O sistema de classificação por estrelas dos hotéis é uma das principais maneiras pelas quais estes locais são avaliados e, depois, escolhidos pelos clientes. Contudo, a tendência a desvalorizar as 3, 4 ou 5 estrelas que aparecem ao lado dos seus anúncios é cada vez maior. E isto acontece por vários motivos.
Com o crescimento de plataformas de viagens, a avaliação online dos utilizadores depois da sua experiência tem sido cada vez mais uma forma de decisão em relação a um hotel ou outro. Muitas pessoas procuram um alojamento confortável pelo melhor preço e é aliciante verificar que um hotel classificado com 5 estrelas está a um preço considerado razoável. Contudo, existem alojamentos deste tipo que, nas plataformas online, não estão muito bem avaliados. Quando se faz uma procura no Booking.com, um dos principais sites de hotéis e alojamentos do mundo, facilmente se encontra um hotel de 5 estrelas com pontuações de qualidade inferiores a 8, o que equivale a um Bom nessa mesma plataforma.
Por exemplo, a VISÃO identificou um hotel localizado na zona do centro histórico de Lisboa classificado com 5 estrelas pelo Turismo de Portugal e avaliado pelos utilizadores com a pontuação de 7,5 em 10. “Internet péssima e o restaurante do hotel não funciona”; “O facto de só terem um elevador a funcionar para o hotel inteiro”; “O espaço da piscina é fantástico, mas o sol não coincide por muito tempo, o Spa não estava a funcionar” são alguns dos comentários escritos e partilhados por pessoas que classificaram este hotel com pontuações iguais ou abaixo de 8.
“Os sistemas de reviews são, sem dúvida, altamente subjetivos e dão azo a este tipo de situações. Apesar de avaliarem o cumprimento dos requisitos impostos no que tem a ver com insfraestruturas e serviços, o sistema de classificação não avalia a atividade operacional da empresa”, diz à VISÃO membro da direção da AHRESP, Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal. “Independentemente dos requisitos legais, a qualidade dos recursos humanos e da gestão é fundamentalmente aquilo que define as classificações nas plataformas como a Booking, ainda que formalmente todos cumpram os requisitos impostos”, acrescenta ainda.
Uma simples má review, muitas vezes injusta e difícil de contestar, cria um efeito em cadeia negativo na atividade de um hotel”
AHRESP
Em Portugal, o processo de classificação de empreendimentos turísticos é gerido pelo Turismo de Portugal, I.P, com a excepção dos parques de campismo e de caravanismo, empreendimentos de turismo de habitação, casas de campo e agroturismo, em que o processo é gerido pela Câmara Municipal competente. Este processo destina-se a “atribuir, confirmar ou alterar a tipologia, o grupo e a categoria dos empreendimentos turísticos, mediante um conjunto de requisitos estipulados no Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos (RJET)“.
As diferentes tipologias de empreendimentos turísticos em Portugal, como é o caso dos hotéis, hotéis rurais e aldeamentos e apartamentos turísticos, “classificam-se nas respetivas categorias tendo em conta as caraterísticas das instalações e equipamentos; o serviço de receção e portaria; o serviço de limpeza e lavandaria; o serviço de alimentação e bebidas e outros complementares. Existe uma distinção entre requisitos mínimos e requisitos opcionais e o somatório permite alcançar a pontuação necessária para a obtenção de determinada classificação.
É obrigatório que todos os hotéis no País sejam classificados com estrelas, mas convém analisar as diferentes tipologias: os hotéis são avaliados entre 1 e 5 estrelas, assim como os hotéis-apartamento; já as pousadas, exploradas diretamente pela ENATUR, ou por terceiros mediante contratos de franquia ou cessão de exploração, não são classificadas por estrelas mas seguem os critérios de 3 ou 4 estrelas confirme o tipo de classificação de edifício ou património onde são instaladas. Os aldeamentos e apartamentos turísticos são avaliados entre 3 e 5 estrelas, assim como os hotéis rurais. Nos conjuntos conjuntos turísticos, tal como nos empreendimentos de turismo de habitação, nas casas de campo e no agroturismo não existe diferenciação por estrelas. Em relação ao alojamento local, também não existe classificação por estrelas e ao parques de campismo e caravanismo cada um pode optar por não ter estrelas ou, com requisitos acrescidos, entre 3 e 5 estrelas.
Em relação às avaliações dos utilizadores em plataformas de viagens, a AHRESP diz ainda que este “é um sistema longe de ser perfeito e é também aquilo que se designa pela ditadura das reviews“, algo que a associação “gostaria de ver discutido de forma construtiva e racional por todos os players do mercado: governo hotéis, consumidores e associações”. “É essencial rever o modelo, pois uma simples má review, muitas vezes injusta e difícil de contestar, cria um efeito em cadeia negativo na atividade de um hotel”, refere o membro da AHRESP.
Diferentes sistemas de classificação, muita confusão
De país para país, os sistemas de classificação vão mudando por razões diferentes, o que dificulta ainda mais a vida às pessoas no momento de decidirem o alojamento onde querem passar umas férias de verão ou a lua-de-mel. Por todo o mundo, os critérios de atribuição de estrelas não são homogéneos e há ainda países que não utilizam um sistema de classificação.
Nos EUA, por exemplo, não é uma agência governamental que controla a avaliação dos empreendimentos turísticos e, por isso, os clientes guiam-se por diferentes caminhos: a AAA Diamonds, que define cinco níveis expressos em diamantes, e o Guia de Viagem da Forbes (antes Mobil, criado em 1958 e o primeiro dos EUA) que se intitula como “o único sistema de classificação global independente para hotéis, restaurantes e spas de luxo”, utilizando estrelas, são duas das instituições mais utilizadas.
Quando foi criado, o Mobil Travel Guide Star Ratings incluía avaliações de 1 a 5 estrelas e a Forbes continuou o trabalho, incluindo locais de 5 estrelas, 4 estrelas e “recomendados”. Em 2019, entraram para a lista, nesta última categoria, sete hotéis portugueses: o Corinthia Hotel, o InterContinental, o Olissippo Lapa Palace, o Penha Longa, o Pestana Palace Lisboa, a Pousada de Lisboa e o Sofitel Lisbon Liberdade, todos em Lisboa. Além disso, no mesmo ano o Hotel Ritz de 5 estrelas, também na capital, foi incluído na lista da Forbes.
Já em França o sistema de classificação de hotéis, gerido pela agência de desenvolvimento turístico do país (Agence de développement touristique de la France), permitia, até 2009, que estes sítios fossem avaliados com até 4 estrelas, no máximo. A partir desse ano, foi adicionada uma uma categoria extra, possibilitando que os alojamentos fossem classificados com 5 estrelas. Em 2010, a França adicionou mais uma categoria e, agora, hotéis de luxo recebem o título de Palácio.
Para tentar homogeneizar esta classificação dos hotéis, foi criada, há mais de dez anos, a Hotelstars Union, da qual fazem parte 20 países europeus (a Polónia foi o último país a integrar o grupo, em outubro deste ano; Portugal não está incluído), e que pretende garantir uma “classificação hoteleira harmonizada com critérios e procedimentos comuns de forma a criar transparência e segurança para o hóspede, mas também para reforçar a reputação e qualidade da indústria hoteleira”, assim afirma no seu site oficial.
À CNN, Slav Kulik, CEO e cofundador da empresa de software Plan A Technologies, que fornece serviços para dezenas de clientes de hotelaria e viagens, diz que se nos concentrarmos “apenas nas classificações por estrelas” podemos perder “muitos benefícios”. Até porque há hotéis com classificações inferiores que não são obrigatoriamente maus, diz, por seu lado, Chekitan Dev, da Cornell University School of Hotel Administration, em Nova Iorque, nos EUA.
Dev nota que, ao mesmo tempo que há países que criam impostos grandes a hotéis classificados com 5 estrelas, o que faz com que esses empreendimentos prefiram “descer” para o nível das 3 e 4 estrelas – acontece na Índia – há outros países em que acontece o contrário: esses empreendimentos conseguem receber uma classificação mais elevada com o objetivo de conseguirem cobrar preços mais altos, por exemplo.