Um pouco por todo o País começaram a surgir bancas que ostentavam a frase “A Economia Global pertence a todos”, com promotores a apresentarem uma esfera metálica que tem o objetivo de fotografar a íris – zona do olho que rodeia a pupila e se distingue pela cor. Em troca, cada pessoa que aceite fornecer este dado biométrico recebe 10 worldcoins, uma nova moeda que a empresa Tools for Humanity, de Sam Altman, lançou em julho, arrecadando ainda mais seis moedas só por descarregar a aplicação e ainda moedas adicionais caso convide outras pessoas a inscrever-se. O nome do empresário parece-lhe familiar? É normal, já que se trata do fundador do ChatGPT, a ferramenta de Inteligência Artificial (IA) mais utilizada no mundo.
Sam Altman diz ter criado a Tools for Humanity para criar a maior rede digital e financeira do mundo e, de facto, a worldcoin tem registado uma valorização gradual. Atualmente, cada moeda vale cerca de 6.45 euros, o que faz com que cada pessoa que tenha feito o download da aplicação e fotografado a íris recebeu perto de 112 euros. O dinheiro rápido e fácil é a chave do sucesso desta campanha, com filas a formarem-se atrás das bancas que se encontram em centros comerciais ou estações de comboio, apesar de a empresa dizer que não está a comprar dados, mas sim a ceder propriedade do projeto a quem participa nele. Contudo, quem recebe dinheiro em troca de imagens da própria íris muitas vezes vê ali a oportunidade de fazer um extra ou de aliviar uma situação financeira mais apertada, já que o dinheiro da aplicação pode ser transferido para outra conta bancária ao fim de 24 horas. Contudo, esta situação levanta preocupações sobre privacidade e segurança de dados, não só em Portugal como em todo o mundo. Diz a Tools for Humanity que mais de 3,7 milhões de pessoas em 10 países já venderam este dado biométrico, que é considerado mais valioso do que a impressão digital por não existirem no mundo duas pessoas com a íris igual.
Os dados biométricos da íris permitem provar no meio digital que estamos perante uma pessoa e não um robô que se está a fazer passar por um humano, algo cada vez mais relevante numa era em que a IA vive um desenvolvimento acelerado. A Tools for Humanity diz que está a efetuar esta recolha por motivos de segurança e para evitar fraudes online. Após a fotografia da íris, cria-se um “bilhete de identidade digital” chamado World ID que prova que aquela pessoa é real e única. Após esse processo, a empresa compromete-se a apagar as fotografias e dados biométricos recolhidos e nega a possibilidade de venda a outras entidades.
A Worldcoin diz cumprir as leis e regulamentos sobre a recolha e transferência de dados biométricos, incluindo o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) da Europa, mas não escapa a preocupações nem à controvérsia. Em Portugal e em Espanha foram denunciados casos de venda deste dado biométrico por menores de 18 anos, apesar de tal não ser permitido. A Tools for Humanity garante que os operadores dos stands estão informados para a necessidade de confirmarem a idade dos voluntários, além de que todas as pessoas têm de assinar um formulário de consentimento no qual garantem terem mais de 18 anos. Ainda assim, muitos denunciam a abordagem feita diretamente aos mais novos que passam pelos stands, aliciando-os com criptomoedas e sem que seja dado o tempo necessário de ponderação, uma vez que a recolha dos dados é feita logo de seguida no local.
Vários países estão a investigar ou a suspender a atividade desta empresa, por suspeitarem da forma como os dados vão ser tratados e do objetivo final desta recolha de informação pessoal. Nas redes sociais, surgem teorias e hipóteses, com muitos a suspeitarem que esta entrega de informação pessoal pode tornar-se prejudicial no futuro, com os dados a serem usados de forma indevida ou em ações que podem trazer danos ou limitações ao indivíduo. Ainda assim, há internautas que afirmam que tal se trata de uma oportunidade de adquirir uma criptomoeda que pode continuar a valorizar – uma perspetiva com o qual alguns analistas discordam.