Mudanças precisam-se. Depois da justa mas tardia recuperação do tempo de serviço devido aos professores, em curso até julho de 2027, permitindo que cerca de 90% dos docentes portugueses possam vir a ser reposicionados em escalões mais elevados da carreira, continuam a ser necessárias e urgentes mudanças relativas às suas condições de trabalho. A mais importante, a nosso ver, será a reavaliação do tempo necessário para a obtenção da reforma.
Estamos envelhecidos. As nossas salas de professores estão repletas de professores ansiosos pela reforma. Uma situação triste, esta! Querermos que os anos passem por nós depressa para ficarmos mais velhos e nos aproximarmos da sonhada reforma. Passámos quase quarenta anos a trabalhar num ambiente de ruído permanente, a mudar de sala e de público de hora a hora, guiados por uma loucura criativa que nos tem mantido ligados à escola pública, resistindo a tudo e a todos. E agora? Pretenderá o Governo de Portugal apostar verdadeiramente na melhoria da Educação? Se sim, deverá ponderar seriamente a melhoria das condições de trabalho para quem entra agora na profissão e refletir sobre a qualidade do ensino prestado por quem continua nas escolas já desgastado por décadas de trabalho numa profissão de desafios e desgastes físicos e psicológicos permanentes.
Segundo dados de 2021 da Direcção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, mais de 85% dos professores tinham acima de quarenta anos, sendo metade deste número professores acima dos cinquenta. Já a percentagem de docentes com menos de trinta anos era de apenas 0,3 por cento. E hoje? De acordo com dados do relatório TALIS 2024, a idade média dos professores em Portugal é de aproximadamente de 51 anos, sendo superior à média da OCDE e uma das classes docentes mais envelhecidas da Europa. A percentagem de professores com 50 anos ou mais tem vindo a aumentar (em 2019, 52,9% dos professores portugueses tinham mais de cinquenta anos). Perante estes números, parece clara a necessidade de rejuvenescer e revitalizar os profissionais de ensino. Contudo, não se vê ainda qualquer luz ao fundo deste longo túnel que é ser professor em Portugal.
Após a reunião com as estruturas sindicais de dia 6 de novembro, na qual foi apresentada a proposta do Governo de protocolo negocial para a revisão do estatuto da Carreira Docente, o ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, informou que embora os efeitos desta revisão, se tudo correr atempadamente, se prevejam para final do ano letivo de 2026/2027, haverá matérias que poderão sem implementadas antes desse prazo à medida que forem negociadas. As principais prioridades identificadas nesta proposta de revisão prendem-se com o perfil do professor, o recrutamento e as condições de ingresso na carreira docente, seguindo-se a formação e o desenvolvimento profissional dos docentes, a organização do tempo letivo, as condições de trabalho, a estrutura da carreia e a avaliação de desempenho. Então e as condições de saída da carreira, senhores políticos?
Estão em cima da mesa de negociações alterações em matérias como salários e horários, consideradas fundamentais para atrair mais gente à profissão. Na verdade, urge aplicar efetivamente, sem quaisquer jogadas políticas ou administrativas (ou de qualquer outro tipo), a lei prevista no Art. 79º do Estatuto da Carreira Docente que prevê a Redução da Componente Letiva de oito horas quando os professores atingem os 60 anos de idade e 25 anos de serviço (redução a ser aplicada da seguinte forma: duas horas letivas aos 50 anos; mais duas horas aos 55 anos; outras quatro horas aos 60). O que se passa, na realidade das escolas, é a não aplicação desta lei da redução da componente letiva, habilmente manipulada e transformada em trabalho letivo disfarçado como coadjuvações, apoios pedagógicos, entre outros, fazendo com que um professor com 60 anos de idade e 35 anos de carreira não tenha, na prática, nenhuma redução.
Sobre o tempo necessário para a reforma dos professores, o que se encontra em debate? Absolutamente nada. Não foi identificada, até ao momento, nenhuma proposta oficial pública que proponha uma alteração específica da idade da reforma para docentes. Embora a Fenprof e a FNE tenham reivindicado a necessidade de discutir um regime específico de aposentação para professores que reconheça o desgaste desta profissão, o debate parece estar muito longe de ser prioridade para estes legisladores.
Importa retroceder uns anos e recordar que em 2021, a petição pública pela reforma dos professores aos 60 anos de idade e 36 de serviço contou com 26.793, quase o dobro do necessário para que a iniciativa fosse apreciada na Assembleia da República. Apesar da hipótese de os professores se reformarem aos 60 anos de idade ter chegado a ser admitida pelo Governo, os sindicatos vieram a público queixar-se de que o Ministério da Educação “bloqueou” as negociações. Com efeito, esta hipótese de os professores se reformarem aos 60 anos chegou a ser admitida pelo Governo, no Orçamento do Estado para 2020, tendo o Ministério da Educação, tutelado então pelo ministro Tiago Brandão Rodrigues, anunciado, na altura, a intenção de explorar cenários que permitissem aos professores após os 60 anos desempenhar outras atividades, garantindo o pleno aproveitamento das suas capacidades profissionais. A intenção de avançar com um programa de reformas antecipadas negociadas com os professores mais idosos e o alargamento do recrutamento de novos professores jovens, num processo de “adesão voluntária”, chegou ainda a ser inscrita na visão estratégica para o Plano de Recuperação e Resiliência, desenhado por António Costa, acabando por desaparecer da versão final do plano. Obviamente.
Atualmente, os professores não beneficiam de nenhum regime especial de aposentação. Numa classe envelhecida, continuam a aumentar os casos de professores que desejam aposentar-se. O Ministério da Educação, Ciência e Inovação apresentou um plano para que, quem estivesse à beira da aposentação e aceitasse adiar a reforma, receberia em troca mais 750 euros brutos mensais, ajudando assim a reduzir os casos de alunos sem aulas. Dos meus colegas que aceitaram prolongar a sua vida na escola, muitos não ficaram mais do que um ano. No próximo ano letivo, faltar-me-ão exatamente seis anos e nove meses para a reforma. Nós, os professores de Portugal que, se encontram nos últimos anos de uma longa e desgastante carreira profissional, pouco mais pedimos já do que respeito.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.