Teria à volta de dez anos quando o meu pai me falou pela primeira vez da Teoria da Relatividade de Einstein. De como na relatividade restrita, ou estrita, espaço e tempo não existem um sem o outro e a velocidade da luz, uns absurdos 300 mil quilómetros por segundo, é o limite na natureza. Na relatividade geral, a coisa complica-se mais ainda. Aqui já entram os efeitos da gravidade e a noção de curvatura espaço/tempo. Onde a consequência mais estranha e difícil de entender é normalmente traduzida no paradoxo dos gémeos: se um dos irmãos embarcasse numa nave, que viajasse a uma velocidade próxima da luz, e o outro ficasse na Terra, quando acabasse a viagem o gémeo viajante estaria muito mais novo do que aquele que ficou cá – o tempo é relativo.
Passei muitas noites de insónia a tentar dar forma, na minha cabeça, a todos estes conceitos. A angústia de não compreender completamente estas leis da Física e o universo à nossa volta acompanhou-me por uns bons anos. E alimentou outras tantas conversas de boa memória. Mais do que outra coisa qualquer, inquietava-me que nunca se pudesse realmente saber se isto tudo era mesmo verdade. Se as contas saídas do génio de Einstein não passariam de uma perfeição matemática. Alguma vez seremos capazes de viajar à velocidade da luz? E se o fizermos, seremos imortais?
Depois chegou a adolescência, e as angústias passaram a ser outras. Igualmente intransponíveis, claro! E com a agravante de não poderem ser apresentadas numa equação com X e Y. A seguir, a idade adulta, com os seus teres e haveres, remeteu definitivamente Einstein para o lugar da memória. Nas noites de insónia, ocupo-me agora de listas de tarefas, gestão financeira, decisões parentais.
Até que chega o dia do lançamento da missão da Agência Espacial Europeia, LISA Pathfinder (que deveria ser hoje, 2 de dezembro de 2015, um século depois de Einstein ter publicado o artigo científico em que descreve a sua Teoria da Relatividade Geral, mas foi adiado à última hora por causa de um problema no lançador). E que vai fazer esta nave, durante seis meses, a uma distância de 1,5 milhões de quilómetros da Terra? Testar a Teoria da Relatividade Geral de Einstein. Nem mais nem menos. Assim: simples, simples. Para isso, a nave vai viajar até aos confins do Sistema Solar, levando a bordo duas massas que vão cair, numa queda-livre gravitacional quase perfeita (sem interferência da gravidade terrestre). A ideia é que com esta experiência se consiga detetar as tais ondas gravitacionais previstas por Einstein, medindo o impacto de eventos astronómicos que causam distorções mínimas no espaço. Como os buracos negros, por exemplo. Objetos tão astronomicamente maciços que provocam perturbações no tal espaço/tempo. Esta será, espera-se, a primeira de uma série de missões que usará uma nova forma de ler o universo. Há as ondas eletromagnéticas, como a luz visível, os infravermelhos, os ultravioleta, ou os raios-X. Passará a haver também as ondas gravitacionais. As únicas que poderão trazer alguma luz sobre o que se passa nos tais buracos negros, de onde nada escapará, nem sequer a luz.
O que é que isso interessa?, pensa a adulta preocupada com a taxa de desemprego ou o salário médio nacional de um país em crise. Porque haverá a Europa endividada de gastar milhões de euros só para mandar duas bolinhas para tão longe, testar uma teoria que não influenciará em nada a nossa vida? Porque gera emprego qualificado, transferências de tecnologia… Estas são as razões oficiais. Mas eu prefiro a verdadeira, que invoca a resposta dada pelo alpinista George Mallory, numa entrevista, quando lhe perguntaram o que o motivava a subir a montanha mais alta do mundo: “Porque está lá.”