As ESG Talks têm o apoio do novobanco
O clima tem sido um dos grandes trunfos para a atração de turistas para Portugal, mas, com as alterações climáticas, esta é uma vantagem que se pode perder a prazo. Um estudo recente da União Europeia demonstra que, com a subida das temperaturas globais, os países do sul seriam os que mais iriam perder valor em termos turísticos. “As mudanças estão a acontecer e, dentro de poucos anos, poderá ser cada vez mais normal as pessoas irem passar férias de Verão à Finlândia ou a Suécia. E isso será uma riqueza acrescida para os países do Norte da Europa”, disse Cristina Siza Vieira, VP executiva da Associação de Hotelaria de Portugal, no decorrer do painel subordinado ao tema “a disrupção climática nos negócios e turismo”, na conferência ESG Talks, no dia 17 de outubro, uma iniciativa do novobanco em parceria com a VISÃO e a Exame, e com os knowledge partners Nova SBE e PwC
Segundo a mesma responsável, os mercados do Sul, sobretudo nas zonas costeiras, poderão “vir a conhecer alterações profundas”. Na sua opinião, o Algarve, por exemplo, poderá passar a “ter épocas altas nos meses de Abril, Outubro ou Novembro”. Todas estas mudanças implicam custos acrescidos para a indústria. “Se o mundo aquecer um grau e meio, o impacto será enorme. Os ativos hoteleiros que já temos não só terão de sofrer grandes adaptações, como irão passar a consumir mais energia para que o clima interior fique minimamente habitável”, esclarece.
Atualmente, o turismo representa cerca de 10% do PIB da União Europeia e gera um em cada dez empregos no espaço comunitário. Prevê-se que este número suba no futuro. Em Portugal por exemplo, as receitas de 2022 já foram superiores às de 2019 e, segundo Cristina Siza Vieira, no final deste ano “iremos ultrapasssar a taxa de ocupação que se verificou antes da pandemia”.
Em termos de impacto ambiental, o turismo é responsável por 8% das emissões globais. No entanto, a Organização Mundial de Turismo admite que se os crescimentos se mantiverem dentro do que é esperado, as emissões do setor irão crescer 25% até 2030. “As coisas têm mesmo de mudar. A nossa indústria pode ser uma grande vítima das alterações climáticas”, remata.
Outro dos setores portugueses que mais sofre com as mudanças do clima é o vitivinícola. Muito dependente das temperaturas e da humidade dos solos, esta é uma indústria que procura adaptar-se à nova realidade. Francisca Van Zeller, diretora de marketing da produtora de vinhos Van Zeller & Co, diz que esta é uma atividade que é vítima das alterações crimáticas em várias frentes. “Temos vindo a fazer um trabalho muito alargado de mitigação dos efeitos. A vinha é muito sensível ao clima e as temperaturas têm uma influência direta no produto final. Por isso é que os vinhos de diferentes anos têm características distintas”, explica.
Na sua opinião, esta nova realidade traz desafios, como, por exemplo, uma maior concorrência de países como Inglaterra e Alemanha, que tinham pouca tradição como produtores de vinho. “Estes são países que começaram a produzir grandes vinhos graças às subidas das temperaturas. Nós, por outro lado, estamos a perder condições como, por exemplo, a grande diferença de temperaturas entre o dia e a noite que eram essenciais para produzir bons vinhos”.
Mas nem tudo são más notícias. No meio de tudo este turbilhão, a gestora consegue vislumbrar alguns benefícios. “No Douro temos uma grande biodiversidade de castas o que nos permite adaptar melhor às alterações que estamos a sentir”. Mas não só, esta é também uma oportunidade para dar a conhecer ao mundo as castas portuguesas. Até agora, na África do Sul, na Austráia e na Califórnia as castas mais usadas eram as francesas. A subida das temperaturas tem levado a que estes produtores procurem variedades que se adaptem mais ao “novo” clima. E a escolha tem recaído sobre castas portuguesas. “Na Austrália e África do Sul estão a usar a Rabigato e até em França, na região de Bordéus, foi autorizado a plantação de Touriga Nacional e Alvarinho. Isto é uma grande vantagem para Portugal. Facilita-nos muito a comunicação do produto e as vendas de vinho nacional para o exterior”, esclarece Francisca Van Zeller.
Financiamento, precisa-se
Mas para fazer todas estas adaptações às novas necessidades, as empresas necessitam de se financiar e sendo a grande maioria do tecido empresarial nacional composto por pequenas e médias empresas, o problema pode ser ainda mais complicado. Pedro Wilton, consultor da Systemic, especialista em ESG & Finance, admite que “a banca irá ser o grande catalisador desta mudança. Eles são o grande canal distribuidor do dinheiro e terão de começar a ajudar as empresas a mudar e a adaptar-se à nova realidade”.
Em matéria de financiamento, o consultor destaca o recurso às chamadas green bonds, obrigações em que o capital subscrito deve ser aplicado em projetos ou ativos relacionados com o desenvolvimento sustentável e beneficios de natureza ambiental. “É um instrumento muito interessante e que pode ser muito vantajoso para as empresas”, salienta. É um método muito usado no exterior, mas que ainda está em fase de lançamento em Portugal e apenas disponível para grandes corporações. “Em vez de ficarem presas a um banco, estas podem financiar-se no mundo inteiro”, diz Pedro Wilton.
Fora isso, os bancos têm os modos normais de financiar as empresas, que podem passar “pela aplicação de critérios mais genéricos que analisam a pegada dessa empresa e, num segundo nível, a banca está também a financiar projetos de reconversão ambiental que sigam motivos sustentáveis quaisquer que eles sejam”.
No entanto, antes de começar a resolver o problema, Pedro Wilton diz que é “necessário que as empresas conheçam realmente o problema que as afeta”.
“A maioria das empresas atravessa um dilema. Antes de gerir tem de saber medir. E a grande maioria delas nem sequer sabe o tamanho da sua pegada ambiental. Essa é a primeira fase para resolver o problema. Depois necessitam de saber o tamanho da pegada dos seus concorrentes e, por fim, terão de a comparar com a do ano anterior para saber se estão a melhorar ou piorar”, explica.
Para Pedro Wilton este é “o nível zero do problema”. E, só depois de estarem na posse de todos estes dados, é que “poderão decidir o que irão fazer para melhorar a sua pegada ecológica”. E o financiamento só surge depois de toda esta equação estar resolvida.