Depois de 13 horas a voar no percurso Lisboa-Maputo-Pemba e de menos de meia hora de sono, chegámos enfim ao nosso destino, à capital da província de Cabo Delgado e um dos locais onde a Helpo está estabelecida. Do lado de lá do tapete das bagagens esperava-nos Carlos Almeida, o coordenador nacional da ONG em Moçambique e o nosso homem no terreno. Quem também nos recebeu calorosamente foi a humidade implacável.
Na casa da Helpo, a cozinheira e faz-tudo Maria Clara ultimava os preparativos para o almoço. Depois da bela refeição fomos de pickup até sua casa, para conhecer os seus filhos, crianças apadrinhadas pela Helpo.
Maria Clara foi a mais nova de cinco irmãs e a única que não engravidou. Uma das irmãs morreu e Maria passou a tomar conta dos nove filhos deixados para trás. Depois perdeu uma sobrinha e ganhou mais quatro filhos a seu cargo. Outros dois órfãos, de uma segunda sobrinha, parecem estar igualmente a caminho da vida desta cozinheira de mão e casa cheia.
Sentada no pátio de sua casa, Maria Clara usa a expressão “reboquei os filhos” para falar das várias vagas de heranças de crianças. Sobrinhos, netos ou filhos, o parentesco vai mudando nas conversas, as idades também são voláteis, mas apesar da confusão, ninguém é esquecido na hora do mata-bicho, da papa, do arroz e da chima (farinha de milho).
Dizem-nos que Maria Jonito é uma das crianças mais velhas, está deitada numa cama, com um ar cansado, provavelmente devido à malária que voltou a contrair. Os restantes irmãos, Nelson Momade, Edmilson mais velho, Telvino António, Vasco, António, Edmilson mais novo, Lúcio, Maria Esperança e Marta, seguem, ora as ordens de Maria ora as sugestões de Carlos.
Fazemos perguntas sobre sonhos de profissões futuras e tiramos retratos, mas há muita vergonha nas respostas. Marta não nos empresta sorrisos, nem com a ajuda de Carlos, que vai repetindo “sorri” na língua macua. Othieke! Clic! Othieke! Clic! Othieke! Clic! Clic! Clic! O Edmilson mais novo é o oposto, quando não está a soprar no seu apito de árbitro, está a espalhar alegria e poses de peito cheio.
A sua mãe, que ainda há pouco tempo era uma das crianças, diz que ele está sempre pronto para ir à escola, até ao domingo.
Foi assim o primeiro dia na estrada dos Futuros Presidentes.