Dia 13.
Quando era miúda, gostava de me deitar à noite a olhar para o céu estrelado. Mas o que começava por ser um prazer, acabava numa singela angústia. Sentia o que suponho ser um clássico da Humanidade: aquele encolher perante a imensidão do espaço infindo, a multiplicação de estrelas a mostrar o tamanho absurdo da minha, da nossa, pequenez. Os anos passam, mas o fascínio pelo espaço não. Devoro notícias sobre a nova conquista espacial, fascinam-me as descobertas do Míni-Júpiter ou da Super-Terra próxima do nosso sistema solar.
Mas perco-me. Não quero falar da grandeza, e sim da pequenez. No extremo oposto, sinto por ela o mesmo fascínio. Ando inquieta com uma partícula de exiguidade absurda, um ser submicroscópico de milésimo de milímetro que não chega sequer a ser um ser vivo. Um vírus é uma espécie de morto-vivo, na verdade. Inerte, não produz a sua própria energia metabólica. É só uma película de proteína com um singelo material genético ou ácido nucleico lá dentro. Sorrateiramente, encontra todas as formas possíveis para se tornar mais forte e mais mortal. Mas este parasita malévolo precisa de um hospedeiro para sugar e se multiplicar. Só através desta invasão e posse do controle da maquinaria de auto-reprodução celular é que ganha vida.
E que vida, senhores! A partir das células hospedeiras, os vírus obtêm aminoácidos e nucleotídeos, capacidade para sintetizar proteínas e gerar energia. E assim ganham uma força inigualável. Em poucas horas, uma vez dentro de uma célula, conseguem replicar-se milhares de vezes. Implacáveis, sequestram células alheias para criar milhões de versões de si mesmos. Em dias, formam exércitos poderosos. Muitas vezes indestrutíveis, mortais. Ameaças que representam a maior diversidade biológica do planeta e que há milhões de anos desenvolvem a melhor forma de sobreviver – e de nos arrasar.
SARS-CoV-2 é o nome de código deste vírus com pontas, formando a tal coroa que lhe dá o nome de corona. É maior do que o prima ébola, mas mais insidioso. Já sabemos a cartilha de cor: é contagioso ainda antes do hospedeiro apresentar sintomas. E a sua força é a nossa: só existe através das nossas células, só enfraquece se as nossas enfraquecerem.
Daí ser tão difícil de combater: matá-lo acarreta o risco de matar as células boas onde se instala. Espantoso como conseguimos perceber tanto e ir tão longe, colocar homens na Lua e rovers em Marte, mas não damos conta de seres ínfimos como este. Vem-me a mesma angústia da escala de miúda… Dou por mim a pensar como esta pandemia é também uma chapada de luva branca do universo, que nos põe no devido lugar: o da nossa infinitesimal pequenez.