Está localizada num dos pontos mais elevados de Lagos com uma vista de perder o fôlego sobre o Atlântico, a cereja em cima do bolo de um luxo que envolve toda a casa. Aqui, na Luxmare, todos os pormenores contam – o cuidado jardim na cobertura, a piscina infinita (aquecida) com vista mar que se prolonga por 22 metros, a generosa sala de cinema caseira, as suites com imponentes janelas envidraçadas do chão ao tecto que mantêm em permanência a ligação com o exterior privilegiado, entre muitos outros detalhes.
Uma moradia (propriedade de um casal nórdico) que o jornal britânico Telegraph apelida, num artigo sobre viagens, “de uma das obras-primas do renomado arquiteto português Mário Martins” e que pode ser arrendada por cerca de 6.000 euros por semana.
Mário Martins, arquiteto algarvio já com 30 anos de obras assinadas em todo o País mas com especial incidência na região sul, há muito que trabalha com clientes estrangeiros que se apaixonaram por Portugal e que aqui quiseram criar uma primeira ou uma segunda habitação, que por vezes rentabilizam quando estão nos seus países de origem como acontece com o projeto Luxmare. Uma localização única e um projeto singular de arquitetura são, pois, ingredientes de sucesso para conceber uma casa de alto luxo que não precisa, porém, de custar milhões, afiança o arquiteto, mas que uma vez concluída pode, de facto, ser rentabilizada ao máximo.
Este tipo de clientes, conta Mário Martins, “habituados a um grande rigor nas suas atividades profissionais, esperam também de um projeto arquitetónico aquilo que esperam de um seguro, isto é, que tudo esteja devidamente articulado desde o projeto de execução até ao lançamento da obra, tudo bem definido e sem surpresas desagradáveis”.
Afirmando não ter “preconceitos na arquitetura” durante o processo de conceção do projeto, Mário Martins defende uma abordagem participativa junto do cliente para que, em conjunto, consigam construir a casa desejada. “Um projeto é determinado por um conjunto de factores muitos deles naturais como a topografia, o solo, ou as vistas (a parte física do projeto) mas depois há uma parte que é emocional. E essa parte é desenhada com o cliente. Não gosto da definição do arquiteto-estrela, da lógica ‘eu desenho e os clientes ficam deliciados a verem-me trabalhar’. Prefiro antes projetos participativos, com os clientes a trazerem-me os seus desenhos e sugestões. Tem que existir esse filtro de ideias”, sublinha.
E nem sempre são precisos milhões para se construir casas de capas de revista, afiança. “É possível fazer casas fantásticas com valor de construção abaixo de um milhão de euros. Para que não exista o estigma de que uma casa fantástica é inatingível, não é. Até porque o fantástico é uma coisa muito vaga”, reforça ainda Mário Martins.
Casa de sonho a menos de 900€/m2
A norte, Fernando Coelho, da FCC Arquitectura, ateliê com sede em Felgueiras, partilha a mesma opinião. Com clientes maioritariamente nacionais do segmento médio alto, o arquiteto sublinha que o segredo para uma casa de sonho não está na ostentação mas antes na materialização de necessidades habitacionais muito específicas que acabam por tornar o espaço especial para aquela família.
“As famílias têm necessidades diferentes e aquelas que já passaram por várias habitações vão percebendo aquilo que realmente lhes faz falta. Às vezes a ideia de que estas casas construídas de raíz tem muito espaço que não serve para nada, não é verdade, as famílias usam-nos. É também errada a ideia que às vezes se tem de que estas casas acarretam custos elevadíssimos. Pelo menos os meus clientes são muito exigentes, bem informados e preocupam-se em ter casas que não venham a necessitar de grandes manutenções no futuro e que sejam eficientes a nível térmico, por exemplo, com grande poupança de custos mensais”, diz Fernando Coelho.
Uma exigência que se reflete também nos orçamentos. “Os orçamentos, às vezes, são decididos ao cêntimo. Há quem olhe para estas casas e ache que estamos a falar de casas de muitos milhões mas não é o caso. Estamos a falar de casas que pelo sítio onde elas estão localizadas, pela pré-existência, já tem um valor significativo, mas depois a obra tem custos controlados. Estamos a falar de moradias que hoje em dia apresentam preços de construção na média de 1 100, 1 300 euros e algumas até a 900 euros o m2. Preços incríveis que se conseguem atingir porque é tudo muito planeado”, reforça o responsável do ateliê FCC, acrescentando que por essa razão há muitas habitações com grandes áreas e acabamentos de luxo cujo valor total está longe de exceder os 500 mil euros.
Um investimento que muitos fazem também para casas de segunda habitação. Segundo Fernando Coelho, nos tempos mais recentes há cada vez mais a tendência para recuperar as casas de família, fora das grandes cidades, um movimento que se consolidou com a pandemia.
“Os portugueses tentam ter o seu canto fora do local de trabalho, fora da sua cidade, e às vezes conseguem recuperar as suas casas de infância onde criam condições de convívio para toda a família”, diz, lembrando que “a subida descontrolada de preços das casas em Lisboa e no Porto” levou a esta situação. “Nestas cidades ter uma casa com jardim, com área de vivência exterior não está ao alcance da maioria e por isso as pessoas acabam por se refugiar nas suas antigas aldeias para criarem um espaço onde tenham mais qualidade de vida, em que não estejam dentro de caixas e tenham antes espaço para estar com os amigos e familiares”.
Esta necessidade de convívio de qualidade com a família, potenciado ainda mais com a pandemia, está também na origem de um pedido que hoje é frequente nas encomendas que recebe: “Para os meus clientes é muito importante a relação entre o interior e o exterior da casa. As pessoas pedem-me um espaço abrigado no exterior que lhes permita almoçar ou jantar cá fora durante quase todo o ano. Quase como uma sala exterior que lhes permita maximizar a relação com o jardim, com a paisagem, com a zona da piscina”, exemplifica Fernando Coelho.
Orçamentos controlados que valem milhões
Premissas que estão também presentes no mais recente projeto de João Tiago Aguiar, com ateliê no centro da capital mas com projetos em todo o país. No Restelo, em Lisboa, o arquiteto recuperou uma antiga casa sem graça dos anos 50 do século passado e transformou-a numa habitação contemporânea, com um cunho muito próprio, apesar do orçamento a custos controlados. A obra terminou já em plena pandemia e foi entretanto uma das nomeadas para os prémios “Obra do Ano 2021” do conceituado site internacional de Arquitectura ArchDaily.
Aqui, até a tonalidade dos azulejos artesanais tridimensionais usados na fachada foi testada até ao pormenor para se consegiuir exatamente o mesmo verde da vegetação dominante no jardim.
“O objetivo era ‘afinar’ o verde que permitisse dissimular a habitação”, explica João Tiago Aguiar, para exemplificar o grau de detalhe a que por vezes se chega para criar peças arquitetónicas singulares que vão ao encontro do desejo dos clientes.
A proprietária, portuguesa, adquiriu o imóvel para investimento e em menos de duas semanas, logo após o confinamento, viu a habitação ser disputada por dois clientes (também nacionais), qualquer um deles disposto a desembolsar mais de quatro milhões de euros pela moradia localizada num dos bairros mais exclusivos de Lisboa.
A casa moldou-se bem às atuais exigências do mercado. Além do jardim e da piscina, “tem uma zona independente para uma empregada doméstica interna, todos os quartos foram feitos em suite e com muita arrumação para a roupa, algo que hoje é fundamental para os nossos clientes. Está também equipada com domótica, outro pedido habitual porque neste segmento já não se passa sem esta comodidade onde se pode controlar tudo por telemóvel. A pessoa está a sair do emprego e já vai dando ‘ordens’ à distância para que a casa esteja mais fresca ou mais quente quando chegar a casa”, exemplifica o arquiteto.
Nas novas tendências das moradias de luxo, dois espaços estão a conquistar um destaque crescente, aponta ainda João Tiago Aguiar: o hall de entrada da habitação está a ganhar escala, “uma certa monumentalidade que dignifica logo a casa” ou não fosse esta a primeira imagem que se tem assim que se transpõe a porta de entrada. E neste mundo dos mais afortunados, também as garagens estão a ser ganhar estatuto para acolher viaturas que são, muitas vezes, valiosas peças de coleção dos donos da habitação e que valem muitos milhares de euros.
Neste projeto do Restelo – batizado de Casa AD25 – , por exemplo, a garagem recebeu um tratamento especial, com o tecto todo iluminado e leds no pavimento. “Os clientes quiseram fazer uma espécie de garagem-monumento onde o carro estivesse exposto como num museu”, explica o arquiteto.
O arquiteto do Triângulo Dourado
Peculiaridades do mercado imobiiário de luxo que está longe de estar afetado pela pandemia. Bem pelo contrário, assegura, por seu turno, Vasco Vieira. O arquiteto fundador do ateliê Arqui + sabe bem do que fala. Com projetos em todo o país e em vários pontos do mundo, da Rússia ao Dubai, de Miami a Madrid, é na zona mais cara de Portugal que tem desenvolvido a maior parte dos seus projetos – no selecto triângulo Dourado algarvio.
Só entre a Quinta do Lago, o Vale do Lobo e Vilamoura, Vasco Vieira soma já cerca de 100 moradias construídas com a sua assinatura com valor a variar entre os 3,5 e os 10 milhões.
“A maioria dos meus clientes (diria cerca de 80%) são estrangeiros, com predominância para o mercado inglês e irlandês. Temos projetos em condomínio e para moradias isoladas mas devido à pandemia é esta última opção que as pessoas mais procuram, com as soluções habituais de piscinas interiores, SPAs e ginásios”, especifica Vasco Vieira.
Para este mercado de luxo, a pandemia revelou-se uma oportunidade. A necessidade de confinamento num local como o Algarve, com Sol, praias a perder de vistas e onde o número de infeções está, apesar de tudo, bem mais controlado que em outros destinos concorrenciais, tem estimulado a procura deste tipo de produto, realça Vasco Vieira.
Para a esmagadora maioria da clientela do arquiteteto, o teletrabalho já não era uma novidade mas o confinamento veio consolidar essa forma de estar a nível profissional. “Muitos dos nossos clientes trabalham na Bolsa ou na Banca, mas a maior parte são donos de empresas próprias e têm uma certa liberdade de movimentos, sempre se ajustaram ao conceito de teletrabalho. E agora mais ainda. As pessoas perceberam que não é preciso estarem presentes fisicamente nos locais e que podem ter reuniões online, por isso podem passar mais tempo cá onde o clima é melhor. E o que já está a acontecer é que muitas casas de férias estão a passar a residências permanentes”, rematou ainda Vasco Vieira.