Um smartphone pode dizer-lhe quantas calorias gastou, se mantém o ritmo desejável de exercício físico ou se está em risco de queda, medindo as assimetrias durante a passada. E dezenas de idosos em Portugal já estão a usar a aplicação, desenvolvida para Portugal com o apoio do Health Cluster Portugal. Para uma população cada vez mais envelhecida, os telefones e os tablets estão a tornar-se numa ferramenta fundamental de companhia e vigilância da medicação. Num mundo que se prevê venha a estar cada vez mais cheio de doentes crónicos, em que apenas metade deles cumpre a medicação à risca, os lembretes podem vir na forma de um alarme. Mas este é apenas o princípio. A interação homem-máquina fará parte da medicina do dia a dia, sem no entanto esquecer a indispensável presença do médico, que escuta e prescreve. Cirurgias comandadas à distância, e feitas por robôs, com maior precisão e menores perdas de sangue; impressoras 3D que fabricam órgãos à medida do paciente, usando células vivas para construir um fígado ou um coração – uma ciência que já começa a dar resultados em laboratórios espalhados pelo mundo e que assenta na extração e armazenamento de células estaminais, que podem ser colhidas na pele ou no sangue, multiplicadas em laboratório, e condicionadas a diferenciarem-se em tecidos da córnea ou do rim.
Ainda no capítulo homem-máquina, espera-se que os exosqueletos – corpos robóticos – ajudem a devolver o movimento a pessoas parcialmente paralisadas, aumentando o controlo motor e recriando a sensação natural, permitindo a comunicação entre a prótese e o cérebro, através de circuitos integrados. Os mesmos circuitos que poderão melhorar a memória e o raciocínio, aumentando a capacidade cerebral, ou combatendo as inevitáveis degenerescências associadas à idade. Estas experiências que já têm sido feitas em animais, também estão na base das novas abordagens a patologias como o stresse pós-traumático, em que é possível eliminar para sempre uma má recordação.
O guardião do genoma
Combater o cancro será também possível através de uma medicina personalizada que, pela análise do código genético da cada um, e das características moleculares dos tumores, permite desenhar terapêuticas à medida de cada um, reduzindo os efeitos secundários e melhorando a eficácia dos tratamentos. Dependendo das alterações detetadas em cada cancro, assim se define o armamento utilizado. São cada vez mais apertadas as indicações que acompanham os novos medicamentos, como se cada caso se tratasse no fundo de uma doença rara – com um tratamento específico e único. Muito à conta disto (e de um diagnóstico cada vez mais precoce), o National Cancer Institute prevê para 2019 uma sobrevivência de 100% para os casos de cancro da mama, em 2024 no caso dos linfomas. Já os malogrados cancro do pulmão, dos ovários ou do pâncreas só serão solucionados lá para o final do próximo século…
Uma das vias mais promissoras está relacionada com a manipulação do P53, um supressor tumoral cuja atividade está comprometida em praticamente todos os tumores e que tem sido apelidado de “o guardião do genoma”.
Mas há receitas que valem sempre, como as vacinas. E os próximos tempos serão profícuos em novidades, como a já anunciada vacina contra o HIV. Num artigo publicado na revista Nature da semana passada, cientistas apresentaram uma forma de impedir que o vírus infete as células, numa estratégia que mistura o conceito tradicional de vacina com a terapia genética. Testada em primatas, teve taxas de sucesso de 100 por cento e deverá começar a ser ensaiada em humanos já no próximo ano. E o que há trinta anos parecia impossível, está à beira de acontecer. Bem-vindo ao admirável mundo da ciência!
Cérebro – Ativar o sistema de proteção
Viver muito só tem valor se o cérebro acompanhar a saúde do corpo. E se é verdade que o “mestre” começa a envelhecer por volta dos 25 anos, também é certo que há várias estratégias de combate em estudo. ?A mais recente aproveita o próprio sistema de proteção incorporado no cérebro, estimulado através de um fator de crescimento, conhecido como PDGF. Num estudo coordenado pelo Instituto Karolinska e pela Universidade de Lund, na Suécia, foi possível melhorar a função motora e restabelecer os níveis de dopamina no cérebro de pacientes com Parkinson. Implantar memórias falsas ?- que tanto podem servir para atenuar os sintomas de Alzheimer como para ir à Polinésia Francesa sem sair do consultório do médico – será uma realidade já este século. Mas enquanto isso não chega, invista uns minutos do seu dia a meditar. É que está provado que a meditação consistente, ao longo de vários anos, diminui a perda de volume cerebral associada à idade.
Ouvidos – Combate à surdez
Experiências com células estaminais mostraram que é possível regenerar as células sensoriais do ouvido interno, devolvendo a audição em ratinhos surdos. Se tudo correr como o previsto, dentro de dez anos será possível tratar praticamente todos os casos de surdez.
Dentes – Verdadeiros e de laboratório
Por melhores que sejam os implantes, nunca são como um dente vivo, com sensibilidade. Desde as primeiras investigações com células estaminais, que os cientistas procuram criar dentes de laboratório, feitos a partir do material do próprio paciente – extraído da pele, por exemplo. Combinando células estaminais, uma matriz e a mistura certa de moléculas sinalizadoras será possível fabricar um dente verdadeiro em apenas dois meses.
Olhos – Telescópio incorporado
Haverá mais de 280 milhões de pessoas em todo o mundo com perda de visão devido à degenerescência macular – um problema associado à idade e que se torna na principal causa de cegueira em pessoas com mais de 55 anos e não tem cura. Mas cientistas da Universidade de Lausanne podem ter encontrado uma solução: lentes de contacto com zoom incluído. Uma espécie de telescópio, de 1,55 mm, ligados a uns óculos especiais que convertem a luz em impulsos elétricos, transmitidos ao cérebro. Os testes em animais têm sido animadores, com uma recuperação de cerca de 50%. Os cientistas esperam começar os testes em humanos já no próximo ano.
Amígdalas – Vírus que matam bactérias
O (mau) uso e abuso de antibióticos deixou a humanidade com um grave problema, 60 anos depois do aparecimento desta maravilha da ciência: as bactérias resistentes. A solução para o problema pode vir agora dos vírus. Exatamente. De um tipo particular que tem uma clara preferência, comer bactérias. Os fagos, assim se chamam, estão na base da terapia bacteriofágica, infetam e matam as bactérias, provocando um mínimo de efeitos secundários. Outra boa notícia é que os fagos estão disponíveis na água do mar. À espera de serem pescados.
Coração – De laboratório
Há os transplantes, mas com uma população cada vez mais envelhecida, a probabilidade de encontrar um dador para toda a gente que precisa de um novo coração é cada vez menor. Atualmente, morrem todos os anos 15 milhões de pessoas por problemas cardíacos. A solução pode vir das promissoras células estaminais que têm a capacidade de se transformar em todos os tecidos do corpo. A ideia é colher células do paciente – da pele ou do sangue – transformá-las em células estaminais, num processo de reversão celular, e condicionar a sua diferenciação em células cardíacas. No final, espera-se que surja um órgão funcional e sem qualquer problema de rejeição, já que será feito a partir das células do próprio doente. Os mais otimistas apontam para 2020 como a data em que sairá do laboratório um coração a bombar.
Artérias – Robôs canalizadores
Não adianta ter um coração novo em folha, se a canalização, ou as artérias que o irrigam, estiverem revestidas de placas de colesterol, gordura e cálcio. Já há, por isso, quem esteja a trabalhar em nanodrones. Drones microscópicos – mil vezes mais pequenos que a espessura de um cabelo – que circulam por entre as vias sanguíneas, para reparar as secções danificadas. ?’A bordo’, os drones biológicos levam um medicamento, específico para o combate à inflamação, e que se for tomado de outra forma não faz efeito. ?Já houve testes em ratinhos, com resultados promissores.
Fígado – O fim da malária
O ciclo de vida do parasita da malária passa por várias fases de infeção. Mas a sua passagem pelo fígado é crucial para a sua propagação. Daí que boa parte das vacinas em desenvolvimento tenha como alvo a prevenção da fase hepática. Uma das mais avançadas é a RTS, S, que mostrou ter uma eficácia de 46%, quando combinada com a utilização de redes mosquiteiras. Ainda não se trata da erradicação da malária ?- como pretende o milionário e filantropo Bill Gates -, mas certamente fará a diferença em África, onde vive a maior parte dos 207 milhões de infetados. Atualmente, há cerca de vinte vacinas em testes, em diferentes abordagens. Ninguém se arrisca a fazer previsões, mas é certo que a eliminação da doença terá de passar pela combinação de uma vacina (ou várias), com a utilização de inseticidas e redes mosquiteiras e ainda de medicamentos.
Intestino – Com a ajuda do ‘Da Vinci’
A mão humana não chega a todo o lado. Mesmo a do cirurgião mais treinado. Daí que o robô Da Vinci se apresenta como um complemento valioso, que permite maior precisão. Depois de ter conquistado um lugar de destaque nas cirurgias de próstata, já começa a ser testado noutras áreas, como a cirurgia oncológica ao intestino. O hospital londrino Royal Marsden tem sido pioneiro nesta técnica, que promete menores perdas de sangue e mais rigor no corte.
Joelho – Impressão de menisco a 3D
Marca o fim de muitas carreiras no futebol e é um dos primeiros sinais de que o corpo humano não foi feito para durar tanto: os problemas no menisco. Depois das tentativas falhadas de criar uma nova articulação do joelho a partir de células estaminais, cientistas do Columbia Medical Center desenharam uma aproximação diferente ao problema. Criaram um menisco numa impressora 3D, usando material biodegradável como matriz. Depois transplantaram-no juntamente com proteínas que são fatores de crescimento celular. Já dentro do corpo, as proteínas que promovem a regeneração celular levaram à formação de menisco verdadeiro, que refez a articulação por completo. Os testes foram para já feitos em onze ovelhas. Mas os cientistas já estão a pensar fazer o mesmo em pessoas. Pena já não vir a tempo do mal-afortunado Mantorras.