Desde pequena que contava os dias até ao Natal. A quadra natalícia sempre foi delicadamente planeada, desde o apanhar do musgo para fazer o Presépio, até à espera respeitosa pela meia-noite do dia 24 para abrir os presentes (que até lá andavam escondidos pela casa, tal e qual uma missão impossível). Depois de crescer, percebi que o Natal não se resumia a um mês ou ao culminar de um dia, o Natal era um sentimento que contagiava até o coração do mais irredutível Grinch.
Descobri que, afinal, esse sentimento de aconchego, tão bem definido pelo conceito “hygge” de origem dinamarquesa, pode ser todo o ano. À parte do consumismo desenfreado, que infelizmente caracteriza esta altura, há um bem-estar generalizado e uma capacidade de introspeção e empatia que não existem no resto do ano. Agora, pensem comigo, como podemos prolongar este sentimento pelo ano inteiro? Para nos ajudar a responder a esta questão, necessitamos de desconstruir aquilo que representa o hygge, originário de um dos países mais felizes do mundo! O país da marca Lego, empresa fundada em 1932 por Ole Kirk Kristiansen, em Billund, na Dinamarca, com o lema “leg godt”, que significa “brincar bem” em dinamarquês. Será que nós adultos temos a capacidade de “brincar bem”? Ou será que nos levamos demasiado a sério? Paramos para nos rir de nós próprios? Temos tempo para isso? As nossas crianças terão tempo para isso, com a sua super agenda preenchida? Temos tempo para dedicar à nossa família e amigos e presenteá-los de forma imaterial ou material?
O Natal também pode dar uma carga pesada a uma palavra muito portuguesa, a da saudade. Trazendo com ela vários lutos e nostalgias, de quem já não está, de quem está, mas não faz parte da nossa vida, de quem poderia estar… Ninguém deveria estar sozinho no Natal, mas também ninguém deveria estar sozinho o resto do ano… Que tal prolongarmos o pensamento esperançoso e solidário nos outros dias do ano? O que teríamos a perder? Esta quadra traz-nos também a chave para um dos problemas mais nefastos da sociedade de hoje em dia, a falta de conexão HUMANA, e sublinho “humana”, porque, para mim, a digital não é real. Começa mais uma vez na empatia, e na capacidade de nos ligarmos afetivamente ao outro, sem calculismos ou pré-conceitos, no sentido de juízos previamente formulados, e muitas das vezes baseados em puro desconhecimento. Esta característica é a que nos torna humanos, a que nos faz ter esperança (definição de humano: “que mostra sentimentos de compaixão, benevolência ou solidariedade = benévolo, benfazejo, bondoso, compassivo, compreensivo” (in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).
Ligar-nos a pessoas-hygge, pessoas-aconchego, pessoas-colo, pode acontecer na família, no trabalho. Aconteceu-me no trabalho, numa escola a que se pode chamar “casa”. Há pessoas que nos trazem luz em dias mais escuros. Todos deviam ter uma tecedeira de emoções na sua vida, uma colega que se tornou amiga e que todos os dias traz luz e inspiração aos que a rodeiam, simplesmente porque está atenta aos outros, fazendo-os sentir únicos e especiais, atenta aos pormenores, à beleza das coisas simples. Saibamos, neste Natal, encontrar o “aconchego” e a simplicidade nos momentos mais belos, de verdadeira conexão, que se eternizarão na nossa memória, porque vão ser eles a esperança e o alento do amanhã!
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.