Existe em Portugal um número elevado de Arquitetos com duas consequências inescapáveis para o mercado: uma oferta sobredimensionada e algum “dumping” de preços.
Isto não será uma novidade para a maioria das pessoas, mas as suas consequências para o país e para a economia são pouco discutidas em detrimento de “causas” de classe, mais políticas e francamente menos relevantes para todos.
Com exceções por demais conhecidas, a grande maioria da oferta compete pelas mesmas propostas em condições muito dispares. Não é segredo que alguns “gabinetes” evitam custos de estrutura e promovem valores tão baixos que inviabilizam as margens de outros gabinetes “estruturados” que pagam rendas, eletricidade, licenças de software, seguros e salários. A primeira consequência deste estado de coisas é que o mercado possui uma perceção errada do valor do trabalho do arquiteto, a segunda é que a decisão de investimento numa estrutura e consequente criação de emprego é muito reduzida.
Desengane-se quem pensa que me estou a referir a “concorrência desleal” ou a pedir uma intervenção musculada da esfera pública ou corporativa nesta questão. Considero sim que, por um lado, urge discutir a responsabilidade da própria classe profissional, que não tem sabido promover-se ou valorizar o serviço que presta. Por outro lado, o chamado peso de custos de contexto, como a carga fiscal, mas principalmente a demora de aprovação de processos nas autarquias que leva a um arrastamento interminável de todos os processos, asfixia a tesouraria dos gabinetes, em especial os de menor dimensão.
A verdade é que, num mercado como o nosso, não há nenhum arquiteto que não tenha já passado por fases de grande dificuldade, em que não sabia se no final do mês conseguiria pagar todos os salários. Refiro-me a uma classe inteira de profissionais que foram educados e treinados para pensar as cidades e o urbanismo, mas a qualidade das nossas casas e dos nossos postos de trabalho.
É indiscutível a qualidade e diferenciação que um Arquitecto pode trazer a um espaço, colaborando desde logo para um maior valor económico do mesmo, mas principalmente para o conforto espacial, térmico, acústico, luminotécnico, etc. A não existência do Arquitecto enquanto técnico responsável de um projecto, ou pior, a escolha por preços que nos impedem de fazer um trabalho completo e correcto por honorários justos, leva a cidades desconstruídas, desestruturadas e espaços com problemas que só aparecem mais tarde.
Essa mesma classe, da qual eu faço parte, olha para o mercado internacional como uma opção muito natural, que lhe pode garantir não apenas oportunidades de crescimento, mas também a aquisição de um conjunto de competências muito importantes para a sua evolução profissional. O contacto com mercados mais equilibrados fiscalmente, mas principalmente mais informados sobre o valor do trabalho do Arquitecto, com uma network mais desenvolvida e que não é prisioneira de um certo snobismo da classe em Portugal, exercem uma atração cada vez maior a profissionais com mais e menos experiência. Foi o meu caso em 2006, mas é também o caso de muitos excelentes profissionais do sector.
Hoje em dia é cada vez mais barato e simples viajar entre países. Uma viagem que dentro da Europa não custaria há uns anos menos de 400 ou 500€ pode hoje ser feita por 50 Euros, o que coloca em cima da mesa a inevitável fuga de recursos humanos para outros mercados.
Em suma, num mercado tão sensível a ciclos económicos, cabe-nos olhar com atenção e projetar as necessidades de toda uma classe de profissionais e de uma forma verdadeiramente desassombrada, construir abordagens estratégicas para todos os envolvidos.