O que faz um deputado numa sala cheia de mulheres a discutirem futebol, na Assembleia da República? Dá, ainda sem o sem saber, os primeiros passos naquela que virá a ser uma das missões da sua vida: a luta contra o tráfico de seres humanos e a exploração sexual de mulheres.
Ouvir o que tinham a dizer sobre os perigos dos grandes eventos desportivos, como o Mundial de Futebol, na Alemanha, em 2006, inspiraria o discurso de Mendes Bota, citado em jornais por toda a Europa, em que acusava a FIFA de ser conivente com a “Santa Trindade da Cerveja, Futebol e Sexo”. Fê-lo porque “era o correto”.
Pensou que seria apenas mais uma das suas intervenções na AR. Mas o tema nunca mais deixaria o deputado do PSD. Hoje corre o mundo, em busca de assinaturas que permitam ratificar a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica.
Para que o documento passe a letra de lei onde foi assinado, falta-lhe apenas a ratificação de mais dois países. Aquela que ficou conhecida como a “Convenção de Istambul ” será também, acredita Mendes Bota, essencial para combater o tráfico de seres humanos, já que, segundo dados recentes da Europol, 91% do tráfico é para exploração sexual.
Começou por ser o único homem nas salas onde se discutiam os temas da discriminação, mas incomodou-se tanto com essa originalidade, como com aquela que, em 1997, lhe valeu comentários em surdina: “Então, e se o gajo morre, fica uma mulher à frente disto?” Na altura, arriscou uma lista às autárquicas da Câmara Municipal de Loulé com uma número dois e paridade total: metade dos candidatos eram mulheres.
Guilherme Oliveira Martins
Ex-alunos por mais educação
Há muitas maneiras de ser solidário. Sobretudo quando se tem poder e influência.
Educação é a bandeira de Guilherme Oliveira Martins, presidente do Tribunal de Contas e ex-ministro da Educação do Governo de António Guterres.
Antes de explicar como ocupa as suas noites e fins de semana, clarifica que não tira um minuto ao trabalho no tribunal para tratar das suas causas. Mas, uma vez cumpridas as obrigações do trabalho remunerado todas as outras, do Conselho Fiscal da Cáritas à presidência do Centro Nacional de Cultura (CNC), são missões a que se dedica gratuitamente entra nesse outro mundo que lhe permite mover toda a sua influência e conhecimentos para que a Educação faça a diferença.
A ideia mais recente está agora a tomar corpo: mobilizar ex-alunos, alguns empresários ou em cargos de responsabilidade, da Universidade de Lisboa, para pagarem os estudos a jovens carenciados. “Não vão saber exatamente quem estão a ajudar, mas poderão defi nir se é um estudante de Direito ou de Engenharia, por exemplo.” O sítio onde se poderão candidatar na internet deverá entrar em funcionamento até ao fi nal do ano.
Num ano em que Ensino Superior teve menos 7 mil candidaturas, em muitos casos por falta de dinheiro para continuarem os estudos, este projeto é a menina dos olhos de Oliveira Martins. Embora não seja a única. Ainda durante a sua experiência governativa cruzou-se com o músico norte-americano Yehudi Menuhin o “maestro Amendoim”, como ficou carinhosamente conhecido, na primeira escola onde a ideia foi aplicada, em Algés e é hoje presidente da Associação Menuhin Portugal, que defende o combate à exlusão social, através da arte. “Nas escolas em que se aplica o programa melhoram os resultados dos alunos “, argumenta o jurista, para quem a verdadeira solidariedade é a que deixa raízes.
Mas há contributos de Oliveira Martins ainda mais subtis. Um trabalho para a universidade ou uma candidatura ao programa Erasmus podem muito bem precisar de conselhos. Para isso, lá está o CNC e o dedo de Oliveira Martins, que incentiva uma espécie de banco do tempo das artes para que qualquer jovem possa pedir ajuda quando precisa de falar com figuras da cultura portuguesa da escrita às artes plásticas.
Helena Roseta
Na onda da energia social
Como arquiteta que é, Helena Roseta não poderia ignorar um dos maiores dramas portugueses dos últimos anos: a habitação. Dois mil sem-abrigo e famílias de classe média em risco de ficar sem casa tornaram-se prioridades da autarca lisboeta.
As rendas subsidiadas até um terço aplicam-se a cerca de 90 habitações e há já mais 200 pedidos à espera de resposta. Helena Roseta defende que “a energia financeira está reduzida, mas há mais energia social”.
Decidiu aproveitar a capacidade de iniciativa de cada lisboeta para melhorar os “bairros de intervenção prioritária” nada de “problemáticos”, que levam o estigma no nome através do programa Bip-Zip, que contempla um milhão de euros para 67 bairros e recebeu o Prémio do Observatório Internacional da Democracia Participativa.
Cinquenta mil euros é o que podem receber os moradores que se candidatem. Os montantes têm servido para concretizar ideias tão diversas como pistas de skate ou cozinhas comunitárias. “Cada bairro sabe melhor do que precisa.” E, qual decisão revolucionária em tempos de hegemonia fiscal: “Não quero faturas. Não me interessa andar a controlar se paguei um café. Quero é resultados.” Para a presidente da Assembleia Municipal, eleita pelo Movimento Cidadãos por Lisboa, a crise combate-se com “medidas de contraciclo”. Por um mundo melhor.