Foi preciso esperar cinco anos após o chumbo da oferta pública de aquisição (OPA) da Sonaecom sobre a Portugal Telecom (PT) para que a fusão da ZON com a Optimus visse a luz do dia. Fundamental para que esta operação há muito esperada no sector das telecomunicações avançasse foi também o passo dado pela angolana Isabel dos Santos. Tornou-se a maior acionista da ZON e entendeu-se com Paulo Azevedo, presidente da Sonae, para entrarem ambos no negócio da distribuição em Angola.
Mas há ainda um longo caminho a percorrer e a procissão vai no adro. Na melhor das hipóteses a operação, que acabará por dar origem à segunda maior empresa do setor em Portugal, estará formalizada em julho. O tempo poderá ser um dos maiores obstáculos que a fusão da ZON e da Optimus terá de enfrentar, já que até que a operação seja aprovada terá ainda de passar pela mão dos acionistas na Assembleia Geral (AG) e pelo crivo dos reguladores: Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Autoridade da Concorrência (AdC) e Anacom.
Certo é que a fusão da Optimus, operadora móvel da Sonaecom, com a ZON, dona da rede de cabo, anunciada em dezembro de 2012, dará origem a um grupo de telecomunicações mais forte, com uma quota de mercado que rondará os 26% e maior capacidade de concorrência. A ZON é líder da televisão paga em Portugal (1,5 milhões de clientes e 50,6% de quota de mercado) e a Optimus é o terceiro operador móvel (21% de quota). Juntos complementam-se e abrem espaço para avançar com ofertas mais abrangentes assentes na sua própria rede, nomeadamente o chamado quadruple (televisão, voz móvel, voz fixa e Internet). Torna-se, por isso, um concorrente mais poderoso.
Depois da fusão, a PT passa a ter de enfrentar um operador que poderá replicar o mesmo tipo de ofertas. Mas a grande ameaça será sentida sobretudo pela Vodafone, que não terá condições para oferecer de forma massiva um conjunto de serviços em pacote, já que o seu projeto de televisão tem uma dimensão muito reduzida, tal como atualmente o da Optimus. Aliás, se a oferta avançar, a Vodafone, que é hoje o segundo maior operador de mercado, com 40% de quota na voz móvel, passa para uma posição mais enfraquecida, num sector onde a pressão concorrencial será forte, pelo menos nos próximos anos.
Quanto mais tarde melhor
Neste cenário, os concorrentes terão todo o interesse em arrastar o processo de fusão.
Ou seja, quanto mais tarde a nova empresa, cujo nome será para já ZON Optimus SGPS, entrar no mercado melhor. Por isso, é de esperar que os maiores players do mercado, a PT e a Vodafone, estejam a preparar-se para bombardear os reguladores, nomeadamente a AdC e Anacom, com perguntas e pedidos de esclarecimentos sobre o novo operador que resultará da fusão e o seu impacto no sector em termos de concorrência e de regulação.
O tempo é um fator importante, sublinham os analistas do sector ouvidos pela Exame, sublinhando que as sinergias da fusão vão-se reduzindo à medida que vão surgindo ofertas agressivas no mercado, como aconteceu recentemente. A PT já contra atacou ao avançar com o pacote M4o, uma oferta integrada de televisão, voz fixa e móvel, e Internet, por um preço competitivo (79,90 euros). O movimento de Zeinal Bava – em preparação pela PT, segundo a empresa, há 9 meses – foi aplaudiu pelo mercado e poderá dar frutos importantes na captação de novos clientes.
Na sequência da fusão, cujo modelo proposto pela comissão executiva das duas empresas foi aprovado por unanimidade pelos respetivos conselhos de administração no dia 21 de Janeiro, a ZON e a Optimus preveem que a junção das empresas dará origem a sinergias ( operacionais, investimento, receitas e clientes) entre 350 a 400 milhões de euros. A ZOP, veículo controlado de forma paritária entre a Sonaecom e Isabel dos Santos e cuja sede será na Maia, ficará com 100% da Optimus entregues pela empresa liderada por Ângelo Paupério e com os 28,8% de Isabel dos Santos na ZON. Para compensar, a empresária angolana terá de investir 113 milhões de euros. O projeto de fusão baseia-se numa relação de troca que atribuiu à ZON um valor que é 1,5 vezes o valor da Optimus e vai implicar um aumento de capital na operadora de cabo. No final, os acionistas da Optimus (a Sonaecom) ficam 40% da nova empresa e os da ZON com 60%. A internacionalização – a ZON está presente em Angola e Moçambique com a marca ZAP – é um dos atrativos da fusão sublinhados pelas administrações das operadoras.
OPA, sim ou não?
Conscientes que correm contra o tempo, as administrações querem acelerar o processo de fusão. Depois de aprovada pelo conselho de administração, a fusão terá agora de ter a luz verde da Assembleia Geral, que deverá realizar-se no final de fevereiro. Admite-se que os acionistas não deverão colocar entraves à operação. O BES que é o segundo maior acionista tem negócios em Angola e excelentes relações com Isabel dos Santos, a quem tem tecido elogios como empresária. O BPI é um tradicional aliado da Sonae e tem em Isabel dos Santos uma das maiores acionistas, com 19,9% do capital. Joaquim Oliveira, Joe Berardo, a Visabeira e Pereira Coutinho deverão igualmente estar a favor. Ou seja, estão criadas as condições para que a oferta avance.
Os analistas acreditam no sucesso da fusão e não esperam grandes surpresas, não obstante poderá haver percalços. Cabe à CMVM dizer se dispensa Isabel dos Santos e a Optimus de lançarem uma OPA sobre a ZON. Há na realidade uma mudança de controlo acionista já que a ZOPT passará a deter 50,1% da nova empresa.
Mas a fusão, conforme deixaram claro os conselhos de administração, só avançará se a CMVM derrogar o dever do lançamento de OPA. E ainda no início de 2012, a CMVM isentou o espanhol La Caixa de lançar uma OPA sobre o BPI apesar de este ter ultrapassado os 33,33% de capital, limite que obriga a avançar com uma oferta pública. Há juristas que defendem que a dispensa de OPA poderá ser dada se a operação for aprovada por 2/3 dos acionistas em Assembleia Geral. O futuro dirá o que irá acontecer, para já o regulador mantémse em silêncio.
Mas este cenário não fica por aqui, há uma hipótese embora remota, conforme já admitiu o Berenberg Bank, de a Vodafone Portugal lançar uma OPA sobre a ZON. Não é porém comum a Vodafone avançar com ofertas públicas. Além disso, a Vodafone é móvel, ou seja, não tem operações de cabo. Nesse âmbito comprar a ZON sairia fora da sua estratégia mundial, mas os tempos mudaram e a verdade é que a tendência do sector é para oferecer serviços integrados, onde a televisão desempenha um papel importante. Se a Vodafone decidisse avançar com uma OPA, teria provavelmente a oposição de Isabel dos Santos, assim como dos seus aliados BES e CGD. por isso é pouco provável que o faça.
Pressão para abrir as redes
Depois de a CMVM tomar posição, a fusão terá de ter ainda a aprovação da Autoridade da Concorrência, que irá avaliar se há um reforço de posição dominante em algum dos mercados. Depois será a vez da Anacom, o regulador do sector das comunicações, ser chamada a pronunciar-se sobre a operação de forma não vinculativa.
São processos que poderão demorar algum tempo, nomeadamente por parte da Concorrência. Espera-se também que Anacom venha a ter algum trabalho na análise da operação, até porque se admite que poderá haver pressão por parte dos concorrentes para que haja a abertura da rede de cabo. Na Europa o único exemplo de abertura da rede de cabo é na Bélgica, a da Telenet. Em análise neste momento está a abertura da rede de fibra ótica da PT nas zonas não concorrenciais. Este é um capítulo onde poderá haver novidades na sequência desta fusão.
Este artigo é parte integrante da edição 346 da Revista EXAME