdista e que é um social-democrata, no sentido europeu, claro está, ajuda a esta imagem, porque em Portugal se dá a especificidade de termos um partido de centro-direita com este nome”, afirma.
Quem será o adversário mais difícil para Montenegro? “José Luís Carneiro tem uma imagem mais centrista e é capaz de convencer eleitores que estarão indecisos entre PS e PSD. Pedro Nuno Santos, não. Mas tudo depende do carisma, da dinâmica e da campanha. Pedro Nuno é um político mobilizador, que arrasta e que leva as pessoas a votar. Carneiro é mais, como os brasileiros dizem, um “político chuchu” – em alusão ao conhecido fruto com pouco sabor. E, portanto, deixa os eleitores mais indiferentes. Na verdade, não sabemos como vai o eleitorado comportar-se e assimiliar esta “informação” inédita, de um governo que se demite na sequência de um caso judicial…”, comenta Filipe Luís.
“As eleições parecem estar centradas definir quem é o mais radical. Pedro Nuno Santos diz que um governo do PSD com a IL será o mais à direita de sempre em Portugal; Montenegro diz que Pedro Nuno Santos representa o Gonçalvismo”, lembra Nuno Aguiar. “O curioso é que Pedro Nuno, que é do partido que governa, é quem se propõe a fazer coisas, enquanto Montenegro parece mais preocupado em mostrar que não levantará muitas ondas.”
Para ouvir em Podcast
DISPONÍVEL NAS SEGUINTES PLATAFORMAS