A Universidade do Sul da Dinamarca, na cidade de Odense, armazena 9479 cérebros de pessoas falecidas desde meados da década de 1940 até 1982, para fins de investigação científica. É a maior coleção do género conhecida em todo o mundo e, apesar de envolta em polémica, mantém-se acessível a cientistas que queiram estudar as doenças mentais que afetaram aquelas pessoas, da demência à depressão, passando pela esquizofrenia e a doença bipolar, à luz do conhecimento que se foi produzindo, ao longo das décadas mais recentes, sobre estas patologias.
“É uma fonte científica espetacular e muito útil se se deseja saber mais sobre a doença mental”, destaca, citado pela BBC, Martin Wirenfeldt Nielsen, o patologista responsável pela coleção desde 2018, evidenciado também o potencial de estudo para as gerações futuras, quando a Ciência souber ainda mais sobre a saúde mental.
“Uma das grandes mais-valias é que há cérebros tão antigos que foram retirados de pacientes que nunca tomaram medicamentos antipsicóticos”, sublinha, por seu lado, Knud Kristensen, ex-presidente da Associação Nacional de Saúde Psiquiátrica da Dinamarca. E nunca os tomaram porque, simplesmente, não existiam à época. “Isso quer dizer que se pode comparar esses cérebros velhos com cérebros recentes para ver que alterações são consequência desses fármacos”, acrescenta Kristensen.
Os quase 10 mil cérebros estão conservados em formol, dentro de baldes brancos espalhados por várias prateleiras de metal, num edifício da universidade. Pertenciam a doentes que morreram em instituições psiquiátricas da Dinamarca e, por esse motivo, cada cérebro está bastante bem documentado. “Sabemos quem eram os pacientes, onde nasceram e onde morreram. E também conhecemos os seus diagnósticos e os resultados das autópsias”, detalha Martin Nielsen. Cerca de metade possui ainda um historial clínico associado, uma vez que pertenciam a pessoas que tinham passado muitos anos internadas.
O projeto iniciou-se após a Segunda Guerra Mundial, envolto em algum secretismo, e causou polémica quando, já na década de 1980, se tornou do conhecimento generalizado. Isto porque nem os próprios pacientes tinham autorizado a doação do órgão após a morte, ainda que para fins científicos, nem sequer os familiares mais próximos tinham dado tal consentimento. Os cérebros eram separados do corpo após a realização das autópsias.
O debate público terminou já nos anos 1990, quando o Conselho de Ética da Dinamarca decidiu que os cérebros podiam ser usados para investigações científicas, em detrimento da posição que defendia o enterro dos órgãos. A coleção esteve inicialmente reunida no Hospital Psiquiátrico de Risskov, na cidade de Aarhaus, onde funcionava o Instituto de Patologia Cerebral, e foi depois transferida para a Universidade do Sul da Dinamarca, em Odense.