<#comment comment=”[if gte mso 9]> Normal 0 21 false false false PT X-NONE X-NONE MicrosoftInternetExplorer4
Novo aumento de impostos é a ameaça que Passos Coelho deixa no ar para o caso de o Tribunal Constitucional chumbar as medidas do Orçamento de Estado de 2014 submetidas a fiscalização sucessiva e que estão ainda à espera de decisão – cortes salariais na função pública e empresas públicas, nos subsídios de doença e de desemprego, em pensões de sobrevivência. Ou se acontecer o mesmo às medidas do retificativo que o TC irá também apreciar – alargamento da Contribuição Extraordinária de Solidariedade às pensões acima dos mil euros, em vez de apenas acima dos 1 350 euros. O problema não são a “ameaça”, as “pressões”. Os juízes do TC já deram provas de que não são permeáveis a recados do primeiro-ministro. O problema é que a solução alternativa pode mesmo ser aquela, a de novos aumentos de impostos, como já o foi de outras vezes.
Esta nova ameaça surge, recorde-se, poucos dias depois de o Governo ter apresentado o documento de estratégia orçamental para o período 2015-2018, que estabelece um novo aumento da taxa normal do IVA (mais 0,25 pontos percentuais, para 23,25%) e da taxa social única paga pelos trabalhadores, de 11% para 11,2%, dos impostos sobre tabaco, doces e salgados, de outros impostos ainda por definir e, eventualmente, também da taxas sobre os produtos farmacêuticos.
Os permanentes ganhos de eficácia do fisco associados ao sucessivo aumento (de lei) dos impostos tem-se traduzido num significativo crescimento da carga fiscal efetiva suportada pelos portugueses. Um facto que se junta à degradação contínua de salários dos trabalhadores “antigos”, a uma política de salários impensável, a níveis de terceiro mundo, para os trabalhadores “novos”, a um desemprego com níveis inaceitáveis nas franjas mais idosas e mais jovens da população ativa, e, por fim, ao surgimento de um novo e alarmante fenómeno, o dos novos pobres, o dos desempregados cujo subsídio de desemprego chegou ao fim. O resultado de tudo isto é o estrangulamento da economia: as empresas, que passam o fardo para os salários dos seus trabalhadores, que, já esmagados pela carga fiscal, matam as empresas ao colocarem um forte travão nos seus padrões “normais” de consumo, levando-as a despedir para não fechar ou a fechar despedindo toda a gente.
Portugal conseguiu a chamada “saída limpa” do processo de assistência financeira internacional que chega agora ao seu termo. Fica o registo de que esta foi a forma escolhida pela Europa e não por Portugal. De que tivemos a sorte – ou o azar, o futuro o dirá – de estarmos a viver um período de afluência anormal de capitais a este lado do mundo, um fluxo que, para além de todos os créditos que o Governo possa reclamar nesta matéria, é a verdadeira justificação para que um país como Portugal, que continua classificado pelas agências de rating como “lixo”, se financie a taxas surpreendentemente baixas. E de que, pesada uma e outra coisa, voltamos aos mercados, sem o suporte de qualquer rede, objetivamente cedo de mais. Ficamos não só nas mãos dos mercados – no sentido em que eles olham para nós de acordo com o que objetivamente valemos -, como também nas mãos da sorte e do azar – dependentes de fatores que nada têm a ver connosco, e que podem fazer com que o dinheiro regresse para onde veio tão facilmente como tem agora chegado.
E é com este cenário, de um Portugal altamente endividado mas “não assistido”, com todas as almofadas esgotadas, com uma carga fiscal suicida e com um desemprego que ninguém pode aceitar que continuaremos a ter de cumprir obrigações muitíssimo exigentes, para não dizer impossíveis, para com credores e parceiros do Euro.
Não há dívida pública que se cumpra sem crescimento económico. E, segundo quem acredita ser possível cumprir, sem que o crescimento económico seja significativo. Mas também não se vê como será possível esse crescimento económico significativo com ainda mais impostos. E com menos despesa, que era por onde se devia ter começado, é agora também cada vez mais difícil. A não ser que estejamos todos disponíveis para aceitar um mergulho de ainda mais gente na zona cinzenta da pobreza e da miséria.
É sempre com preocupação, e também com um espanto que já nem sei por que razão persiste, que vejo a esquerda ignorar os erros que tem cometido ao longo da História, desvalorizando a importância da dimensão económica na definição, financiamento e garantia de sustentabilidade e de futuro das políticas sociais. Uma preocupação e surpresa tão consistentes como as que resultam de a direita insistir num discurso de rigor e austeridade que é cego aos problemas elementares das pessoas, como se os cidadãos tivessem deixado de ser o eixo central, a razão de ser, da política.
A política fiscal – à semelhança de muitos outros instrumentos de governação dos Estados – está cada vez mais impotente perante a crescente integração das economias e da regulação internacional do mundo. Esta é uma verdade indesmentível. Mas, em Portugal, o que temos hoje é uma ausência absoluta de política. Aqui não há, de facto, vida para além do défice. Aqui não há política fiscal. Há, simplesmente, fisco. E, para muita gente, neste Portugal altamente endividado, mas “não assistido”, o que há realmente é um verdadeiro e desumano confisco de um rendimento que já não assegura sequer uma vida minimamente digna.