É já no próximo dia 16 que se começará a comemorar o centenário do nascimento de José Saramago, com (em parceria com a Rede de Bibliotecas Escolares e com o PNL) a leitura em simultâneo em 100 escolas portuguesas de obras suas – nas do Ensino Básico o seu livro A Maior Flor do Mundo, nas do Ensino Secundário páginas do Memorial do Convento e d’O Ano da Morte de Ricardo Reis. Só uma pequeníssima amostra de um programa extraordinário, que já de 16 a 18 integra o II Colóquio de Estudos Saramaguianos, pelas Universidades Federais do Rio Grande do Norte e Fluminense, e de 10 a 13 de dezembro a VI Conferência Internacional José Saramago da Universidade de Vigo.
As comemorações têm como comissário Carlos Reis, o catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, especialista de Literatura Portuguesa, em particular em (Eça e ) José Saramago, colaborador do JL desde o início, e que foi designadamente diretor da Biblioteca Nacional e reitor da Universidade Aberta. Que nos fala sobre as linhas essenciais do programa.
Jornal de Letras: Qual a ‘ideia’ essencial das comemorações do centenário de José Saramago, a estrutura e organização do programa?
Carlos Reis: Concebemos um programa que contempla quatro eixos de atuação, todos eles muito significativos para valorizarmos o legado de José Saramago: 1) o da biografia, porque continua a ser importante lembrar o trajeto pessoal, cultural e cívico do escritor; 2) o da leitura, em diversos níveis e visando diferentes público, porque a leitura não pode deixar de ser central, na celebração de um grande escritor, ao mesmo tempo que procuramos conquistar novos leitores, sobretudo jovens; 3) o das publicações, contemplando a reedição da obra saramaguiana, pelas suas editoras, em Portugal e no estrangeiro, bem como livros e números de revistas sobre Saramago; 4) o das reuniões académicas, em Portugal e noutros (muitos) países, reforçando a presença do escritor em contexto universitário.
O que quer dizer com leitura, ou leituras, a diversos níveis?
Quando falo de leituras de Saramago, refiro-me a diferentes planos de concretização. Para dar dois exemplos, entre outros possíveis: as chamadas Conferências do Nobel, coordenadas por Alberto Manguel, trarão a Portugal grandes figuras da literatura mundial, que proporão reflexões sobre temas saramaguianos, numa aceção ampla da expressão; noutro plano, as Leituras Centenárias darão voz, em centenas de escolas, a jovens que hão de ler, em simultâneo, textos de Saramago. E haverá também Saramago na biblioteca: nas bibliotecas da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas (destaco aqui, naturalmente, as da Rede José Saramago) e também nas bibliotecas municipais de Lisboa (a chamada rede BLX), que terão um programa próprio, em parceria com a Fundação José Saramago.
Há várias parcerias e contam com diversos apoios.
Sim, como consta do programa (em https://www.josesaramago. org/programacao/programa-do-centenarios-linhas-gerais/), o centenário é celebrado com o apoio de diversas entidades públicas e privadas, em parceria com a Fundação José Saramago. Destaco aqui o alto patrocínio do Presidente da República e o apoio da UNESCO, bem como a participação, entre outros, de organismos dos ministérios da Cultura e da Educação, da Câmara Municipal de Lisboa, do Camões. Instituto da Cooperação e da Língua, da Imprensa Nacional-Casa da Moeda e do Turismo de Portugal. Outras entidades prepararam ou estão a preparar programas autónomos, cabendo destacar o Cabildo de Lanzarote e o governo das Canárias, sendo bem sabido o lugar que a ilha e o arquipélago ocuparam na vida e na geografia afetiva de Saramago. E ainda Azinhaga do Ribatejo, onde o escritor nasceu. A tudo isto junta-se o generoso apoio mecenático da Fundação La Caixa/BPI.
Quer ou pode destacar algumas das iniciativas que constam do programa?
Com respeito por todas, porque todas, à sua maneira, contribuem para esta celebração, realço o significado das Leituras Centenárias, porque é nos leitores jovens e na Escola que tudo começa, em regime de corrente de leitura; num plano mais abrangente, sublinho a diversidade de manifestações artísticas que darão conta da riqueza e da complexidade da obra de Saramago, nas artes visuais, no cinema, na dança, na música, na ópera, no teatro, etc.
Se tivesse de criar um lema para as comemorações do centenário, qual seria?
“Vivo em desassossego, escrevo para desassossegar”, palavras de Saramago. O que assim se afirma é a atitude um escritor que não se acomodou, que viveu a literatura como interpelação do mundo e dos homens. E que foi capaz de provocar instituições e convenções. Estes são desafios que continuam vivos hoje e que assim devem continuar no futuro.