Fazer sinais de luzes, seguido de buzinadelas, ultrapassar pela direita e a alta velocidade, travar de forma repentina acompanhado de gestos pelo retrovisor, paragens bruscas e impropérios soltos pela janela fora. Estes são meros exemplos daquilo que um condutor com um estilo agressivo de condução pode fazer quando entra no seu veículo.
É costume ouvir-se dizer: “As pessoas transformam-se a conduzir”, sendo que a metamorfose é para pior. Devem ser raríssimos os casos de quem se torna agradável e discreto ao volante…
Um conjunto de investigadores da Universidade de Warwick, no Reino Unido, traçou a relação entre condução agressiva e desempenho do motorista. E as conclusões ditam que as características de uma condução agressiva têm tanto impacto nos atuais utilizadores das estradas, quanto será um desafio aquando da transição para os carros autónomos do futuro.
Os motoristas agressivos conduzem mais rápido e com mais erros do que os não agressivos, colocando as outras pessoas que vão na estrada em risco e representando um desafio para os investigadores que trabalham com a tecnologia de carros sem condutores.
Agora, a pesquisa da equipa da Universidade de Warwick relatou as suas principais descobertas: quem pratica uma condução agressiva circula a uma velocidade média de 5 km/h a mais do que os não agressivos; os condutores mais imprudentes apresentam mais erros do que os grupos de controlo, como não sinalizar a mudança de faixa; a condução agressiva é classificada como qualquer outro comportamento ao volante que põe intencionalmente em perigo a vida dos outros, psicológica ou fisicamente ou ambas.
No Reino Unido, em média, quatro a cinco mortes diárias nas estradas têm na sua origem uma condução agressiva.
O problema “deles”
Em França, 78% das pessoas que morreram em acidentes rodoviários, no ano passado são homens. Entre os 18 e os 24 anos, 88% dos condutores mortos são homens; dos suspeitos de provocarem acidentes fatais, 84% são homens; os condutores alcoolizados envolvidos em acidentes, 93% são homens.
Por cá, o relatório de 2019, publicado pela Autoridade Nacional para a Segurança Rodoviária, revelava que das 675 pessoas que morreram em acidentes de carro em 2018, 536 eram homens (79 por cento). Fossem peões, passageiros ou condutores, o número de vítimas mortais era superior nos homens, sendo que entre os condutores essa diferença era mais expressiva: 392 homens e 43 mulheres.
Na altura, José Miguel Trigoso, presidente da Prevenção Rodoviária Portuguesa, dizia: “Os homens correm mais risco, são mais agressivos e como condutores atropelam com mais velocidade” e, por isso, “têm muitos mais acidentes mais graves” – 69% dos intervenientes em acidentes rodoviários eram homens.
No ano passado, a Fundação Vinci Autoroutes, gestora das autoestradas francesas, realizou um estudo em diversos países europeus (Alemanha, Eslováquia, Espanha, França, Grécia, Holanda, Itália, Reino Unido e Suécia), em que demonstrava que “apesar de algumas mudanças comportamentais, ainda há muita tensão na estrada”. Cerca de metade (52%) dos inquiridos reconhecem insultar, por vezes, outros condutores. E 12% dos condutores europeus admitem mesmo que se transformam noutra pessoa quando estão ao volante, com 84% a afirmar já ter sentido medo da agressividade de outros condutores.
“Embora seja anti-ético deixar motoristas agressivos à solta nas estradas, aos participantes do estudo foi-lhes solicitado que relembrassem memórias de episódios de raiva, deixando-os em modo agressivo, enquanto realizavam uma simulação de condução e eram comparados a um grupo de controlo, que não se sentia agressivo”, explica Zhizhuo Su, principal autor do estudo.
“Esta pesquisa é significativa porque, à medida que a era dos veículos autónomos se aproxima, o tráfego rodoviário será uma mistura de veículos autónomos e não autónomos, guiados por pessoas que podem praticar uma condução agressiva. Este é o primeiro estudo a caracterizar o comportamento de condução agressiva de forma quantitativa e sistemática, o que pode ajudar os veículos autónomos a identificar uma condução potencialmente agressiva ao seu redor”, acrescenta.
“Para tornar a condução mais segura, a nossa investigação centra-se em métodos de compreensão do estado de espírito do condutor, para identificar comportamentos de condução arriscados, através da utilização de sistemas de monitorização. Isso permitirá que o motorista seja alertado quando estiver em maior risco de acidente e que o veículo adote métodos calmantes, como alterar o nível de ruído da cabina, tocar música relaxante ou reduzir a velocidade do veículo”, exemplifica Roger Woodman, professor assistente e co-autor do estudo.
Manter elevados os padrões de ensino do Código da Estrada, seja nas aulas teóricas, seja nas lições práticas, ao mesmo tempo que se investe em prevenção e campanhas de segurança rodoviária, com mais fiscalização in loco, ajudará a reduzir as infrações e os acidentes provocados por uma atitude intimidatória. Na verdade, melhor e mais seguro do que os carros autónomos, só mesmo quando existir teletransporte.