A região continua a ser Trás-os-Montes e as vinhas continuam a ser [muito] velhas. A 2CC Produção de Vinhos, criada pelos amigos António Costa Boal e Francisco Costa (mais conhecido por Costinha) em 2018, apresentou ao mercado as duas referências deste ano: a segunda edição do Segredo 6 e o Vinha do Professor. Ambos são produzidos pela Costa Boal e têm enologia de Paulo Nunes.
“Chama-se Vinha do Professor porque o proprietário era professor e achámos que fazia sentido o vinho contar parte da história do terreno”, contam os dois amigos à mesa de um restaurante em Lisboa. É um almoço informal e descontraído, em que António e Francisco não conseguem esconder o entusiasmo pelo projeto que gerem em conjunto – tal como não conseguem evitar as picardias típicas de quem já se conhece há muitos anos, sempre acompanhadas de gargalhadas e de muitos pormenores que fazem as delícias de qualquer jornalista.
As uvas que fazem o Vinha do Professor vêm exatamente das mesmas árvores de onde sai o Segredo 6, mas posiciona-se numa gama ligeiramente mais abaixo. No fundo, é a referência que sai para o mercado quando os dois amigos não consideram que o ano garantiu a singularidade que procuram para o Segredo. Os vinhos Vinha do Professor são vendidos, pelo produtor, em caixas de três garrafas de 0,75l, com um PVP de €675 a caixa. Uma diferença relativa face aos €600 que custa cada Magnum de Segredo 6, mas ainda assim um vinho que não está ao alcance de todas as carteiras.
Costinha sorri quando a conversa é o preço, porque percebe rapidamente as nossas dúvidas sobre se fará sentido. Mas, garante, sabe exatamente quanto é que o seu vinho vale e onde o pode colocar para que seja facilmente consumido. E, mais importante, em que patamar o quer colocar e quer que seja percecionado.
É uma posição que defende desde o lançamento da primeira edição do Segredo 6 – o nome vem do facto de o projeto dos dois amigos ter sido mantido em segredo praticamente até estar no mercado, e o 6…bom, naturalmente vem do número que o ex-jogador de futebol usou tanto ao serviço do FC Porto como da Seleção Nacional. Na ocasião, quando muitos franziram o sobrolho ao facto de somente engarrafar em grandes formatos – foram 600 garrafas Magnum, 66 de 5 litros e 6 de 15 litros – Costinha já tinha começado a encolher os ombros. Não só porque acredita que Magnum é o formato certo para ter um vinho à mesa, num jantar com amigos, mas porque está ciente de que a evolução em garrafa é melhor. E recorda que, em apenas um ano, 70% da produção foi vendida, o que “deve significar algo”.

Ao seu lado, António vai anuindo e recordando que, desde que haja quem pague, há mercado para vinhos a centenas de euros a garrafa. Como a nossa opinião, inevitavelmente, vai divergir, optamos pela solução mais diplomática, e pedimos para saber mais sobre este Vinha do Professor, do qual foram feitas pouco mais de mil garrafas.
É um blend de Touriga-Nacional, Touriga-Franca, Tinta-Amarela e Alicante Bouchet, e revelou-se um vinho extremamente equilibrado, com frescura, acidez e estrutura. Assim de repente, não é fácil de adivinhar que é um vinho de Trás-os-Montes – preconceito nosso, diríamos seguramente que seria do Douro – mas a verdade é que tem um final de boca bastante mais curioso do que os dessa região. Muito longo, com muita pimenta, deixa-nos a pensar nele mesmo depois de vermos como se comporta com a comida que temos à frente. E experimentámo-lo com tudo: com queijos, enchidos, petiscos, carne e bacalhau… É um vinho com um bom potencial de evolução, que pode ser encontrado em garrafeiras nacionais – e aí talvez consiga comprar apenas uma garrafa, uma vez que isso ficará ao critério de cada vendedor.
Passamos à prova do Segredo 6, cuja garrafa olha para nós com o seu rótulo de veludo e as letras douradas – é um vinho excêntrico até na apresentação – à ponta da mesa. Enquanto se resolve um pequeno acidente de percurso, que isto de servir garrafas de litro e meio é difícil mesmo para quem tem muita experiência, e no meio de toalhas a serem levantadas e repostas, Francisco recorda a sua infância passada em terras alentejanas, uma vez que os pais eram trabalhadores de uma quinta na região. É quando nos revela a vontade de adquirir uma vinha a sul do Tejo, embora garanta que não tenha pressa. Francisco é um entusiasta de vinhos, um conhecedor do que se faz em Portugal e no mundo e, revela-nos António, proprietário de uma incrível garrafeira particular.
Aliás, foi precisamente durante uns ‘almoços vínicos’ entre amigos que Francisco e António se conheceram. Consta que era o antigo jogador que levava das garrafas mais surpreendentes, revelando um fascínio e um saber que encantou António. Ficaram tão amigos que até já há planos de juntar a família por via de casamento dos descendentes – estamos a brincar que não há casamento arranjados em Portugal!
Mesa reposta, Segredo 6, colheita de 2020 no copo. Um vinho que é reflexo não apenas do gosto dos seus produtores – Costinha gosta muito das notas que o Alicante Bouschet lhe dá –, mas também do estilo apresentado sempre por Paulo Nunes (o enólogo responsável pelos vinhos da Casa da Passarella, por exemplo). Um vinho robusto, com os taninos elegantemente trabalhados, extremamente equilibrado. Uma referência, honestamente, incrível – mas que para nós continua a não valer os €600 por garrafa. Já o dono do restaurante onde estamos a almoçar esfrega as mãos de contente com a chegada da segunda edição do Segredo 6 que, ao que parece, tem muitos adeptos entre os seus clientes. O Segredo passa 18 meses em barrica nova de carvalho francês antes de ser engarrafado e aguardar mais uns meses até ir para o mercado. Da edição de 2020 foram feitas 333 garrafas, que chegaram ao mercado apenas no formato magnum.
Brindes feitos às referências da 2CC, fechámos o almoço com vinhos da Costa Boal – isso ficará para outra ocasião – e sobremesas que nos obrigaram, nos dias seguintes, a caminhar muito mais do que gostaríamos. Mas a vida é feita destas escolhas…
Tanto o Vinha do Professor como o Segredo 6 receberam, da nossa parte, uma avaliação de AA.