Quando se pergunta aos cidadãos quais são os problemas das cidades, as respostas, por muito que variem, apontam frequentemente para problemas de habitação, transportes e acessibilidade a recursos e serviços. Esta realidade é vivida nas mais diversas partes do mundo, mas existem cidades que tentam reinventar-se para que a vida dos cidadãos, ainda que com estes problemas, possa ser mais feliz. E uma delas é portuguesa.
O jornal The News York Times criou uma lista de seis cidades nos cinco continentes que são um exemplo de reinvenção da vida urbana: Lisboa, Paris (França), Sydney (Austrália), Singapura (Singapura), Durban (África do Sul) e Medelín (Colômbia). Tendo como exemplo esta última pela sua grande reinvenção, o jornal mencionou esforços para que as cidades fazem para se adequarem. Medelín, outrora considerada um dos lugares mais perigosos do mundo, tornou-se um modelo de renovação urbana através da criação de arquitetura pública visionária e com uma grande infraestrutura de transportes.
O principal ponto a favor de Lisboa é a sua estética com espaços verdes. “Simplificando: os verões de Lisboa são quentes. A cidade é conhecida como uma ilha de calor urbana, áreas densamente pavimentadas e edifícios que retêm aquecer. Caminhe por algumas horas e sentirá como se estivesse numa fritadeira”, descreve o jornal.
“Mas há formas de combater o calor: os espaços verdes. Um artigo de 2019 publicado na revista científica Heliyon mostra que aumentar o número de espaços verdes não só arrefece a área, mas também pode influenciar as partes circundantes, no que é conhecido como efeito de arrefecimento do espaço urbano”, citam. E este estudo menciona como Lisboa tem vindo a adaptar este método para facilitar a vida dos cidadãos.
O artigo faz referência ao “Plano Verde”, criado em 2008, “que detalhou medidas para compensar os danos ecológicos do desenvolvimento da terra”, lê-se. “A cidade iniciou inúmeras iniciativas para aumentar a quantidade de espaço verde público. Em 2012, a cidade implantou o Corredor Principal Verde, uma parte verde de 2,2 quilómetros que conecta o Parque Eduardo VII de 65 acres [cerca de 26 hectares] perto do centro da cidade até o Parque Florestal de Monsanto de 2223 acres [mais de 899 hectares].
O “Plano Verde” desenhado por Gonçalo Ribeiro Teles permitiu preservar e valorizar a estrutura verde fundamental da cidade. A 21 de Junho de 2018 Lisboa foi distinguida com o galardão de Capital Verde Europeia 2020. A distinção resulta da avaliação de um conjunto de especialistas internacionais sobre 12 indicadores que visam avaliar a sustentabilidade na cidade.
Depois de anos de instabilidade política, económica e social, em 1990 Medelín teve um ponto de viragem e conseguiu tornar-se numa das cidades de referência. A sua rede de transportes ajudou os mais pobres a ter acesso ao centro da cidade e os modernos edifícios construídos em bairros abandonados deram mais cor aos espaços. “Diante da crise, a sociedade fez as perguntas oportunas e embarcou no caminho das soluções”, explica o arquiteto Jorge Perez-Jaramillo, ex-diretor de planeamento da cidade de 2012 a 2015.
Os bairros mais pobres ficavam no alto das montanhas, distantes do centro da cidade. Assim, em 2004, a cidade criou um sistema de teleféricos, conectando estas cidades a outras áreas, reduzindo o custo e o tempo necessários.
Segundo o jornal, a cidade de Durban é marcada pelos vendedores de alimentos, artesãos, vendedores de roupas e outros bens, que “definem a essência de uma cidade e dão vida às ruas”. No Warwick Junction, onde os residentes podem comprar artesanato, especiarias, roupas ou a tradicional iguaria zulu de carne de vaca estão hoje mais de 6 mil pessoas. Mas nem sempre assim foi.
Quando a África do Sul estava sob o domínio do apartheid – política que, em 1950, dividia a população sul-africana em negros, mestiços e brancos – a ponte que ligava Warwick ao centro da cidade era interdita aos negros. Com o fim do apartheid, o governo de Durban decidiu que estava pronto para investir no mercado: ouviu os cidadãos e convidou os comerciantes de rua para ajudar nos planos de reestruturação dos espaços. Mais de uma década depois, a área atrai cerca de 450 mil pessoas diariamente e tornou-se uma paragem popular para os turistas.
Sydney, o centro dos negócios, ficou prejudicada pela pandemia. O que fazer com uma cidade parada e sem movimento? Em certas áreas de Sydney – que antes eram usadas principalmente para escritórios e espaços industriais – passaram a ser espaços de lazer.
“A pandemia estimulou um apetite por reformas e uma colaboração sem precedentes entre todos os níveis de governo, o que tornou uma série de iniciativas com as quais sonhamos há muito tempo – como o fechar de ruas, refeições ao ar livre e uma rede de bicicletas– possíveis pela primeira vez”, explicou Clover Moore, o governador de Sydney.
Um exemplo disso é a George Street, uma das ruas mais movimentadas do distrito, que tem um novo visual com um fluxo de tráfego radicalmente diferente. A mudança começou em dezembro de 2020 e quando terminar terá mais de 9000 novos metros quadrados de passeios, com nova iluminação, bancos, árvores e espaços para comer.
Anne Hidalgo, a governadora de Paris, quer tornar esta a cidade do futuro, principalmente apostando na rede de transporte. Paris já possui um forte sistema de transporte público, mas quer ainda expandir a rede de ciclovias, através de um plano de 250 milhões de euros de investimento. Hidalgo pretende que os moradores consigam atender a todas as suas necessidades – trabalho, saúde, educação e lazer – a 15 minutos a pé, de bicicleta ou de transporte público.
Ainda assim, há muitos moradores que não gostam de derrubar o antigo para dar lugar a novas construções. Em resposta, Paris tornou-se numa cidade que recicla edifícios.
Singapura, sendo uma ilha, não pode crescer muito mais. Mas a Autoridade de Redesenvolvimento Urbano do país dominou a arte de criar espaços num lugar cheio. Assim, a cidade iniciou o programa Park Connector, uma rede de trilhas que se estende por quase 30 quilómetros ao redor da ilha com rampas de fácil acesso. O sistema incentiva as pessoas a deslocarem-se sem carro.
Esta cidade é ainda um exemplo de habitação pública, sendo um modelo para outras cidades do mundo: mais de 80% da população do país vive em unidades construídas pelo governo.