António Ramalho Eanes, indubitavelmente o melhor e mais digno homem a ocupar o lugar de Presidente da República Portuguesa, colocou-o de forma lapidar este domingo: ”É o 25 de Abril que assume perante o povo português o compromisso de honra de lhe devolver a soberania, de lhe devolver a liberdade, […] para viver o seu presente e desenhar o seu futuro. […] É importante que os Portugueses se debrucem sobre o 25 de Abril, […] fazerem uma reflexão daquilo que querem que venha a ser o País, para que […] tenhamos um futuro que corresponda ao desejo dos Portugueses.”
A geração dos meus avós nasceu em ditadura. Testemunharam, ainda que à luz sombria do atavismo conservador, o reequilíbrio das contas públicas, da balança comercial, e a convergência com a Europa com a adesão à EFTA. A geração dos meus pais nasceu em plena crise do Estado Novo, que viram rebentar pelas costuras e têm a memória, ainda que embaçada pela sua juventude à data, da alvorada da Liberdade. Ambas as gerações assistiram à democratização do seu país, ao dizimar do analfabetismo e mortalidade materna e neonatal, e a uma nova onda de convergência com a Europa com a adesão à CEE.
Eu nasci em 1995. Findavam os 10 anos do governo de Aníbal Cavaco Silva – última década de convergência. Seguiram-se pântanos políticos, uma crise do euro, da banca, uma bancarrota, uma pandemia, uma guerra, uma crise inflacionista e da habitação. Vivi quase toda a minha vida sob a perceção de que a vinda de um tempo melhor estava dependente da passagem da crise do momento.
A minha geração é a do remendo. Do remédio. Da mezinha. Desde que nasci, o meu país recebeu mais de 70 mil milhões de euros em fundos de coesão e não realizou praticamente nenhuma reforma digna desse nome. A confiança que os meus avós tiveram na melhoria das condições de vida dos seus filhos face à deles, está hoje, para os meus pais, dependente de um bilhete de avião para uma economia desenvolvida.
Honrar o 25 de Abril não é limitarmo-nos a herdá-lo. Qual é o legado que queremos construir? Eu gozo de liberdades que os meus avós, com a minha idade, só podiam imaginar. Mas também estou rodeado de jovens que não auferem sequer mil euros e para os quais a emancipação de ter uma casa para morar e formar família é apenas uma miragem. A liberdade herda-se, mas também se constrói e se expande.
A coragem e a ambição que estiveram na base do 25 de Abril de 1974 e da sucessão de eventos que espoletou têm de continuar a pautar a nossa conduta política. Uma vontade inabalável de libertar o indivíduo das amarras que o prendem e caminhar em direção ao desenvolvimento, à prosperidade, à democracia plena. Tem de ser possível uma nova onda de crescimento como aquela a que os meus pais e avós assistiram.
O 25 de Abril é nosso por direito. Mas também é nosso dever.
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