Em abril deste ano, o projeto colaborativo para a regeneração da bacia do Rio Mira, Guardiões do Mira, lançou, com apoio da DGArtes e do programa Odemira Criativa, o seu primeiro programa de Residências Artísticas.
De abril a junho e de setembro a novembro de 2024, oito artistas vão refletir sobre o Rio Mira e o território local, em quatro associações da região de Odemira. O JL falou com Leonor Carrilho, uma das curadoras do projeto.
O projeto Guardiões do Mira já existia numa vertente mais educativa. De onde nasce a ideia de associar também um programa de residências artísticas?
Da vontade de incluir a arte na mediação entre a comunidade e aquilo que é o Rio Mira e as suas temáticas. O programa concretiza-se pela primeira vez este ano, mas queremos que continue e que numa das próximas edições haja também residências científicas.
O que se espera que saia das residências?
Muitas vezes as residências artísticas obrigam os artistas a apresentar uma exposição ou deixar uma obra no final. Aqui preferimos não o fazer, lançando apenas o desafio aos artistas de pensarem a estrutura de cuidado, de aproximação e relação da comunidade com o Rio.
Daí a criação de caminhadas quinzenais, ao longo do Rio, gratuitas, abertas ao público e guiadas pelos artistas?
As caminhadas começaram por ser pensadas como momentos em que nos encontrávamos para discutir e partilhar reflexões sobre o que cada artista estaria a viver. Mas acabaram por transformar-se no verdadeiro objeto artístico das Residências. Percebeu-se que é neste encontro de pessoas que se cria de facto alguma coisa absolutamente nova.
Ainda é possível participar em alguma caminhada?
Dia 15 de junho realizamos a 4ª e última caminhada deste período “Primavera”. Vamos percorrer um troço do Rio Mira junto a Vila Nova de Milfontes, guiados pelas propostas da artista Adriana João e das convidadas Mariana Pestana e Fátima Teixeira. No outono haverá mais.
Haverá uma exposição final do projeto?
Sim, em novembro, numa igreja dessacralizada de Odemira. Há de refletir o processo de trabalho dos oito artistas e/ou uma obra que tenham continuado a fazer depois da residência. A meu ver, seria muito interessante que refletisse também a construção feita por cada artista em torno da sua caminhada. Foi neste momento que se gerou alguma coisa mesmo especial, que só aconteceu ali, naquele contexto em Odemira.
Qual a importância deste tipo de projetos?
Este projeto reúne várias componentes que me parecem essenciais na prática artística e na minha prática também como curadora. Pensar a ecologia de um lugar, não só do seu contexto natural, mas da própria ecologia das relações, implicarmos o nosso corpo nesse mesmo lugar, promover momentos coletivos, provocar pensamentos, reações, ou até mesmo novos objetos de mediação e experimentação com o Outro.
Também descentralizar. O país tem várias realidades. É preciso trazer a discussão ao seu lugar de origem, chamar pessoas, convocar agentes, expandir os lugares de fala, quem conta a história. Só assim conseguiremos perceber melhor o que nos rodeia e agir.