O tema da imigração é demasiado importante para ser utilizado apenas como arma de arremesso eleitoral ou como bandeira demagógica dos partidos de extrema-direita – sempre interessados em utilizar o medo e a desconfiança sobre os outros, para ajudar a polarizar ainda mais as sociedades e a lançar lenha para a fogueira da crispação, dos apelos ao ódio e ao confronto diário.
A forma como Portugal deve construir uma política de acolhimento de imigrantes também não pode ficar dependente da adoção de medidas avulsas ou de deliberações burocráticas que, depois, são mal executadas e deitam por terra quaisquer boas intenções com que possam ter sido propostas. Especialmente quando não levam em linha de conta a realidade que se aproxima, em passos rápidos e imparáveis, e apenas procuram responder a emergências ou a soluções de curto prazo, sem olhar para o assunto de uma forma global, em que o País, por mais fronteiras que alguns queiram fechar, nunca poderá ficar estanque a tudo o que se passa em seu redor, mesmo quando as crises, guerras e catástrofes ocorrem em partes longínquas do planeta. Num mundo globalizado, as ondas de choque são imparáveis em qualquer geografia. Acabam sempre por chegar e, como se tem visto, apanhar desprevenido quem não as soube prever ou preferiu ignorar os sinais que foram sendo dados.
A abordagem do tema da imigração hoje em Portugal tem de estar alinhada, obrigatoriamente, com a visão estratégica que se propõe para o País. E, mais do que nunca, é isso que precisa de ser clarificado, quando se acumulam as vozes para exigir o reerguer de fronteiras na União Europeia e se procura apresentar o estrangeiro como inimigo.
Acima de tudo, é preciso ter consciência de que o desafio demográfico que Portugal enfrenta não se resolve com golpes de magia nem com medidas populistas, que prometem sempre soluções milagrosas para qualquer problema complexo. Aliás, mesmo que se adotem, no imediato, as medidas mais corretas e eficazes, os resultados só serão visíveis ao fim de algumas gerações – acreditando que se poderá resolver unicamente atrás de apoios e incentivos à natalidade.
Há uma verdade evidente, mesmo que possa parecer inconveniente para muitos: Portugal vai precisar, ao longo das próximas décadas, de muitos imigrantes. Como sucede, aliás, com quase todos os outros países europeus, com saldo natural negativo, em que, todos os anos, morrem mais pessoas do que aquelas que nascem.
Desde o princípio da Humanidade, os povos sempre se movimentaram em busca de vida melhor. Foi assim no passado e continua a ser assim no presente. Por outro lado, percebemos, no último século, que conforme vai aumentando o nível e a qualidade de vida das populações, a natalidade diminui em sentido inverso. A equação está à vista de todos, como Eduardo Lourenço bem sintetizou, há alguns anos, quando declarou que “o planeta está em migração”. E nesse movimento, segundo o pensador, “África, se pudesse, passava toda para a Europa, por uma questão de sobrevivência”.
Pelas razões conhecidas, sabemos também que África será, nos próximos anos, o continente com maior crescimento populacional. Por uma única e exclusiva razão: porque é o continente mais pobre.
A verdade é que ninguém deve ficar condenado à pobreza só porque nasceu num país pobre. Nem os outros países devem ficar condenados a serem habitados e liderados unicamente por quem nasceu no interior das suas fronteiras.
As sociedades mais desenvolvidas sempre foram as mais cosmopolitas, aquelas que souberam reunir, num mesmo espaço, diferentes formas de olhar para o mundo, diferentes credos, até diferentes modos de vida. E o sistema será cada vez mais virtuoso quanto melhor se conseguir organizar com um conjunto de regras que sejam respeitadas por todos.
As melhores universidades do mundo distinguem-se por terem professores, investigadores e alunos das mais diversas partes do planeta. Escolhidos não em função da nacionalidade, mas sim do saber e do conhecimento. O mesmo acontece com os clubes de futebol, onde, cada vez mais, os vencedores são os que melhor sabem ir procurar talento fora de portas. É por isso que o tema da imigração não pode ser nunca sobre o fecho de fronteiras. Precisa, isso sim, de ser centrado no mais importante: a integração dos imigrantes. E, como consequência, na construção de uma sociedade mais justa e de progresso.