Se algum dia quiser fazer amizade com uma cabra, sorria. A probabilidade de ser bem-sucedido e não sair com alguma lesão de tal encontro tenderá a aumentar se o humano sorrir ou, pelo menos, não aparentar um rosto agressivo, revela um estudo que envolveu investigadores da Universidade de São Paulo e da Universidade de Queen Mary, em Londres, e ainda 20 cabras.
Num artigo publicado na revista Royal Society Open Science, os investigadores brasileiros e britânicos dão a conhecer os resultados apurados durante as experiências realizadas no denominado Santuário de Buttercups, que recolhe caprinos abandonados ou mal tratados a cerca de 70 quilómetros de Londres.
Durante essas experiências, as reações das cabras foram analisadas perante os rostos dos investigadores ou dos voluntários que se encontravam no local, e também em frente a imagens de pessoas que expressavam diferentes humores. E foi durante essa análise continuada das reações às fotos, que os investigadores chegaram à conclusão de que, provavelmente, os caprinos preferem pessoas com rostos bem dispostos.
A conclusão não será propriamente uma surpresa para quem se habituou a lidar com humanos, mas permite juntar mais um dado à tese desenvolvida nos últimos tempos que revela que a inteligência das cabras e dos bodes tem sido subestimada.
Nos ensaios levados a cabo no Santuário de Buttercups, cada cabra era confrontada com duas imagens da mesma pessoa. Uma das imagens aparentava a pessoa com um rosto de poucos amigos ao lado de uma imagem dessa pessoa a sorrir. Cada ensaio foi efetuado com duas semanas de permeio, para evitar repetições relacionadas com a memória. Também houve especiais precauções para largar cada caprino de um local equidistante face às duas imagens, e além disso, foram usadas fotos de homens e mulheres, que seguramente terão eliminado qualquer tipo de sexismo entre os animais que participaram na experiência.
No final, os investigadores apuraram uma clara tendência das cabras para interagir com as imagens que mostravam rostos bem-dispostos, em detrimento das imagens que com rostos menos animadores. Também foi registada uma ligeira tendência para as cabras preferirem interagir com as imagens bem-dispostas que se encontravam à direita. Esta preferência pelas imagens do lado direito é apontada como um potencial resultado do processamento de emoções positivas e negativas nos dois hemisférios dos cérebros caprinos.
«Este estudo traz a primeira evidência da presença de uma habilidade cognitiva bastante complexa em cabras, sendo importante, portanto, que mais estudos sejam conduzidos, com amostras diferentes em condições diferentes, para reforçar os achados», refere, em comunicado, Carine Savalli, uma das investigadoras da Universidade de São Paulo que participaram no projeto.
A equipa anglo-brasileira acredita que a preferência pelos rostos bem-dispostos possa estar relacionada com o “histórico” da domesticação das cabras. Alguns estudos já haviam detetado que os cães e os cavalos também reagem em consonância com os humores dos humanos – mas esses animais costumam estabelecer relações bem mais próximas com homens e mulheres. Nas cabras, a questão permanece em aberto: será que os caprinos passaram a distinguir humores devido à convicência histórica com os humanos, ou será que a capacidade de distinguir humores dos humanos não é um exclusivo dos animais domésticos? Só os próximos capítulos desta investigação o dirão.
Pode ver algumas das experiências levadas a cabo no Santuário de Buttercups no vídeo produzido pela Universidade de Queen Mary, em Londres.