Em março de 2020, a CBRE publicou um estudo muito completo sobre as tendências do trabalho para a próxima década que, vistas em conjunto, seriam a base do que designámos por ‘Age of Responsive Real Estate’. Menos de dois meses depois estávamos a reportar que a COVID-19 veio para acelerar esta transição em cerca de 10 anos. Ou seja, agora.
Uma coisa é certa, passados mais alguns meses a flexibilidade no trabalho deixou de ser uma escolha, passando a ser uma necessidade imposta, que trará consequências sérias. A questão deixou de ser se o trabalho a partir de casa vai ou não ser permanente, mas sim como devem as empresas encontrar um equilíbrio que tenha em conta as suas medidas fundamentais.
Sabemos que o aumento da incerteza e a previsão de recessão económica, a nível global, têm resultado em duas reações. Em primeiro lugar, na redução dos metros quadrados dos escritórios. Em segundo, no sentimento do colaborador médio de que esta nova situação de trabalho pode ser de algum modo positiva.
A CBRE vê a diminuição de metros quadrados como uma resposta compreensível à situação atual, mas é importante avaliar os riscos a longo prazo, sobretudo quando a redução do espaço é a única intervenção, e não surge como parte de um conjunto de medidas que são tidas em conta de forma criteriosa e implementadas com racionalidade.
Será o trabalho a partir de casa o novo normal? O segredo está no mix. E a solução é tudo menos generalizada. Cada caso é um caso.
É importante ter em consideração que o equilíbrio entre presencial e remoto contribui para uma concretização útil do conceito de ‘trabalho’ como um todo. Será interessante olhar para este tema numa perspetiva holística, ou seja, cada empresa definir ou redefinir os seus processos, a sua cultura e os seus objetivos – e, a partir daí, encontrar um equilíbrio duradouro e saudável entre casa e escritório.
O local ideal para trabalhar é muitas vezes enquadrado numa opção de flexibilidade binária e mutuamente exclusiva: trabalhar no escritório ou trabalhar remotamente. Vemos a opção conjunta de trabalhar no escritório e à distância como um mix dinâmico cuja combinação é estratégica, de acordo com o momento e com a evolução de determinada tarefa ou projeto no tempo. Em trabalho remoto, a palavra ‘remoto’ refere-se não só ao trabalho que se executa em determinado local, mas também à distância emocional e psicológica. Essa é a essência do trabalho: atingir algo juntos a partir de um lugar que nos é comum e que potencia o envolvimento de todos na organização, das suas partes interessadas e dos seus clientes em torno de um determinado objetivo.
As necessidades e expectativas do capital social são muito mais valiosas do que o que possamos vir a poupar no imobiliário. Se o escritório é o lugar por excelência onde acontece a partilha de ideias e onde a inovação acontece de forma natural, desistir desse espaço pode ser catastrófico para os negócios no longo prazo.
Como se sentirão os colaboradores das empresas relativamente a isto?
Reconhecemos que trabalhar a partir de casa tem vantagens óbvias. Contudo, quando mergulhamos a fundo nos estudos, embora cerca de dois terços dos colaboradores que estão em trabalho remoto se mostrem satisfeitos, a conclusão lógica deve ser também de que um terço está pouco satisfeito, ou mesmo insatisfeito.
Olhamos para estes estudos numa perspetiva crítica sobre a capacidade que resultados específicos nos possam dar uma visão clara do futuro. Não podemos deixar de notar que estes resultados não mostram um consenso e que revelam benefícios imediatos do trabalho remoto. Os riscos associados ao stress e à falta de interação e coesão social das organizações aparecem de forma ténue, mas estão lá, garantidamente.
Estes fatores podem ser prejudiciais para a vida dos colaboradores, se observarmos o seu aumento em futuros resultados, mas também pelo impacto negativo que podem trazer à produtividade e ao compromisso com os objetivos de negócio das empresas. O que vem a seguir?
Um novo olhar sobre o trabalho e sobre a forma como ele se organiza é o caminho a seguir. A escolha entre casa e escritório deverá ser múltipla e simbiótica.
Qualquer gestor que trabalhe a sua ideia de trabalho híbrido chegará rapidamente à solução de colaboração assíncrona e distribuída. Se o escritório for pensado como um catalisador de inovação e produtividade, os colaboradores vão querer utilizá-lo, na medida das suas necessidades para entregarem um output ótimo. E, já agora, fazê-los progredir na carreira.
Se o escritório ganha uma preponderância tão grande na qualidade de vida do colaborador, porque não fazer o escritório ir ao encontro do colaborador e não o inverso? Pode colocar-se a questão se Portugal tem escala para que a mesma empresa tenha mais do que uma localização em Lisboa ou no Porto. Mas, de facto, a distância importante não é a distância física, para compreendermos bem esta solução.
Num país pequeno, em que a área metropolitana de Lisboa tem apenas 3 km2 – que compara com quase o triplo em Londres –, as distâncias podem ser maiores do que aparentam, se as medirmos em minutos, por exemplo. Do Barreiro a Entrecampos, em transporte privado, demora-se aproximadamente o mesmo que de Évora a Almada.
Se o commuting é um problema, talvez a solução seja optar por hubs perto dos colaboradores – um exemplo disso são os escritórios satélite que começam a surgir nas grandes cidades europeias, em alguns casos dentro de um operador flex. Em Lisboa, localizações como Almada, Sintra, Sacavém ou Alverca podem fazer sentido para alguns negócios.
Estes espaços, se tiverem a massa crítica necessária – que vai variar mediante a cultura da empresa –, poderão ser um polo de aproximação dos colaboradores à marca e uma ferramenta de manutenção de uma cultura viva muito mais eficaz do que as empresas ficarem reféns do trabalho a partir de casa.
Cada vez mais organizações criam espaço nos seus C-Suites para uma nova posição: o Chief of Work, cuja missão será pensar estrategicamente na experiência do trabalho e em como o escritório flagship corporativo deve responder às necessidades das equipas. Só pode ser bom!