Fazer parte da indústria tecnológica num mercado em crescimento como Portugal é cada vez mais um benefício. Como consultora de recrutamento de perfis de IT&Digital na Robert Walters, consultora de recrutamento e seleção especializada para postos intermédios e diretivos, enfrento diariamente o desafio da escassez de talento numa área com elevada procura de candidatos, onde a especialização em linguagens ou programas específicos é essencial, e os profissionais têm muita oferta por onde escolher. Sendo as posições de IT as mais difíceis de recrutar, é ainda mais gratificante colocar os candidatos numa função e empresa de que gostem.
Especialmente em funções de nicho, a dificuldade é grande devido à elevada procura, como é o caso de Senior Software Architects, funções relacionadas com Security, Outsystems developers, Data Scientists, Product leads, entre outras. A oferta é imensamente menor que a procura, e a maioria dos candidatos de IT são passivos no que diz respeito à procura de emprego, pois a maioria tem um contrato sem termo (cerca de 90%). Além disso, a sua escassez faz com que possam exigir salários bastante acima da média portuguesa, criando uma dificuldade acrescida às empresas que necessitam do seu talento em Portugal.
De entre as razões que ajudam a explicar o porquê de Portugal se estar a transformar cada vez mais num IT hub europeu com uma enorme procura de candidatos, podemos incluir os vários anos de Web Summit em Lisboa, que reúne milhares de empresários, investidores e especialistas em no país, favorecendo a criação de novas oportunidades; iniciativas governamentais como o ‘Tech Visa’, que ajudou startups a estabelecer um novo centro tecnológico no país; o número recorde de empresas estrangeiras que usam Portugal para criar as suas plataformas digitais, já que a qualidade e o custo dos serviços de tecnologia continuam a atrair talento para projetos específicos; o baixo custo de vida em Portugal versus outros países da Europa Central desempenha também um papel importante, que permite oferecer salários mais baixos do que outros países, embora mais elevados que a média do país; o custo de estabelecer um escritório em Lisboa, mesmo após o aumento dos preços dos imóveis, ainda oferece um bom retorno do investimento face a cidades como Amsterdão, Berlim, Estocolmo ou Londres; finalmente, vários profissionais estrangeiros têm-se mudado para Portugal para trabalhar como freelancers, aumentando o talento estrangeiro disponível no país, ainda que não o suficiente.
Além de tudo isto, existem muitas outras razões que fazem de Portugal um destino apelativo para empresas tecnológicas internacionais e para profissionais da área, como os níveis elevados de formação, domínio de línguas estrangeiras ou facilidade de adaptação cultural e resiliência dos portugueses.
Estamos assim perante um cenário desafiante a vários níveis: empresas de diferentes setores, origem e dimensão em Portugal procuram constantemente perfis de IT para diversas funções, estando as suas necessidades em mudança constante paralelamente à evolução tecnológica. Se hoje necessitam de pessoas especializadas em Python ou Java, ontem era PHP ou C#, e amanhã será outra coisa. Claro que os profissionais de todas áreas e setores profissionais têm de se manter atualizados e a evolução tecnológica é geral, mas nenhuma outra área evolui tão depressa como IT, ficando muito mais difícil para os profissionais se manterem realmente atualizados. Ora, tal cria um problema suplementar à falta de talento que já existe a nível global. Neste momento, por não haver candidatos suficientes no mercado para responder à necessidade de contratação, pois nem as universidades ou outros agentes formadores como bootcamps estão a conseguir formar profissionais suficientes para a procura que temos atualmente, as empresas ou não conseguem contratar os profissionais, ou tentam dentro do possível criar programas de formação interna para os seus colaboradores aprenderem as skills e ferramentas necessárias para o desenvolvimento do negócio.
O facto de ter trabalhado como recrutadora de RH para uma startup antes de me tornar recrutadora de IT para Robert Walters ajudou-me realmente a entender a dificuldade que a maioria das empresas de tecnologia e não só estão a enfrentar para encontrar o talento certo, mas, acima de tudo, para saber falar a mesma “língua” destes candidatos, que é chave para chamar a sua atenção e manter o seu interesse.
A maioria das startups e empresas em geral simplesmente não têm as ferramentas certas ou o tempo para procurar os candidatos adequados, pois, ao contrário do que acontece com outros setores, os candidatos não estão disponíveis com facilidade no mercado e, quando estão, é muito provável que já se encontrem a trabalhar noutra empresa com um bom pacote salarial e benefícios competitivos. Assim, externalizar a procura e seleção de candidatos de IT em empresas de recrutamento especializado é das melhores soluções para garantir a contratação do talento específico de que necessitam.
Outra solução é contratar diretamente os perfis júnior das universidades, como a Nova IMS, e continuar a sua formação internamente para alcançar os conjuntos de habilidades desejados. As empresas, principalmente startups, estão cada vez mais abertas ao público como forma de atração de talento, realizando hackathons internas e externas e abrindo as suas instalações e cultura a potenciais candidatos que, ao verem como é trabalhar naquela empresa, podem ficar mais interessados. É uma excelente estratégia de employer branding num mercado mais competitivo que os outros.
Algumas organizações e comunidades de formação tecnológica em Portugal, desde o Le Wagon, shecodes e Women in Tech (estas duas para incentivar as mulheres a mudarem para carreiras em tecnologia), Lisbon Data Science Academy ou Springboard são também boas fontes de talento especializado, para além de incentivarem pessoas de outras formações a especializarem-se em IT, logo, aumentando a oferta de talento disponível.
Por outro lado, temos assistido a uma crescente contratação para trabalho remoto e por contrato a termo, embora os portugueses sejam culturalmente tradicionais e prefiram a presença da pessoa no local de trabalho, pelo menos na maioria dos dias. A possibilidade de trabalho remoto um ou dois dias por semana é aliás um dos benefícios mais requisitados pelos profissionais de IT, assim como a flexibilidade horária.
Em conclusão, embora estes motivos reflitam apenas uma visão geral do que está a acontecer no mercado português atualmente, é muito estimulante ver formas cada vez mais inovadoras das empresas procurarem contratar e envolver os profissionais de IT. A capacidade de adaptação à mudança constante é provavelmente o elemento que melhor define o mercado tecnológico atualmente.