Teresa sem H não podia ser mais portuguesa. Filha de pais portugueses, expatriados em Londres há quase 3 anos a convite de uma multinacional daquelas mesmo boas e mesmo multinacional, nasceu no dia 10 de junho. É a Teresa sem H de Portugal apesar de ter nascido no Reino Unido. Por esta altura, já quase se senta, ri-se para quem passa e já deixa os pais dormirem algumas, poucas, horas seguidas. Tem passaporte Português tirado no Consulado de Portugal em Londres poucos dias depois de ter nascido e os seus pais nada mais querem do que ver a sua filha Teresa sem H feliz nesta Terra de gente pouco sã.
Theresa com H é entradota. Se calhar parece mais velha do que é. Ou melhor, parece bem mais velha do que é. Acabei de ler que tem 60 anos. Eu diria que estava bem mais avançada na linha da vida. Parece que se desmancha toda quando anda e tem ar de tudo menos de ser simpática – um traço comum a tantos outros cá na ilha. Tem um certo quê de arrogante na maneira como fala e como olha para quem está a falar com ela, como se estivesse a pensar “este tipo deve achar que sabe mais do que eu, deixa-me cá fazer a minha cara de interessada” apesar de saber que pouco ou nada alguma vez a faz mudar de posição.
As duas Teresas, com H e sem H, vivem aqui, em Londres. Uma, a sem H, vive em Putney, numa rua com nome de cidade indiana num bairro muito inglês com as casinhas todas iguais encostadas ao Tamisa. A com H mudou-se recentemente para o número 10 da Downing Street, no centro da capital. Já lá passou o Verão, mas pela cara, não parece ter apanhado muito sol.
Theresa com H conquistou o seu lugar sem direito a voto do povo, mas foi outro voto popular que a pôs nas páginas centrais da História do mundo. Chegou ao poder num país estupefacto com o resultado do povo nas urnas. E, desde esse dia, não tem feito um trabalho muito feliz em voltar a por os nossos queixos no sítio. Continuam caídos. E ela parece pouco ralada com a incerteza quanto a um futuro demasiado próximo para alguns, com a insegurança dos emigrantes e imigrantes e com a queda abrupta de uma moeda que há poucos meses era uma das mais fortes do mundo. Theresa com H continua a entrar pelas portas da Europa adentro como se fosse a raínha dos 28, quando não só nunca teve tamanho estatuto como os outros 27 a olham de lado. Alguns até encolhem os ombros com ar de gozo cada vez que Theresa com H diz que o seu país vai saír da União Europeia mas não vai abandonar a Europa. Sound bites potentes para títulos de jornais que pouco ou nada significam no mundo real.
Nos últimos dias, o circo de Theresa com H teve nova animação quando se soube que afinal o Brexit vai ter que ser aprovado no Parlamento. Para ela, tudo se mantém como está pois está confiante que nada fará mudar o rumo das coisas. Em Março lá estará Theresa com H a carregar num botão grande, encarnadão, daqueles que precisam de duas mãos a carregar com muita força (ou talvez uma alavanca ferrugenta e barulhenta? fará barulho ao disparar, como os alarmes das lojas que disparam quando os ténis que acabámos de comprar ainda têm aqueles pinchavelhos presos?) que irá despoletar….qualquer coisa que ninguém ainda sabe muito bem o que é – nem ela própria. Nesse dia, Theresa com H e o seu séquito vão mergulhar em conversas, reuniões (bi, tri ou simplesmente multilaterais), negociações, seminários, cimeiras, discursos, debates que, finalmente, irão começar dissipar o denso nevoeiro que caiu sobre este país. Porque por enquanto a visibilidade é menor do que quando o grand “Smog” se abateu em Londres em 1952. Menor e igualmente tóxica.
Enquanto esse dia não chega, o país vai brincando com a sua gente. Gente essa que, grande parte, desconhece as implicações da cruz que vincou a tinta permanente no boletim de voto. Enquanto Theresa com H não aciona o artigo 50, a vida vai correndo a um ritmo mais ou menos normal. Teresa sem H vai aprendendo a sentar-se, vai comendo as primeiras papas (porridge, provavelmente, já que Cerelac não abunda por estas bandas) e talvez dizendo as suas primeiras palavras – será Brexit a primeira? Vai brincando com botões e alavancas que nada mais fazem do que emitir sons que lhe provocam grandes gargalhadas.
E no meio desta brincadeira toda, a verdade é que Theresa com H tem nas suas mãos o poder de mudar o destino da pequena Teresa sem H. Dela, dos outros 8 milhões sem H que vivem aqui na ilha e dos outros tantos milhões que decidiram fugir daqui enquanto é tempo.
VISTO DE FORA
Dias sem ir a Portugal: 90
Nas notícias por aqui: Brexit, ora avança, ora recua. E a malta a vê-las passar (às libras)
Sabia que por cá…a 5 de novembro há fogueiras e fogo de artifício para dar e vender. Celebra-se a morte do católico Guy Fawkes considerado um traidor por organizar uma explosão no parlamento inglês que iria assassinar o rei protestante James I, em 1605.
Um número surpreendente: aqui falam-se mais de 300 línguas