Os vencedores
PS: Uma vitória com dor-de-cabeça anunciada
Com 36,65% dos votos (e 106 deputados) faltou-lhe bem mais do que “um bocadinho assim” para a maioria absoluta com que chegou o PS a sonhar, mas que desde a acusação de Tancos, conhecida a meio da campanha, ficou definitivamente arredada da vista de António Costa – muito melhor a governar do que a captar votos. Conseguiu, pelo menos, o segundo objetivo da campanha: uma maioria que o coloca sozinho à frente da direita. E com vários os cenários possíveis em aberto: uma nova geringonça (muito mais difícil de conseguir do que em 2015), um acordo apenas com o PCP, um acordo apenas com o Bloco, acordos “medida a medida” com vários partidos ou viabilizações dos orçamentos de Estado anuais – os principais garantes da estabilidade para um ano político. Um entendimento apenas com o PAN é que ficou longe de ser suficiente: juntos só conseguem 110 deputados. Uma coisa é certa: estas serão negociações mais exigentes e mais precárias. Nada que amedronte um diplomata e negociador encartado como Costa.
PAN, Chega, Livre e Iniciativa Liberal: Abram alas para os pequenos
Com a entrada do Chega, Livre e Iniciativa Liberal, cada um com 1 deputado, são 10 os partidos com assento parlamentar – temos a assembleia mais diversa de sempre.
Mas um dos mais simbólicos resultados da noite é a entrada da extrema-direita pela primeira vez no Parlamento. André Ventura é um populista de má qualidade, mas conseguiu, à custa de uma mediatização que já trazia de trás, recolher votos de gente que se revê em mensagens como “apenas 25 anos para monstros?” ou “andamos a sustentar quem não quer fazer nada?”. Sinais destes tempos em que os extremismos voltaram a eclodir um pouco por toda a Europa. O que se teme é até onde pode crescer, agora que terá representação parlamentar e obrigatoriamente mais visibilidade…
Um belo PANfleto
Já o PAN era um vencedor antecipado. Propostas “fofinhas” em áreas consensuais como a dos animais e depois a do ambiente, área que chamou mais tarde para si, recolheram simpatias da esquerda à direita, sobretudo o voto dos jovens e dos desiludidos com os partidos “tradicionais”. Conseguiu 4 deputados e 3,28% dos votos, com um programa bem-intencionado mas muito pouco consistente. Ao PS estes mandatos darão jeito, se conseguirem alcançar um acordo e encaixar algumas das propostas deste partido. O aeroporto do Montijo é que pode ser a pedra no sapato…
Iniciativa Liberal: o “Bloco da Direita”
São frescos e arrojados, e conseguiram cativar algum eleitorado mais “moderno” à direita, cansado de Cristas e de Rui Rio, ambos com cassetes algo empoeiradas. A campanha da Iniciativa Liberal fez-se nas redes, entre uma “boca” bem metida no Twitter, uma deixa bem apanhada no Facebook e memes partilhados em grupos de whatsapp, e assim foi crescendo. Se nas Europeias se pensou que não conseguia ir muito além das redes, nestas eleições ficou provado que conseguem galvanizar eleitores. Coisas como um teste de barómetro eleitoral que pendia claramente para a Iniciativa Liberal ajudaram à festa. Uma campanha feita, claro está, só com a parte boa das suas propostas: menos estado e menos impostos, ou seja, a tal liberalização política, económica e social. O que se esqueceram convenientemente de dizer é o reverso da medalha consequência quase inevitável deste modelo: menos proteção social, menos saúde e escolas públicas, menos reformas.
Os assim-assim
Bloco: Não reforça nem governa
Catarina Martins ensaiou tudo ao mínimo detalhe, treinou a pose de estadista e não deixou improvisos para a boca de cena. Apostou numa campanha determinada a evitar a maioria absoluta do PS e bem pode chamar a si parte desse resultado. Só não conseguiu reforçar, como tinha pedido: alcançou 9,67% dos votos (menos quase 60 mil do que em 2015) e os mesmos deputados que tinha (19), um resultado que mostra que o partido não foi, apesar de tudo, muito beliscado pela Geringonça, mas também não conseguiu subir. No discurso da noite passou a deixa de que está disponível para acordos de incidência parlamentar com o PS ou para negociar ano a ano, ir para o governo é que não está nos planos. Coisa diferente é se as suas exigências serão admissíveis para o PS, porque algumas que apresentava no seu Programa de Governo são tão idealistas como irrealistas.
Os derrotados
PSD: “Não há desastre” – e daqui ninguém me tira
Uma derrota é uma derrota é uma derrota (perdoe-me Gertrud Strein por lhe enviesar obelo verso “a rose is a rose is a rose”). E se um fracasso é mais pequeno do que se antecipava, isso não faz dele uma vitória. Rui Rio não ficou, é certo, na casa dos 20% como chegaram a prever as primeiras sondagens, mas o seu resultado é dos mais fracos de sempre do partido – ao nível de Santana Lopes que em 2005 se ficou pelos 28,7% em circunstâncias difíceis (após a “demissão” por Jorge Sampaio).
Há quem há muito ande a afiar as prepare as facas para a sua saída, mas acima dos 26% Rio preparava-se para ensaiar o discurso do “resultado digno”, atirando a culpa para a oposição interna, e claro, para os média (por quem nutre uma antipatia pouco democrática cada vez mais mal disfarçada). Assim o fez, cheio de confiança e sorrisos na cara, congratulando-se de ter mantido o mesmo resultado do que em 2015. Ano em que, recorde-se, o País saiu de um governo de direita em que implementou as medidas mais impopulares em décadas.
PP: Baixar a Crista(s)
Em fevereiro dizia que estava “pronta para ser primeira-ministra”, hoje sai com estimativas que colocam o CDS na fasquia mais baixa desde 1887 a 1991, quando Adriano Moreira e Freitas do Amaral não foram além dos 4,4%, numa altura em que Cavaco Silva conseguia duas maiorias absolutas. Depois de umas eleições autárquicas em que conseguiu um resultado extraordinário que tem vindo sempre a perder gás. E o momento mais baixo – um verdadeiro tiro no joelho, terá sido o episódio em que se aliou à esquerda para deitar abaixo o governo. Reconheceu o erro, aliás numa entrevista à VISÃO, mas o mal estava feito. Grande parte do eleitorado já estava em debandada, algum para a Iniciativa Liberal.
CDU: O pior resultado de sempre
A derrota foi expressiva para Jerónimo de Sousa, que tem o pior resultado de sempre em percentagem de votos (6,46%) e 12 deputados – ainda abaixo do que conseguiu Carlos Carvalhas em 2002 (que se ficou por 12 deputados com 6,94%). Um mau resultado que vai dificultar ainda mais um novo acordo de Geringonça, isso é certo.
Aliança: Santana quê?
Foi a desilusão que já se deixava adivinhar: Santana Lopes foi confrontado com o facto de que, ao contrário do que tinha estimado, sozinho e fora do PSD não consegue mobilizar o eleitorado. Tinha como objetivo fazer um pequeno grupo parlamentar, reduziu mais tarde a ambição para “pelo menos dois deputados”, e acabou por não conseguir eleger. Saiu caro o arrojo do eterno enfant terrible, que corajosamente largou um cargo confortável na Santa casa da Misericórdia para se atirar de cabeça para uma aventura no Aliança. Falhou o alvo.
Democracia participada
A abstenção atingiu mais um máximo histórico, ao alcançar os 46%. É o elefante na sala da democracia nacional, um problema que tem mesmo de ser encarado seriamente.