Desde 2012 que a Happiness Works faz um estudo anual sobre a felicidade organizacional nas empresas portuguesas. A evolução tem sido positiva e os dados permitem comprovar como ambientes de trabalho flexíveis e saudáveis trazem retornos positivos. Georg Dutschke, um dos autores da análise, revelou na apresentação da edição deste ano, que nas empresas felizes há uma queda de 67% no absentismo, menos 55% de vontade de sair das organizações e um aumento de 11% na perceção de produtividade.
Na próxima edição da Exame, poderá consultar todos os dados do estudo, que, desde a sua primeira edição, obteve cerca de 55 mil respostas. Essa análise faz também o ranking das empresas mais felizes, com as distinções deste ano a irem para a AMCO, a Milestone e a Wellow. A entrega dos prémios decorreu esta quarta-feira no auditório da SRS Legal, em Lisboa.
O próximo passo na análise da felicidade organizacional passar agora por usar todos estes dados para ajudar a prever qual o risco de as empresas perderem funcionários. “Temos muita informação, de setores e segmentos diferentes”, observa Georg Dutschke. Assim, o objetivo agora é usar todos esses dados para construir modelos preditivos a partir das variáveis dos modelos que mais podem contribuir para alguém sair da organização”.
O especialista em felicidade organizacional explicou que isso pode ajudar as empresas a identificar departamentos da empresa em que o risco da saída de talento é maior e tomar medidas para prevenir esse cenário. Georg Dutschke deixou a questão de até onde se poderá usar os dados. E a resposta não é simples.
A IA, os dados e o trabalho
Num painel de debate sobre o papel do processamento de dados dos trabalhadores por sistemas de Inteligência Artificial (IA), Ana Margarida Henriques salientou que existe o risco de se beliscarem direitos fundamentais. A advogada no departamento de laboral e Segurança Social da SRS recordou que a UE aprovou recentemente o Regulamente sobre Inteligência Artificial e que este considerou “os temas de IA no recrutamento e na gestão da relação como de elevado risco”. Realçou que os sistemas de tratamento de dados biométricos que permitem o reconhecimento de emoções são proibidos porque podem gerar resultados discriminatórios.
Mas os dados são valiosos em todas as áreas, e a gestão de Recursos Humanos não é exceção. “Numa empresa grado só com dados é que conseguimos tomar decisões”, referiu Joana Queiroz Ribeiro no mesmo painel de debate. A diretora de Pessoas e Organização da Fidelidade realça que a seguradora já está habituada a trabalhar com modelos preditivos tendo em conta a sua área de negócio. E defende que na área de gestão de pessoas também é necessário esse tipo de modelo alimentado com dados para se conseguir resultados positivos para a organização e para os funcionários.
Joana Queiroz Ribeiro deixou um exemplo de como os padrões fornecidos pela análise de dados foram essenciais para se tomarem medidas com impacto positivo. Os dados permitiram perceber que as funcionárias grávidas tendiam a entrar de baixa no quinto mês de gravidez. “Fomos estudar e passámos a proporcionar a essas pessoas não só a possibilidade de teletrabalho, como também a disponibilizar lugar de estacionamento”, revelou a responsável da Fidelidade. Essas medidas ajudaram a baixar o número de baixas. Assim, concluiu, apesar da maior responsabilidade que as organizações têm no que fazem com os dados, é possível usá-los e à IA “para melhorar a experiência das pessoas nas organizações”.
Ricardo Parreira também partilhou a experiência da PHC. O CEO da tecnológica disse que ainda antes da IA generativa, a empresa já tinha modelos preditivos de saída de funcionários. “A minha experiência é que são apenas um indicador”, disse. E resume a recolha e o tratamento de dados a uma questão de confiança. “Se o trabalhador desconfia que a empresa o vigia para retaliar isso é complicado. A confiança ganha-se ao longo do tempo e dizendo que dados são recolhidos e para que serve”, sugeriu. Defendeu que os dados podem ser úteis para perceber em que áreas da empresa se pode tomar medidas para aumentar a felicidade organizacional ou para implementar medidas de formação ou outras. Mas não descartou que exista o risco de um lado negro – principalmente em empresas mais pequenas – de os dados serem usados contra o trabalhador, concluindo que têm de ser protegidos pela lei.
Já Pedro Balage, staff data scientist da PandaDoc, diz que os modelos de IA vêm somar e dar novas ferramentas aos profissionais de Recursos Humanos a fazer o trabalho da melhor forma. Mas, conclui: “No final não é o modelo, mas sim o profissional que vai tomar decisões”.
