É, seguramente, uma história com rodas para andar. Mas está um pouco parada. E não é por falta de ânimo, nem de encanto, nem de utilidade. Nasceu a sul, cheia de sol e de amor pelo teatro. Com um propósito muito bem definido: levar às crianças algarvias, nomeadamente às mais afastadas dos centros urbanos, a arte dramática. Tem um petit nom – VATe – mas é um grande projecto. E não me refiro às 18 toneladas, nem aos 12 metros de comprimento. Não! É um grande projecto porque tem a magia de tornar os sonhos realidade; a magia de converter um autocarro num teatro que estaciona onde há crianças à espera! Um autocarro de dois pisos, transformado numa sala de espetáculos itinerante, com palco, plateia com capacidade para receber cerca de 30 espectadores por sessão, bastidores e camarins.
O projecto Vamos Apanhar o Teatro (VATe) nasceu em 1996, força da vontade da ACTA (A Companhia de Teatro do Algarve), da união de diversas parcerias e do investimento financeiro das 16 autarquias algarvias. Em 2010 ganhou o Prémio Gulbenkian Educação. Muito fácil entender porquê. O difícil é digerir o que a crise instalada de malas e bagagens fez a este autocarro tão especial, único no país, a querer seguir viagem. O VATe já teve um período áureo que é como quem diz, muitas crianças para verem os espetáculos. Verem e não só. Sentirem uma imensa alegria funda e contagiante. O VATe é responsável pela primeira vez de muitas crianças no teatro. Pelo espanto inicial de muitos petizes, do 1º ao 4º ciclo. Coisas que ficam para a vida. Actividades que educam, formam com afecto; esse afecto que é fundamental para crescer bem e feliz. Mas a crise tem esse poder maquiavélico e cruel, o de adiar o futuro irreparavelmente. As crianças que estão à espera deste autocarro cheio de histórias de encantar, nunca mais o vão poder apanhar, se não o apanharem agora.
E agora as autarquias não têm dinheiro. Muito menos para a cultura. Dos 16 municípios que inicialmente investiram neste projecto, só cinco, em 2013, compraram espetáculos ao VATe. Houve muitas reduções! Menos no ânimo de Jeannine Trévidic e da sua equipa, apesar de ficarem apenas três elementos. A coordenadora do projecto mantem-se segura da importância do trabalho que fazem. Da importância do teatro como ferramenta de pedagogia social, de aproximação intergeracional, uma vez que crianças e idosos são o seu principal público-alvo. O único autocarro em Portugal que tem por missão levar o teatro às crianças do interior algarvio tem de conseguir novas paragens, sob pena de ter de parar definitivamente. O problema para sair do Algarve e ir mais longe, é apenas o do combustível. O VATe está aberto a empreender novas viagens, rumar a norte e noutras direcções, mas precisa de apoio. Um patrocínio, nem que seja para o gasóleo deste autocarro tão peculiar. De resto, existem muitas histórias encenadas e por encenar e uma certeza que torna mais emotiva a voz de Jeannine Trévidic: “o que mais me custa é saber que há muitas crianças à nossa espera. E não podemos ir”.
E enquanto não pode fazer mais viagens de encantar, o ilustre autocarro irá estacionar na Praça da Pontinha, em Faro. “Um pequeno Príncipe” sobe ao palco do VATe nos dias 12, 13, 14, 15 e 16 de Maio, às 10.30 e às 14.30 horas. Por aqui ficamos a torcer para que entre as cartas que chegam ao VATe a cancelar espetáculos, a anunciar cortes, chegue uma a dizer:
querido teatro ambulante, não te vamos deixar parar!
Porque há muitas crianças à espera! E o teatro também alimenta e faz crescer. Com afecto.