Gostaria de saber o que fazer, agora que esgotei todas as formas de tentar agradar ao meu marido. Estamos casados há cinco anos e fui fechando os olhos a comportamentos dele que não me agradam, para não criar conflitos e não o aborrecer. Mas estou muito cansada disto. Ele recusa-se a fazer coisas a dois, mal olha para mim, ignora as minhas tentativas de romance e desqualifica-me quando estamos com casais amigos. Se o confronto com isso, diz que o problema sou eu, que estou a ficar velha e caprichosa. Acreditei que era só uma fase, que ele ia mudar. Esta invisibilidade deixa-me triste e desapontada. Cheguei a procurar os serviços de um terapeuta de casal, mas ele não quer ir às sessões. Apetece-me atirar tudo para o alto e recomeçar a minha vida, sozinha ou com alguém, mas tenho medo. Ele não quer ouvir falar em separação, mas separados estamos nós há bom tempo. O que devo fazer?
A leitora inclui-se no grupo das pessoas que “amam demais”? O termo não é dos mais felizes, já que o amor não tem medida, pelo menos subjetivamente. Um relacionamento íntimo saudável alimenta-se de partilha (e não de premissas do tipo “eu amo-te mais do que tu a mim”, num tom de reprovação). Se os últimos cinco anos da sua vida foram a pensar nele, a cuidar dele, apostada em não lhe dar chatices e à espera que ele mude, é provável que tenha chegado a “hora da verdade” e perceba que essa via só a levará ao desespero e a mais solidão.
Os relacionamentos assentes em estilos de comunicação disfuncionais (como os marcados por jogos de poder entre o elo “mais fraco” e o “mais forte”, que se repetem no tempo e produzem mais do mesmo) podem ser alvo de “reciclagem”, se ambos cultivam pontes sãs na vida em comum, que superam as dificuldades instaladas e permitem um pedido de ajuda externa, por assim dizer (o caso da mediação conjugal e o aconselhamento individual ou de casal). Caso não existam essas pontes (talvez nunca tenham existido, na medida em que a leitora esperou, desde o começo, que algumas coisas nele mudassem, sem que tenham sido construídas a dois), a probabilidade de fracasso acaba por tornar-se evidente.
A ideia de querer “salvar” o seu casamento e fazer este mundo e o outro para que funcione, não é mais do que uma ilusão e, pior que isso, pode ser uma conveniência enganosa. Nem uma das pessoas pode amar/partilhar/evoluir por duas (como se fosse omnipotente, embora se sinta impotente), nem a outra pode demitir-se do seu papel de adulta comprometida, como se não tivesse de prestar contas (aparentando uma superioridade que mascara uma forte insegurança e apego) ou tentando “saldá-las” com indiferença e desqualificação (as moedas de troca destas transferências de controlo e poder).
Há momentos clarificadores nas crises. Entre eles, a consciência do que é preciso aceitar para poder seguir em frente. A tentação de deixar tudo como está pode ser grande, mas quando a ilusão sai de cena, dando espaço para um exame de vida, o caso muda de figura. “Ele não quer falar sobre isso” tem, implícito, o “tenho medo de deixá-lo e ficar sozinha”. A separação de que estamos a falar nem é tanto a física, antes a autonomia psicológica. Se essa não é uma qualidade que seja promovida no seu (ou dele) sistema familiar, é provável que seja mais desafiador para si dar esse passo. Mas uma vez que o equaciona, esse é o melhor sinal que pode ter para encetar um novo rumo, mais satisfatório, para si. Mesmo que tenha de recorrer a uma psicoterapia (individual) para facilitar essa transição.