Numa crónica anterior fazíamos a seguinte pergunta: “Se existe entendimento sobre este assunto, por que razão a água pública continua a ser um bem tão escasso nas nossas praias e porque nos mantemos tão silenciosos sobre este assunto, central à nossa qualidade de vida nos meses de verão?”
Pois bem, depois de muitas insistências, de várias legislaturas sem resposta e agora sob proposta do Governo, a Assembleia da República aprovou a Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto, a qual transferiu para os municípios a competência da gestão das praias. O presente decreto-lei sublinha que as “praias são espaços que devem contribuir para a criação de ambientes promotores da saúde e do bem-estar das populações, devendo promover-se, designadamente, a existência de equipamentos de disponibilidade gratuita de água da rede pública.” Finalmente !
Apesar de forma indireta, esta menção na lei, vem reforçar a necessidade do espaço público, e em particular as praias, serem locais onde as autarquias devem promover a disponibilidade de água da rede pública a todos os banhistas. E vai de encontro à necessidade de promover o acesso a este bem que é também uma condição para o gozo de outros direitos, designadamente o direito à saúde e ao bem-estar. Nesse sentido, o Comité dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas refere que “O direito humano à água implica que todas as pessoas possam beneficiar de água em quantidade suficiente, segura, aceitável, fisicamente acessível e de preço também acessível, para uso pessoal e doméstico.” A escassez de água para beber ou a presença apenas de água engarrafada a preços elevados nas praias e no tempo de calor promovia a desidratação e os sintomas associados como dores de cabeça, irritabilidade e cansaço afetando também a capacidade de concentração, atenção e memória. A não ingestão de água tornava mais difícil a regulação da temperatura corporal e o normal funcionamento dos órgãos, dificultando o controlo do peso corporal. Por outro lado, sabemos hoje que quem bebe maiores quantidades de água diariamente, ingere em média menos energia, consome menos calorias a partir de bebidas com açúcar e aumenta a qualidade global da dieta. Por outro lado, a não existência de água da rede pública incentivava o consumo desnecessário e poluente de milhares de garrafas de plástico diariamente, muitas delas que acabavam no oceano. Razões mais do que suficientes para a água estar disponível nos locais públicos, em particular nos dias de calor e nas praias.
Esperemos agora, com o alento desta Lei, que as autarquias sejam incentivadas a disponibilizar água nas praias portugueses e a promoverem a saúde dos portugueses, independentemente dos recursos económicos de cada um.
Neste sentido, a política alimentar nacional (EIPAS) levada a cabo pela Direção-Geral da Saúde tem como orientações “Propor a existência de dispensadores de água gratuitos ou a distribuição de água nos serviços e organismos da administração direta e indireta do Estado e nos demais serviços sob gestão pública e promover o seu consumo” e “Propor que nos eventos públicos organizados pelos serviços e organismos da administração direta e indireta do Estado exista obrigatoriamente a oferta de água, fruta e ou produtos hortícolas, de preferência respeitando critérios de disponibilidade sazonal e de proximidade.”
Um passo já se deu. Começamos o Ano Novo com esperança. Esperemos os próximos passos a bem da nossa saúde e da saúde do planeta.