Diz-se que a dificuldade aguça o engenho e se recorrer a provérbios populares para transmitir uma ideia é um recurso jornalístico pobre, o mesmo não se pode dizer da estratégia de sobrevivência das plantas. Por estarem agarradas à terra e por isso algo limitadas, estes seres vivos desenvolveram ao longo da sua história múltiplas e sofisticadas soluções para se conseguirem alimentar reproduzir e defender das ameaças.
Neste último capítulo, tem havido descobertas recentes que evidenciam uma tática complexa, de trabalho em equipa. Há já várias décadas que os cientistas sabem que as plantas emitem sinais de perigo e avisam as plantas vizinhas sempre que são ameaçadas. Em 2019, uma equipa de cientistas canadianos conseguiu caracterizar estes sinais, descrevendo-os como compostos orgânicos voláteis, malcheirosos, que representam uma linguagem universal, sendo entendidos como alerta, além de servirem de repelente contra animais herbívoros.
Agora, uma equipa de cientistas japoneses conseguiu esclarecer de que forma é que as plantas recebem e respondem a estes alarmes, conseguindo inclusivamente registar esta reação em vídeo.
Neste estudo, Yuri Aratani e Takuya Uemura, biólogos moleculares da Universidade de Saitama, no Japão, construíram uma espécie de bomba para transferir compostos emitidos por plantas feridas e infestadas de insetos para os seus vizinhos não danificados, e montaram um microscópio de fluorescência para observar o que aconteceu, descreve-se no Sciencealert. Previamente, as plantas estudadas – a Arabidopsis thaliana, uma planta muito estudada pelos cientistas, e a planta do tomate – tinha sido geneticamente modificadas para se tornarem fluorescentes e assim serem visíveis as reações.
No vídeo vê-se as plantas não danificadas a receberam as mensagens das suas vizinhas feridas, de forma bem clara, respondendo em sinais bioelétricos, no caso, iões de cálcio, que ondularam pelas folhas estendidas. Os iões de cálcio são gerados numa parte da planta denominada estomas, um minuto após a planta ter tido contacto com os compostos voláteis sinalizadores de perigo.
“Finalmente desvendámos a intrincada história de quando, onde e como as plantas respondem às ‘mensagens de alerta’ transmitidas pelo ar dos seus vizinhos ameaçados”, disse ao Sciencealert Masatsugu Toyota, biólogo molecular da Universidade de Saitama, no Japão, e principal auto do estudo publicado na revista Nature Communications. “Esta rede de comunicação etérea, escondida da nossa visão, desempenha um papel fundamental na proteção oportuna das plantas vizinhas contra ameaças iminentes”, resumiu.
Paulo Rocha, investigador da Universidade de Coimbra, também estuda um tipo de comunicação com base em iões de cálcio, que ocorre entre organismos microscópicos e unicelulares, as microalgas. Apesar de não se tratar de plantas, também realizam fotossíntese e são capazes de comunicar e enviar sinais de perigo às vizinhas.
Num artigo publicado recentemente “chamam a atenção para eventos de comunicação que ocorrem desde sempre em comunidades entre microalgas”, conta à Exame Informática, o cientista que recebeu o Prémio Inovação atribuído pela Exame Informática, em 2021. “Interpretamos a sua origem e apresentamos um modelo para essa comunicação”, descreve. Uma vez que se trata de uma forma de comunicação com componente elétrica, Paulo Rocha e a sua equipa procuram tirar partido da mesma para produção de energia, numa forma sustentável e completamente nova. ”O movimento de iões (sejam eles de Ca2+ ou por outros Na+, K+ etc) gera eletricidade e essa é provavelmente a bioeletricidade que medimos, uma propagação de iões entre as populações.”