Todos os engenheiros, astrónomos, físicos e amantes do espaço em geral, que acompanham a missão que pôs no espaço telescópio espacial James Webb sabiam que a mais pequena falha poderia ditar o fim da aventura científica. Por isso, este último mês, após o seu lançamento, foi vivido com ansiedade, como nos confessou o astrofísico e investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (Iastro), José Afonso. Até chegar ao ponto L2, trinta dias após o seu lançamento, onde ficará estacionado, a 1,5 milhões de quilómetros da Terra, milhares de procedimentos tiveram de ser cumpridos à risca, com uma precisão de décimas de milímetro.
Agora, a partir deste ponto de observação privilegiado, espera-se que possa responder a perguntas com que os cientistas andam às voltas há muito tempo. Uma delas, e que interessa particularmente a José Afonso, é relativa à origem dos quasares, estes objetos extremamente luminosos, alimentados por buracos negros supermassivos, já de si difíceis de imaginar. “Estamos a tentar descobrir os primeiros quasares do universo, os que apareceram logo após o Big Bang”, detalha. “Conhecemos quasares distantes, mas não conseguimos dizer o quão distantes estão. Aqueles que conhecemos e relativamente aos quais conhecemos a distância já estão nos primeiros 10% de idade do universo.”
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Mas isto não chega. É preciso ir mais atrás, até ao ponto de formação das primeiras estrelas, recuar 13 mil milhões de anos. Esta luz, emitida no princípio dos tempos, é demasiado ténue para ser captada aqui na Terra. Lá no seu posto de observação, no parapeito da janela L2, o JWST está livre do bloqueio da atmosfera e da luz ofuscante do Sol. Sendo um telescópio de infravermelhos, consegue ser sensível a estes resquícios de luz muito antiga. “Vai encontrar quasares nos primeiros 500 milhões de anos, quasares primordiais, e ter vislumbre dos primeiros passos para a formação de uma galáxia”, continua José Afonso. “Podemos até ter de rever o modelo do Big Bang”, nota.
Para Nuno Peixinho, da Universidade de Coimbra e também do IAstro, as 98 horas de observação a que terá direito e que “valem ouro”, servirão para estudar 60 objetos trans neptunianos, corpos gelados, situados para lá de Neptuno, na dita cintura de Kuiper, o local de onde vêm os cometas. O seu objetivo é “descobrir a composição primordial do sistema solar”, através do estudo destes objetos que acabam por estar num estado mais puro, menos danificado pelos raios cósmicos. “[O JWST] vai permitir dar um grande salto na descoberta dos trans neptunianos”, diz.
José Afonso reforça o “alívio e entusiasmo”, com a chegada a bom porto. “Agora, o telescópio, já “desdobrado” na sua estrutura final, continuará a arrefecer e começará a ligar os seus instrumentos. Durante as próximas semanas e meses assistiremos aos alinhamentos finais e calibrações. Todo este procedimento demorará ainda cerca de 5 meses”, descreve.
Também se espera que o novo telescópio venha a ter um importante impacto na cosmologia, “uma nova fase no nosso conhecimento do Universo”, diz José Afonso. Um dos desafios será esclarecer o é, afinal, a matéria escura – algo que os astrofísicos sabem que tem de existir, pelas contas feitas à gravidade, mas que até agora se tem mantido indetetável. “Ainda andamos às voltas com o que poderá ser a matéria escura. Tem massa, mas não brilha e nós só conseguimos detetar o que emite radiação”, observa Nuno Peixinho. “Só vemos os 4% do universo.”
A aventura está apenas a começar.