Pelas redes sociais já passaram muitas modas. Modas não, que neste meio se fala, sim, em tendências, ou trends, para se ser mais exato. A mais recente consiste em pregar partidas a bebés e crianças pequenas, tendo recebido, por isso, a hashtag #PrankMyBaby.
Nestes vídeos curtos, pais ou tutores filmam os seus filhos ou protegidos a serem apanhados desprevenidos com alguma situação que os assusta, incomoda ou deixa aborrecidos. Resumidamente, que altera o estado da criança para um mais perturbado e agitado. Supostamente os vídeos têm o objetivo de fazer os outros rir, mas a verdade é que não estão a ser bem vistos, estando a ser condenados especialmente pelos especialistas em psicologia infantil. É o caso de Susan Linn, psicóloga investigadora do Hospital Pediátrico de Boston e professora na Faculdade de Medicina de Harvard
“Recentemente, assisti no TikTok a vídeos nos quais pais magoam, assustam e perturbam – desculpem, quis dizer “pregam partidas” – aos filhos muito pequenos.”, começa por expor Linn em declarações ao “The Washington Post”, resumindo, em seguida, alguns conteúdos a que assistiu. “Vi crianças pequenas – naquela idade em que estão a aprender que não se deve tocar em fezes – a ficarem agitadas quando os pais lhes colocavam em cima bolas de cocó falso, pois acreditavam que eram reais. Vi pais a assustarem bebés com máscaras assustadoras. Vi pais a aterrorizarem crianças de 5 anos prestes a começar o jardim de infância, incentivando-as a conversar por vídeo com o novo professor – e depois a mostrar-lhes na tela não o professor mas sim um rosto assustador. Em quatro vídeos, vi um pai a perturbar o filho ao ponto de o fazer chorar – e depois a celebrar o facto de o filho ser um ‘ator’ excelente”.
Susan Linn reconhece que fazer vídeos com estes conteúdos pode ser atrativo para várias famílias, pois normalmente as publicações recebem muitas reações e visualizações, o que pode aumentar o número de seguidores e, num nível mais avançado, trazer algum rendimento extra. Contudo, a especialista alerta que estes vídeos supostamente humorísticos “não são divertidos para as crianças que são alvos das partidas”, mas sim uma forma de abuso infantil.
“Estas partidas podem ser problemáticas para as crianças. Tornam os nossos filhos em fantoches de brincadeiras, o que é cruel. As crianças mais pequena – cujo bem-estar depende da presença consistente de adultos – não têm os recursos cognitivos para ver o humor de serem vítimas de uma partida. O sentido que têm do que é real e do que é irreal ainda está a desenvolver-se, por isso acreditam no que lhes dizem e no que veem. Precisam que os adultos que têm nas suas vidas sejam de confiança”, alerta a especialista.
Segundo a psicóloga, publicar vídeos com estes conteúdos também “normalizada a objetificação da criança”, pois desconsidera os sentimentos do menor que sofre a dita partida, e pode estar a incentivar outros pais a fazerem o mesmo. “Duvido que a maioria dos pais que observei no TikTok compreenda o custo psicológico das suas ações, e acredito que ficariam chocados ao saber que estas partidas podem causar danos reais”, acrescenta Linn, que acredita que divulgar as consequências destas ações é a melhor forma de travar esta trend.
Por fim, Susan Linn salienta que as empresas que gerem as redes sociais deveriam ser responsabilizadas por permitirem a partilha destes conteúdos. “Todos nós inadvertidamente magoamos os nossos filhos. Podemos, por exemplo, brincar de forma mais brusca acidentalmente, desprezar de forma inconsciente os sentimentos dos mais novos ou explorá-los quando estamos stressados. Mas as crianças sofrem desnecessariamente quando permitimos que os pais — e as empresas que gerem as redes sociais — lucrem com vídeos em que bebés, crianças pequenas e crianças em idade pré-escolar são magoados propositalmente”.