Depois de décadas à espera de uma decisão sobre o novo aeroporto, há finalmente uma decisão anunciada pelo Ministro das Infra-estruturas. Sem avisar oposição nem Marcelo Rebelo de Sousa, o Governo muda de planos e juntou Montijo e Alcochete numa nova solução aeroportuária. No dia seguinte, esta decisão de Pedro Nuno Santos é revogada pelo Primeiro-Ministro através de um despacho, alegando que o assunto tinha que ser consensualizado com o PSD e com o Presidente da República. “À hora em que gravamos este podcast [quinta-feira, 13h30] é bastante claro: PNS é um walking dead. Ou se demite, ou será demitido pelo primeiro-ministro. Não há infra-estrutura que resista a este terramoto “, diz Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, no programa Olho Vivo.
Para Filipe Luís, “é difícil encontrar racionalidade na decisão de Pedro Nuno Santos”. “Ele estava a par das reiteradas afirmações, até muito recentes, do primeiro-ministro, sobre a necessidade de consensualizar, com o principal partido da oposição, a decisão sobre o novo aeroporto. Porque é que avançou assim?”, questiona o editor-executivo da VISÃO. “Será que Pedro Nuno Santos quis forçar a mão de António Costa? Pô-lo perante um facto consumado, muito difícil de reverter, sem que houvesse uma crise política? Se era isso, António Costa não hesitou e, mesmo com esse risco, desautorizou-o imediatamente. O que dá nota da firmeza política e da autoridade do chefe do Governo”, afirma.
O que está em causa é essencialmente uma matéria de autoridade política e de coesão do governo. “O que aconteceu foi uma grave desautorização mútua. Um Ministro que avançou num tema crucial sobre o qual se aguarda uma decisão há tantos anos sem autorização do Primeiro-Ministro, e um Primeiro-Ministro que revoga uma decisão do seu Ministro, colocando-o completamente em xeque. Ninguém sai bem desta situação”, diz Mafalda Anjos.
“A saída de Pedro Nuno Santos será uma má notícia para o próprio, que ficará muito tempo longe da atenção dos portugueses. Mas é também uma notícia para o Governo, que perde um dos únicos ministros com peso político, capaz de carregar pastas complicadas”, aponta o jornalista Nuno Aguiar. “Este divórcio é o resultado de uma diferença de personalidades, mas é também o culminar de vários casos que refletem visões diferentes do mundo e de como se deve posicionar o PS, mais ao centro ou mais à esquerda.”
Quem também sai mal desta situação é a Ministra da Presidência, concordam os “olheiros” deste painel. “Costa tem dado mais atenção às questões europeias, dada a conjuntura, o que é compreensível. Mas então, qual é o papel de Mariana Vieira da Silva, na coordenação do Governo? Será que falta um Pedro Siza Vieira a Costa? Bom, mas ele não o reconduziu…”, disse Filipe Luís.
Independentemente de o ministro sair ou de ficar, este episódio criará um futuro problema político ao Governo: esta solução, apresentada ontem, já tinha sido debatida internamente, Costa conhecia-a e seria até uma das propostas a apresentar à oposição. Se há condições para esta decisão voltar a ser apresentada, é outra questão. “Sem PNS, será também complicado para o Governo avançar com esta opção para o aeroporto, caso a considere a melhor. Ela passará a ser apelidada “opção Pedro Nuno Santos”, refere Nuno Aguiar. Mafalda Anjos discorda. “O Primeiro-Ministro revogou o despacho porque entende, já o tinha dito antes, que a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, e que o Presidente da república tinha de ser informado. Mas se António Costa entende que esta é a melhor decisão para o País, tem de continuar a ser a opção apresentada ao PSD. Não faz sentido voltar atrás só por calculismo político”, defende. “Se acabar por ir mesmo para a frente, Pedro Nuno Santos ainda sairá por cima, porque ele é que tinha razão… Costa tem de a deixar cair ou de introduzir algumas alterações… O que é um problema adicional”, acrescenta Filipe Luís.
“O que é bastante sintomático é a desorganização que existe no Governo, com António Costa mais focado nos temas da Europa e da guerra, algo que já tinha sido evidente no caso da Saúde”, conclui Mafalda Anjos.
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