Cada vez mais, os animais de companhia são vistos como membros da família. Fazem parte do dia a dia dos seus tutores, influenciam rotinas e decisões e, para muitos, representam um pilar essencial no bem-estar emocional. No entanto, se olharmos para a forma como o País está preparado para receber esta realidade crescente, surge uma questão incontornável: será que Portugal é, de facto, um país pet friendly?
Ainda que a sociedade tenha evoluído na aceitação dos animais e na sua integração em determinados espaços, a verdade é que muitas infraestruturas e serviços ainda não acompanham esta transformação. O turismo e a restauração começam, timidamente, a abrir as portas à presença de animais, mas existem lacunas evidentes quando falamos de transportes, locais públicos e até mesmo do contexto profissional.
Se analisarmos um dos momentos mais frequentes para qualquer família – as viagens –, percebemos rapidamente os desafios que os tutores enfrentam. Durante períodos como a Páscoa ou o Natal, muitas famílias percorrem longas distâncias para estarem com os seus entes queridos e os seus animais de companhia, naturalmente, acompanham-nas. No entanto, as infraestruturas de apoio a estas deslocações ainda não estão adaptadas.
As estações de serviço, pontos de paragem essenciais em qualquer viagem de carro, continuam a falhar na criação de condições para que os animais possam descansar em segurança. Apesar das remodelações que muitas têm sofrido, poucas são as que oferecem espaços adequados para os animais, e menos ainda as que permitem a sua entrada nos estabelecimentos. Numa altura em que já se compreende os riscos de deixar um animal dentro do carro, especialmente em dias de calor, como garantir que os tutores também podem usufruir de uma pausa confortável durante a viagem?
Se as deslocações de carro representam um desafio, o cenário dos transportes públicos não é mais favorável. Embora seja permitido o transporte de animais em alguns serviços, a legislação continua vaga e pouco uniforme. As regras aplicáveis ao metro, comboios ou autocarros não são claras e muitas vezes variam conforme o operador ou a interpretação de quem está no terreno. Além disso, a classificação de “animais de companhia” é abrangente, mas a falta de especificidade sobre que tipos de animais são aceites, quais os critérios de transporte e que responsabilidades recaem sobre os tutores gera incerteza. Em vez de se basearem apenas no tamanho do animal, não faria mais sentido considerar o seu comportamento e grau de socialização?
Para além das questões logísticas, há ainda um tema que impacta diretamente a vida de milhares de tutores: o contexto profissional. Com a crescente sensibilização para o impacto dos animais no bem-estar humano, tem-se debatido cada vez mais a possibilidade de permitir que os colaboradores levem os seus animais para o local de trabalho. Esta medida, adotada em algumas empresas internacionais, não se limita ao conforto dos animais – tem um impacto real na produtividade e na satisfação dos trabalhadores. A impossibilidade de integrar os seus animais no dia a dia laboral pode ser um fator de stress adicional, sobretudo para quem tem cães e precisa de interromper o seu horário para ir a casa. Criar políticas pet friendly nas empresas, com regras bem definidas, pode ser um passo essencial para um ambiente de trabalho mais equilibrado e uma maior qualidade de vida para tutores e animais.
No entanto, qualquer evolução nesta matéria exige um suporte legislativo claro. Para que Portugal possa, de facto, ser considerado um país pet friendly, não basta que algumas empresas ou espaços tomem a iniciativa individualmente. É necessário que existam normas transversais e uma estratégia concertada para garantir que a inclusão dos animais é feita de forma responsável, respeitando não apenas os seus tutores, mas também aqueles que não têm afinidade com animais.
Ser um país pet friendly não significa apenas registar um elevado número de adoções ou construir mais parques caninos. Significa, antes de tudo, garantir que os espaços e serviços públicos refletem as necessidades das famílias multiespécie. Significa encontrar um equilíbrio entre integração e respeito, garantindo que os direitos e deveres de todos os cidadãos são tidos em conta. E, acima de tudo, significa criar um modelo sustentável de convivência entre humanos e animais, onde o bem-estar de todos é colocado no centro das decisões.
Portugal tem feito progressos neste caminho, mas ainda há um longo percurso a percorrer. A questão que se impõe não é se queremos ser um país pet friendly, mas sim quando estaremos verdadeiramente preparados para isso.
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