O chapéu faz o homem era o mote e a assinatura daquele velho alfaiate de chapéus, mestre chapeleiro de Paris que dedicara a vida a fazer chapéus. “O chapéu faz o homem e eu faço chapéus para homem”, costumava resumir, com solicitude, Monsieur Duchamps, quando recebia algum novo cliente na sua chapelaria.
Duchamps era um orgulhoso e requintado chapeleiro, procurado por todas as cabeças bem pensantes da Europa. Mais do que um chapeleiro, era um apaixonado por chapéus, um furioso pesquisador e coleccionador de chapéus, uma autoridade na história da arte chapeleira.
O seu sonho era abrir um museu do chapéu onde pudesse expor a sua colecção que retratava a evolução do chapéu desde a antiguidade. Capacetes das guerras do Peloponeso, de centuriões romanos, até aos chapéus mundanos da alta sociedade oitocentista com a inevitável cartola. A jóia da coroa da sua colecção era o chapéu em forma de coração ou o bonnet cap lace que Maria Stuart usou na cerimónia da sua coroação como rainha dos escoceses.
Infelizmente, antes de poder completar a sua grande história do chapéu, Monsieur Duchamp foi atacado por essa estranha doença profissional que deu aso à conhecida expressão inglesa “mad as a hatter”.
Como recorriam profusamente a químicos (mercúrio) para preservar o brilho das plumas de penas de aves usadas nos chapéus, os chapeleiros ficavam com o sistema nervoso central irremediavelmente afectado e entravam frequentemente em delírios conhecidos como síndrome de Dança de São Vítor (devido aos espasmos e movimentos involuntários, como uma dança, provocados pelo mercúrio).
Foi o caso de Monsieur Duchamps que abjurou os chapéus, passando a vilpendiá-los como símbolo da opressão burguesa: “São meras convenções de merda, símbolos do conformismo do homem”, vociferava enquanto dançava São Vítor.
O pintor dadaísta Max Ernst que não tirava o chapéu a ninguém (até porque não usava), inspirou-se em Duschamps (já para não falar do absinto e de uma gama extensa de opiáceos) para construir a sua colagem “The Hat Makes the Man”.
Foi o movimento dadaísta que pôs fim ao chapéu como emblema de status social, que antes dividia os homens em duas classes – os com chapéu e os sem chapéu.
Apenas as corridas de Ascott, os casamentos reais ingleses e os treinadores do Paços de Ferreira teimam em perpetuar esta grotesca forma de fazer da cabeça um cabide.