A história de Clotilde e António começa agora. O passado, para estas páginas, resume-se a um casamento e a uma vida cheia do bom e do mau que têm a maior parte das vidas. Vivem num primeiro andar numa das ruas mais longas do Porto, a Avenida Fernão de Magalhães, que liga o Campo 24 de Agosto às Antas. Um dia encontraram Sarah, que lhes apresentou Joana, e por causa delas a história de Clotilde e António recomeça do ponto onde agora se conta. Eles são os protagonistas da mais recente ideia que apresentamos no projeto Todos Queremos um Bairro Melhor, iniciativa da VISÃO e da Comunidade EDP.
“O Quintal está naquela fase em que ainda não dá para ver bem o trabalho que se fez, nas plantas ainda não se revela”, diz Sarah Valente, psicóloga, 33 anos, um mestrado em pedagogia social e o sonho de fazer algo com uma filosofia semelhante à do programa Aconchego: “É um projeto que existe no Porto há bastante tempo. Um idoso que viva sozinho e tenha condições pode albergar um estudante em troca de companhia”, explica, como se naquele exemplo estivesse toda a inspiração para O Quintal, uma ideia que apresentou num concurso de empreendedorismo e que a Junta de Freguesia do Bonfim decidiu ajudar a construir. “Há muitos quintais abandonados na cidade, a maioria em prédios antigos habitados por pessoas idosas. E há também muita gente na cidade a procurar talhões para fazer hortas urbanas.”
O Quintal junta necessidades. Quem tem um pedaço de terra e não consegue (ou não sabe, ou nem quer) cultivar, cede esse espaço em troca de uma pequena quantia a alguém que o cuida. “Há outro aspeto importante em tudo isto”, continua Sarah Valente, lembrando que “muitas das pessoas que têm estes quintais vivem num grande isolamento, e ter alguém que passe a ser uma visita regular é uma benesse, quebra essa solidão.”
O projeto começou a funcionar no final do ano passado, com passos lentos. “É preciso ganhar a confiança das pessoas, visitá-las, perceber as suas vontades e necessidades.” Segundo afirma, está a ser feito um levantamento junto da população da freguesia para a conhecer melhor. São cerca de 20 mil pessoas, com uma grande percentagem de idosos. “Ao fazermos isto, conseguimos perceber muito do que se passa nesta comunidade, tratando os casos que precisam de respostas de forma adequada. Um levantamento, sustenta, que pela sua abrangência “serve muito mais do que o programa O Quintal”.
Clotilde e António aderiram à ideia, receberam Joana, também formada em psicologia. Com 34 anos, desempregada, sempre quis “ser agricultora”. Não sabia d’O Quintal, queria apenas candidatar-se a um talhão comunitário, mas quando viu o quintal de Clotilde e António não hesitou. Teve de haver empatia, acordar regras que servem de base a todos os contratos, que são mediados pela Junta de Freguesia do Bonfim, através de Sarah Valente. “Até agora houve cinco quintais inscritos”, adianta, e a expectativa é que sejam cem até ao final do ano. “E haverá sempre um acompanhamento de cada caso, adaptando-os a cada situação particular.”
Para já, todas as ideias e contribuições são bem-vindas. “É um arranque difícil, mas acreditamos que pode ser exemplar pelo modo como põe em contacto e serve várias experiências e diferentes pessoas. Por isso, agradecem-se todos os apoios”, conclui Sarah Valente.