Credibilidade é palavra-chave do jornalismo. Com ela cresceram os jornais; por falta dela suicidam-se jornais, rádios e televisões – não a internet que na generalidade dos sites não é isso que se procura.
Que a credibilidade do jornalismo anda pelas ruas da amargura prova-se com eventos recentes: Trump ganhou contra a esmagadora maioria da informação qualificada norte-americana (tinha consigo 9 diários e 4 semanários contra 229 diários e 131 semanários apoiantes de Clinton, segundo contas de Pablo Boczkowski do Neiman Lab). No Brexit foi o que se viu; por cá é o que sente nas ruas e se constata nas vendas de jornais e de revistas.
O que dá credibilidade às publicações é o seu passado. O presente, reforça ou destrói. Quem as empresas escolhem para dirigir as suas redações é fundamental. E o que temos visto nos últimos tempos não abona. Como José Pedro Castanheira salientou no 4º Congresso dos Jornalistas, que terminou no domingo, jornais, rádios e televisões mudam de responsáveis como os clubes de futebol trocam de treinador. Há os que mudam de equipa e há os que até mudam de especialidade desportiva (saltando do papel para a net e da net para o papel e dali para a rádio e talvez dali para uma assessoria, com bilhete de ida e volta. E mesmo do mundo empresarial para o editorial, na televisão ou nos jornais. Para diretores, claro, que não havia melhores). O meu amigo Zé chamou-lhes, salvo erro, “diretores saltitantes”.
A credibilidade que os diretores tiverem é a que conferem aos respetivos órgãos. E quem a reconhece não são os leitores desinformados. Pelo contrário, são os líderes de opinião, que lhes conhecem os passados e que passam palavra, os citam ou ignoram, os respeitam ou deles escarnecem, os seguem ou desprezam.
Mas a preocupação geral parece ser a da conquista de audiências, a da busca da adesão acrítica dos leitores. Ser lido, para um jornalista, não basta. O gratificante é informar sobre assuntos relevantes, sobre matérias que contribuam para que os leitores possam decidir de forma consciente e informada. Quem apenas pensa em comunicar pouco se importa com a mensagem; o jornalista preocupa-se com conteúdo. A velha questão, nunca por demais recordada, da diferença entre o interesse público e o interesse do público.
Mas para quem confunde comunicar com informar (talvez até prefiram a primeira, na falsa esperança que o entretenimento, os vídeos com cãezinhos, o sangue e a restante superficialidade paguem melhor), não gosta de jornalistas defensores da ética e das preocupações da profissão. Querem comunicadores, os outros são empecilhos. Por isso não estranho que tenhamos chegado a uma situação em que, entre os diretores em exercício nos diários e nas televisões, pelos menos cinco tenham já sido assessores ou administradores. Quatro herdaram órgãos de referência de grande dimensão.
Serão independentes? Tanto como os outros? Talvez. Mas é inegável que em parte das respetivas vidas aceitaram que a verdade, a liberdade, a isenção, a independência a importância da mensagem não eram preocupações profissionais. Um assessor de ministro, um responsável por uma campanha, um gestor não procura transmitir conhecimento relevante. Antes pelo contrário. Têm água para levar ao moinho.
Por muito que queiram fechar o parêntesis que optaram por abrir em tempos anteriores, não conseguem sacudir a suspeição. O recato não pode ser apenas imposto à mulher de César e aos políticos. Afinal não é irrelevante ter andado ao lado de um primeiro-ministro, ter estado ao serviço de um alto representante do Estado ou liderado uma fundação privada durante anos, assessorar um líder partidário ou ter administrado os jornais que agora dirige.
Que pena o 4º Congresso (obrigado por ele, Flor Pedroso e equipa) não ter aprovado por aclamação o período de seis meses de nojo (deveria ser perpétuo para diretores) para quem quer regressar à profissão após passagem por cargos incompatíveis.
Foi um tiro no pé. Logo quando precisávamos de credibilidade, que tanto custa a conquistar e tão pouco a destruir.
(Artigo publicado na VISÃO 1246, de 19 de janeiro)