Aquando da sua recente visita a Moçambique, mais de cinquenta anos depois de cá ter estado, na peça intitulada Ruy – A História Devida, apresentada no auditório Carlos Paredes da Escola Portuguesa de Moçambique, em cena o autor afirma: A diferença está na qualidade do amor que pomos no nosso trabalho.
Foi com profissionalismo e amor que a Escola Portuguesa de Moçambique – Centro de Ensino e Língua Portuguesa em Maputo, acolheu o III Encontro das Escolas Portuguesas no Estrangeiro que decorreu de 5 a 8 de maio, subordinado ao tema Construindo Pontes Rumo à Democracia Cultural – Desafios e Oportunidades das EPE. O primeiro encontro de Escolas Portuguesas no Estrangeiro teve lugar em 2019 na Cidade da Praia, em Cabo Verde, tendo o segundo encontro decorrido em S. Tomé e Príncipe em 2023. Coube agora à Escola Portuguesa de Moçambique acolher este terceiro encontro em que se debatem formas de construir pontes entre todos através da língua e da cultura portuguesas.
As escolas portuguesas no estrangeiro foram criadas no âmbito das relações de amizade e de cooperação no domínio da Educação, através da assinatura de protocolos de cooperação bilateral entre o Estado português e Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Timor-Leste e a Região Administrativa Especial de Macau (China).
Estes estabelecimentos educativos públicos são frequentados por alunos das mais diversas nacionalidades.
A rede de Escolas Portuguesas no Estrangeiro integra atualmente 27 estabelecimentos de ensino distribuídos por 6 países, nos quais 949 docentes ministram o currículo português em língua portuguesa a 11 647 crianças e jovens da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário. Dos nove estados membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Guiné Equatorial, Portugal, Moçambique, S.Tomé e Príncipe e Timor-Leste), a EPM recebe alunos oriundos de seis (Angola, Brasil, Cabo Verde, Moçambique, Portugal e Timor Leste). E dos seis países da África Lusófona, conhecidos como os países africanos de língua oficial portuguesa (PALOPs) – Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, S.Tomé e Príncipe e a Guiné Equatorial (que aderiu ao grupo posteriormente e adotou a língua portuguesa como oficial), a nossa escola possui alunos de três: Angola, Cabo Verde e Moçambique.
O evento, organizado pela Direção-Geral da Administração Escolar através da Direção de Serviços de Ensino e das Escolas Portuguesas no Estrangeiro, contou com um vasto programa de atividades culturais, conferências, palestras, debates, lançamento da publicação As palavras de abril e com a presença do Exmo. Ministro da Educação, Ciência e Inovação recém-eleito, Drº Fernando Alexandre, que encerrou os trabalhos, da Diretora Geral da Administração Escolar, Drª Susana Castanheira Lopes, da Diretora dos Serviços de Ensino e as Escolas Portuguesas no Estrangeiro, Drª Paula Teixeira, da Inspetora-Geral da Educação e Ciência, Drª Adriana Cosme, do Reitor da Universidade Pedagógica de Maputo, Drº João Ferrão, assim como dos representantes das diferentes escolas da diáspora, nomeadamente de Angola, Cabo Verde, S.Tomé e Príncipe e Timor (Díli).
Do programa de atividades do III Encontro de EPE´s destacam-se aqui as mais importantes: no primeiro dia (5 de maio) celebrou-se o Dia Mundial da Língua Portuguesa, a quarta língua mais falada no mundo e de onde, diz o poeta, é possível ver-se o mar. O segundo dia (6 de maio) abriu a ordem de trabalhos com a conferência Educação e Culturas: a beleza do plural, com a participação do escritor moçambicano Mia Couto. O terceiro dia de atividades (7 de maio) começou com uma palestra sobre o tema: A Biblioteca Escolar nas EPE: Centros difusores de língua portuguesa pela Coordenadora da Rede das Bibliotecas Escolares, Drª Manuela Silva, seguida de um debate sobre o tema Sensibilidade intercultural – desafios e práticas de inclusão. De destacara intervenção do Magnífico Reitor da Universidade Pedagógica de Moçambique, Drº Jorge Ferrão,sobre A organização do sistema de ensino público em Moçambique. Ainda no mesmo dia, teve lugar a conferência sobre A Inteligência Artificial nas Escolas – contextos de aplicação e exemplos de práticas, apresentada pelo Drº Ricardo Cruz, seguida de uma mesa redonda alusiva ao tema Desafios e Oportunidades de utilização da inteligência artificial em contexto escolar. O último dia de trabalhos (8 de maio) teve início com uma conferência sobre Os Desafios Pedagógicos nas EPE – O Trabalho em Rede e a Formação para uma Educação de Qualidade, com a presença da Inspetora-Geral da Educação e Ciência, Drª Adriana Cosme, tendo o III Encontro das EPE’s terminado com a mesa redonda sobre o tema Desafios e Oportunidades – As Escolas Portuguesas no Estrangeiro em discussão.
A sessão de encerramento do evento foi dirigida pelo Exmo. Senhor Ministro da Educação de Portugal, que reconheceu a importância das escolas Portuguesas no Estrangeiro para a promoção da língua e cultura portuguesas. Parece ser objetivo do Governo de Portugal alargar a rede de escolas portuguesas no estrangeiro com possíveis iniciativas privadas, consolidando assim a cooperação com os diferentes países onde estas já se encontram, de forma a alargar e permitir o acesso a este tipo de ensino a um número mais vasto e alunos. Por sua vez, a atual presidente da Comissão Administrativa Provisória da Escola Portuguesa de Moçambique, Drª Luísa Antunes, realçou o facto de a língua portuguesa ser língua de identidade que hoje ganha um relevo maior dada a globalização, a interação dos países num contexto de mercados internacionais, de saber, de cultura, afirmando que assumir a língua portuguesa como património de valor identitário e global sempre fez, e continua a fazer, partes dos atuais objetivos do Governo Português.
Em Moçambique há cerca de dez milhões de jovens a frequentar o ensino público. De acordo com o Reitor da Universidade Pedagógica de Maputo, Drº João Ferrão, a massificação do ensino com números que assustam qualquer um exige umsistema de organização delicado pois faltam estruturas para fazer frente a este elevado número de alunos. O mesmo parece suceder noutros países da diáspora onde a língua portuguesa é garante de unidade. Poderão as escolas portuguesas no estrangeiro sair do elitismo que as caracteriza e chegar mais longe, às populações dos diferentes países que as acolhem? Se sim, como poderão ser essas pontes construídas? Estas são apenas, entre muitas outras, algumas das questões que importará colocar quando o tema em cima da mesa é a construção de pontes rumo à democracia cultural.
As escolas portuguesas no estrangeiro integram culturas através de uma língua comum, fundamental na construção dos percursos identitários dos diferentes alunos que as frequentam e das histórias de vida que cada um irá construir. Deste modo, procura-se trabalhar numa perspetiva multicultural que comece nos portões de cada escola e se espalhe a todos os seus recantos, tendo a sala de aula apenas como um dos muitos espaços de partilha desta vivência transcultural que estas escolas visam proporcionar mas que poderia (e deveria) saltar os muros e chegar mais longe, ao país e ao povo que as acolhe.
O III Encontro das Escolas Portuguesas no Estrangeiro, acolhido pela EPM-Celp, terminou com uma parte do seu ADN: a ARTE, através da presença do mais antigo e duradouro ator português em palco, o renomeado Ruy de Carvalho. E tal como ele afirma: Só há duas formas de representar; bem ou mal. Assim-assim, não vale a pena…
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