Há um espectro que ameaça o PSD, acaba em “ismo”, mas não é seguramente o do comunismo. O fantasma que, desde que Rui Rio venceu Santana Lopes, assombra as paredes da São Caetano à Lapa, é o do anacronismo.
Rui Rio, o anacrónico, parece muitas vezes um australopiteco a tentar pilotar uma nave espacial. Num mundo em que é impossível não comunicar, o novo líder do PSD não esconde o seu desprezo profundo pela classe jornalística, alienando à partida um capital que lhe poderia ser útil nas legislativas de 2019. Num universo onde os factos não existem – existem interpretações de factos, o que é totalmente diferente -, Rio insiste em agarrar-se desesperadamente ao discurso do Excel, dinamitando as lições que Nietzsche nos deu sobre a matéria (para os mais distraídos: é falso que a pós-verdade tenha nascido com Donald Trump e as redes sociais).
Finalmente, num sistema, o da política, em que nunca se deve ter medo do silêncio, Rio não se inibe de dizer sempre o que pensa sobre tudo – e aquilo que pensa é frequentemente mau, como é manifestamente a intenção anunciada de apoiar o Partido Socialista caso este vença as legislativas sem maioria absoluta.
Numa altura em que tem de iniciar um caminho autónomo na liderança da oposição, ou Rio muda ou tornar-se-á rapidamente no maior inimigo do PSD, conseguindo o feito olímpico de se tornar no BFF* de António Costa, Assunção Cristas, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa em simultâneo.
De António Costa porque se não encontrar uma maneira, digamos, elegante (existirá?), de desdizer o que disse, em 2019 não tem como não surgir aos olhos dos eleitores como o candidato a porta-chaves do Partido Socialista.
De Assunção Cristas porque será a líder do CDS a capitalizar a desistência antecipada do seu vizinho de bancada. A discípula de Paulo Portas tem feito um percurso notável na chefia do partido e corre o risco de estender às legislativas o magnífico resultado nas autárquicas.
De Catarina Martins e Jerónimo de Sousa, por fim, porque com a sua aversão ao silêncio e o seu apego à gafe, Rio conseguiu que a dupla não tenha de lutar intensamente contra a ideia instalada – com razão, há que dizê-lo – de que são eles os porta-chaves de António Costa. E isso poderá fazer muita diferença na fixação dos respectivos eleitorados, desgastados com o colaboracionismo muitas vezes acrítico (mais pronunciado no BE do que no PCP) com que têm brindado o Primeiro-Ministro.
* (Best Friend Forever)