Quando em 1957 a União Soviética lançou com sucesso o Sputnik-1, conhecido por ser o primeiro satélite artificial em órbita, o momento histórico deixou os EUA perto de um ataque de nervos: afinal, a supremacia tecnológica que os americanos pensavam ter podia não corresponder à realidade. Isto levou o governo norte-americano a redobrar os esforços em investigação e desenvolvimento. Nascia assim uma verdadeira corrida ao espaço protagonizada pelas duas nações e, consequentemente, deu-se um agravamento da tensão geopolítica que se tinha instalado depois da Segunda Guerra Mundial – período que ficaria conhecido como Guerra Fria.
Dois anos depois do Sputnik, os EUA criaram o programa Corona, constituído por satélites espiões com o objetivo de fotografar o território da União Soviética. O que os responsáveis de então não sabiam é que as imagens recolhidas pelos satélites do programa Corona serviriam, quase 60 anos depois, para provar como a exploração agrícola está a provocar o declínio de uma espécie animal.
Um estudo divulgado nesta segunda-feira na publicação científica Proceedings of the Royal Society B explica como a utilização de terreno para a produção agrícola fez reduzir o número de abrigos das marmotas das estepes (marmota bobak), nas grandes planícies que ligam os continentes europeu e asiático.
“Usando imagens de satélites espiões da Guerra Fria, mostramos como uma espécie-chave desta pastagem, a marmota das estepes, continua a responder às expansões agrícolas que aconteceram há mais de 50 anos”, lê-se na introdução da investigação liderada por Catalina Munteanu.
O estudo concluiu que as escavações que as marmotas usam como abrigo atingiram números recorde nas áreas de cultivo, o que mostra por um lado a adaptação da espécie, mas o estudo também concluiu que a espécie diminuiu em áreas que foram usadas de forma persistente como terrenos de cultivo desde a década de 1960. Mais concretamente, o número inicial de abrigos das marmotas baixou 14% nas últimas décadas.
Mais: as marmotas da estepes são conhecidas por usarem os mesmos abrigos durante décadas, com o estudo a concluir que estas ‘habitações’ históricas tinham sido reduzidas em cerca de 60%.
Com a ajuda das imagens dos satélite Corona e com as informações agora disponibilizadas em plataformas de geolocalização como o Google Maps, Bing Maps e o software da Esri, foram analisados 12500 abrigos de marmotas nas estepes que ligam a Europa à Ásia.
“Os nossos resultados mostram a necessidade de decisões de longo prazo, pois a gestão contemporânea dos terrenos vai afetar a nossa biodiversidade nas próximas décadas. O nosso trabalho também é pioneiro na utilização de imagens de satélites espiões Corona da Guerra Fria para a ecologia. Este recurso vasto e pouco usado de medição remota de recursos dá uma oportunidade única para expandir o horizonte temporal de estudos ecológicos de larga escala”, considera ainda o grupo de investigação.