Lee Sedol provavelmente vai pensar duas vezes da próxima vez que for convidado a jogar Go contra uma máquina. Se fosse futebol, o mínimo que se poderia dizer é que o campeão sul coreano sofreu uma “derrota categórica” perante a aplicação AlphaGo, da DeepMind; se fosse boxe, Lee Sedol dificilmente escaparia a um título de jornal sobre uma derrota por KO; e no rugby, talvez fosse enaltecido o trabalho da equipa que criou a plataforma de inteligência artificial em detrimento do jogo individualista do jogador de carne e osso. Mas afinal trata-se de Go – e o embate menos feliz de Lee Sedol surge nos títulos da secção de tecnologia como uma derrota que é também a derrota de quase toda a humanidade (já excluindo investigadores da DeepMind, que por sinal pertence à Google): hoje, depois de ter feito o tento de honra com a vitória na quarta partida, soube-se que o AlphaGo venceu a quinta partida disputada em Seul – que não valia para nada, pois o programa já tinha ganho as três que ditavam o vencedor – e afundou a moral de Lee Sedol num inapelável 4-1, que desviou o prémio de um milhão de dólares para a DeepMind.
Lee Sedol deu conta das mágoas em plena conferência de imprensa, confessando tristeza – e também uma ponta de otimismo que, segundo a BBC, o terá levado a considerar que a derrota contra o AlphaGo não pode ser encarada como um sinal de que as máquinas são mais inteligentes a jogar Go que os humanos.
Sedol, que terá provado do mesmo amargo de boca de Garry Kasparov, quando no final dos anos 1990 perdeu a primeira partida de xadrez contra supercomputador DeepBlue da IBM, mostrou fair play no final e prometeu rever os conhecimentos de Go. O que deixa entreaberta a possibilidade, à boa maneira do boxe, de um segundo confronto entre homem e máquina à volta de um tabuleiro composto por uma grelha, que tem como objetivo a conquista do espaço do inimigo.
Como no flash interview dos melhores dérbis, o semblante dos investigadores da DeepMind era bastante mais leve e auspicioso que o do opositor. Segundo rezam as crónicas, o DeepBlue da IBM teria no seus repositórios mais de 700 mil jogadas de mestres do xeque-mate; a plataforma AlphaGo tinha como ponto forte uma ferramenta que facilita a pesquisa de jogadas e estratégias. Uma simples comparação entre os dois jogos permite perceber por que é que estes dois jogadores virtuais são tão diferentes: enquanto um jogador de xadrez, apesar de deparar com um maior complexidade no que toca à especialização das peças e ao lugar que ocupam, apenas dispõe de cerca de 20 jogadas possíveis a cada momento, no Go esse mesmo jogador depara-se, a cada momento, com 200 jogadas possíveis. O que chega e sobra para a AlphaGo recolher os louros da vitória sobre Sedol, como a IBM nunca ousara fazê-lo com Kasparov (até porque o Deep Blue apenas ganhou duas partidas que não chegaram para ganhar qualquer título).
Demis Hassabis não desperdiçou a última vitória sobre o vencedor de 18 campeonatos do mundo de Go para descrever o feito como a mais «excitante e stressante» partida em que alguma vez tinha participado.
O tempo dirá se haverá algum humano com coragem suficiente para afrontar novamente o AlphaGo.