Dia 20 de fevereiro a Assembleia da República vai discutir e votar, um conjunto de diplomas de diferentes partidos, PS, PAN, BE, PEV e IL, sobre a despenalização da morte assistida em Portugal.
Há um debate público a acontecer sobre o tema e por isso é fundamental esclarecer que o que está em causa nas propostas que vão ser decididas pelo Parlamento são por um lado, direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e por outro, uma alteração ao código penal.
Os Deputados não se vão pronunciar sobre a moral filosófica ou sobre a mundivisão que determinados setores têm sobre o que significa a vida e a morte. O que está em causa na decisão do Parlamento são as pessoas e os seus direitos.
O que está em causa é a possibilidade de pessoas conscientes e de livre vontade, que estão em situação de extremo sofrimento e doença irreversível ou fatal, poderem pedir para serem ajudadas a morrer, excluindo para o efeito pessoas menores de idade e, na maioria das propostas, pessoas com patologias psiquiátricas.
De acordo com os projetos lei que estão em discussão, para que o seu pedido seja respondido positivamente há um conjunto de passos que têm que ser dados, a começar pelo seu pedido expresso e consciente, escrito e assinado, passando por várias avaliações médicas e uma decisão final supervisionada, que, no caso da proposta do PS, cessa sempre que a pessoa fique inconsciente.
Como podemos constatar, as propostas são muitíssimo cautelosas e garantisticas, e é exatamente esta a matéria que vai a votos e não outras argumentações que por aí se ouvem, como a chamada “rampa deslizante” que significa que depois da lei aprovada se alargará a eutanásia a pessoas que não correspondem aos critérios legais.
A propagação da culpa e do medo são estratégias recorrentes de quem quer perpetuar um paradigma de sociedade onde só uma visão tem lugar, em que a sua perspetiva sobre o caráter sagrado da vida e de um sofrimento que leva à redenção, deve ser abraçado por quem acredita e imposto, sem contemplações, a todas as outras pessoas.
Acontece, que apesar da matriz Judaico-Cristã da sociedade em que vivemos, o Estado é laico e democrático, e por isso não deve seguir a moral de uns, pondo em causa os direitos dos outros.
O outro aspeto em causa nas propostas que serão decididas na Assembleia da República, é a despenalização, ou seja, os profissionais de saúde que ajudarem as pessoas a morrer, dentro do quadro legal, deixarem de ser acusados de um crime, levando para isso a uma alteração no código penal.
Um argumento recorrente no debate dos últimos dias, utilizado por aqueles que se opõe à despenalização da eutanásia, prende-se com a morte assistida em oposição ao desenvolvimento dos cuidados paliativos e ao progresso científico.
Não há qualquer oposição. Os cuidados paliativos devem ser desenvolvidos e disponibilizados a todos de que deles necessitem e que queiram usufruir desses cuidados, outra coisa é, independentemente do acesso a cuidados paliativos, uma pessoa ter o direito consagrado na lei de, em casos muito específicos, poder escolher que a sua vida termina ali.
Em democracia o que é razoável é que aqueles que acreditam que a vida é sagrada e inviolável, sejam respeitados na sua posição individual e íntima perante a morte, mas que também aqueles que pensam de outra forma e que querem decidir num momento e numa situação que para si é limite, enquadrando um princípio de liberdade que é o direito à escolha individual.
O que está em causa é um Estado e uma Lei que, dentro da ética, possa proteger a decisão das pessoas que não querem viver em sofrimento extremo e daqueles que as ajudam a pôr um fim definitivo a esse sofrimento.
Quanto à possibilidade de referendo, o movimento a que assistimos não é mais do que uma estratégia oportunista para tentar parar este processo. Os direitos fundamentais não se referendam.
Dia 20 votarei a favor da alteração legal sobre a morte assistida, porque a vida e a morte, o sofrimento e o desespero, são circunstâncias que a cada pessoa dizem respeito quando em consciência é confrontada com a situação, também voto a favor do fim da criminalização dos profissionais de saúde que acompanham e ajudam essas pessoas a por fim ao sofrimento e a morrer com dignidade.